São Paulo, domingo, 16 de setembro de 2007

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Líbia busca aceitação com megaprojeto ambiental

País, pária até 2003, apela a tema popular para selar sua reintegração internacional

Idealizado por Saif al Islam Gaddafi, filho do ditador, Projeto Montanha Verde, na costa mediterrânea, não tem prazo nem valor certo

CAROLINA VILA-NOVA
ENVIADA A CIRENE (LÍBIA)

Apostando na popularidade da questão ambiental, a Líbia lançou nesta semana um megaplano de desenvolvimento sustentável e ecoturismo, em mais um movimento do antigo país pária do ditador Muammar Gaddafi para reabilitar sua imagem internacional e cair nas graças do Ocidente.
O foco da iniciativa é a região da Montanha Verde, na costa mediterrânea, que concentra um dos mais importantes sítios arqueológicos do país, com ruínas romanas e gregas de mais de 2.000 anos espalhadas por 5.500 km2, além de 220 km de praias, em sua maioria virgens.
A apresentação coube ao próprio idealizador do projeto, Saif al Islam Gaddafi, filho do ditador e provavelmente a face mais visível da tentativa de reabilitação do país norte-africano. A uma platéia de 300 convidados, entre especialistas, jornalistas ocidentais e participantes do projeto -a maioria trazida especialmente em vôos charter- e no meio das ruínas de um ginásio romano na cidade de Cirene, Gaddafi anunciou o Projeto Montanha Verde, "a maior região sustentável do mundo", na última segunda.
"A mudança climática é um problema global. Mas soluções globais começam com soluções locais", afirmou em um discurso recheado de "palavras mágicas" como conservação, microcrédito e biocombustíveis.
"No nosso continente não é comum falar de ecoturismo, ambiente, emissão de gases. Mas [esses] são grandes temas no mundo desenvolvido, como Europa, Japão e América do Norte. É hora de nos juntarmos aos países desenvolvidos e mostrarmos que na questão ambiental somos civilizados", respondeu Islam à Folha na entrevista coletiva que seguiu o lançamento. "Há muito a modernizar no país e [o projeto] é parte desse mosaico."

Hotéis de luxo
O plano-piloto começa pela construção de três hotéis de luxo, financiados pelo milionário líbio do ramo do petróleo Hassan Tatanaki -todos seguindo princípios ecologicamente corretos como o uso de energia solar e eólica e ventilação natural.
Inclui ainda a restauração das ruínas, a construção de escolas e hospitais e prevê que os veículos em circulação sejam movidos por eletricidade ou combustíveis não-derivados do petróleo. Nada poderá ser construído em uma faixa considerável do litoral.
E há ainda a estimativa nada pessimista de criar cerca de 200 mil postos de trabalho.
Quanto a custos e prazos para que o projeto saia do papel, tudo é vago. Fala-se apenas em "décadas" de implementação e "bilhões de dólares" em investimentos -somas indefinidas em fundos líbios, parcerias público-privadas e investimentos estrangeiros. Os trabalhos começaram há menos de dois meses e serão administrados pela recém-criada Autoridade de Conservação e Desenvolvimento da Montanha Verde.

"Cachorro louco"
O processo de reabilitação da Líbia começou em 2003, quando o regime de Gaddafi anunciou o fim de seu programa nuclear e foram levantadas as sanções impostas 11 anos antes pela ONU. Desde então, Muammar Gaddafi passou de "o cachorro louco do Oriente Médio", nas palavras do ex-presidente americano Ronald Reagan, para "muito fácil de se lidar", segundo o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair.
Outro capítulo importante, no qual Islam teve um papel crucial, foi a libertação das enfermeiras búlgaras condenadas à morte por, segundo acusação do governo, terem infectado crianças com o vírus da Aids em um hospital em Benghazi. Como prêmio, a Líbia abocanhou um acordo para a compra de armas da França e a realização de exercícios militares conjuntos.
Até o fim do ano, é esperada a visita de Condoleezza Rice -a primeira de um secretário de Estado americano em mais de cinco décadas.
O mais novo capítulo, dizem seus defensores, é o Projeto Montanha Verde. "É a Líbia dizendo para o mundo: somos um país diferente", disse Joe Stanislaw, cuja empresa de planejamento estratégico é um dos participantes.
"Vamos mostrar ao mundo que a Líbia está preparada para assumir a liderança em um tema importante que é a mudança climática. E por que a Líbia está fazendo isso? Porque o mundo está dizendo: queremos você de volta."


A jornalista CAROLINA VILA-NOVA viajou à Líbia a convite do Gulf Tourism International

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