São Paulo, sexta-feira, 16 de dezembro de 2005

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AMÉRICA DO SUL

Líder cocaleiro, que encabeça disputa presidencial na Bolívia, encerra campanha advertindo Petrobras

Morales "avisa" Brasil que reaverá refinarias

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A SANTA CRUZ DE LA SIERRA

Em inflamado discurso diante de milhares de simpatizantes, o líder socialista Evo Morales subiu o tom de sua promessa de nacionalizar a exploração do gás e petróleo bolivianos ao exortar o Brasil a "devolver" duas refinarias compradas há seis anos pela estatal brasileira Petrobras.
"Meus companheiros, essas refinarias têm de voltar às mãos de Santa Cruz, às mãos de Cochabamba, às mãos do povo boliviano. Vamos recuperar as refinarias, que saibam o Estado brasileiro e o companheiro Lula: se ganharmos as eleições, terão de nos devolver as refinarias que nos pertencem", disse e foi saldado com palmas.
Antes, o ex-líder cocaleiro afirmou que a nacionalização dos hidrocarbonetos será "a segunda independência para o país".
Não é primeira vez que Morales defende a reestatização das duas refinarias, mas o tom nunca foi tão agressivo. As duas plantas, compradas em 1999 por pouco mais de US$ 100 milhões, praticamente controlam o comércio de derivados de petróleo na Bolívia.
Em entrevista à Folha ontem de manhã, Morales disse que pedira ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva a devolução das refinarias durante o encontro entre os dois no dia 18 de novembro, no Palácio do Planalto.
"Expliquei a Lula que vamos exercer o direito de propriedade dos recursos naturais, dos hidrocarbonetos, e pedi, evidentemente, as duas refinarias, de Santa Cruz e de Cochabamba. Se é necessário pagar, isso será feito após um estudo. Mas é necessário recuperar as refinarias", afirmou.
A exploração e a comercialização do gás e do petróleo é um dos principais temas de campanha na Bolívia e parcialmente responsável pelos protestos que levaram à renúncia de dois presidentes desde 2003. A principal empresa desse setor é a Petrobras Bolívia, que, sozinha, gera em torno de 15% do PIB do país, o mais pobre da América do Sul.
O showmício em Santa Cruz de la Sierra foi o penúltimo compromisso de campanha de Morales. O candidato do MAS (Movimento ao Socialismo) lidera todas as pesquisas, com cerca de cinco a oito pontos percentuais de vantagem sobre o seu principal adversário, o ex-presidente Jorge "Tuto" Quiroga, de direita.
Morales, porém, tem poucas chances de conseguir a maioria simples dos votos válidos. Nesse cenário, a Constituição boliviana prevê que o Congresso escolha o próximo presidente entre os dois mais votados. As pesquisas mostram que, nas eleições legislativas, os aliados de Quiroga levam vantagem sobre o MAS.

Críticas à imprensa
O evento de anteontem reuniu vários milhares de pessoas -quase todas de origem indígena- diante de uma estátua de um índio guerreiro chiriguano, apesar de as pesquisas mostrarem que Morales perde para Tuto Quiroga no departamento de Santa Cruz e da concorrência com a transmissão da final do campeonato boliviano de futebol.
Os organizadores, num nítido exagero, estimaram o comparecimento em 120 mil pessoas. Por outro lado, o principal jornal de Santa Cruz, "El Deber", praticamente ignorou Evo Morales na edição de ontem e disse que o evento havia atraído apenas 5.000 simpatizantes, sem informar a fonte.
A cobertura dos meios de comunicação, aliás, foi criticada por Morales logo no início do discurso: "Espero que a imprensa nacional e internacional diga a verdade sobre a situação política e econômica de nosso país, e não faça como alguns meios de comunicação que permanentemente satanizam o nosso movimento".
Leia a íntegra da entrevista com Evo Morales em www.folha.com.br/053491


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