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São Paulo, sexta-feira, 17 de janeiro de 2003

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CRISE VENEZUELANA

Presidente defende papel mais ativo do país na América do Sul e discorda da posição americana

Lula quer que Brasil "assuma sua grandeza"

Alan Marques/Folha Imagem
Diante do brasão da Força Aérea do Equador, Lula dá entrevista antes de embarcar para o Brasil


FÁBIO ZANINI
ENVIADO ESPECIAL A QUITO

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu ontem, ao encerrar sua primeira viagem oficial ao exterior, que o Brasil "assuma sua grandeza", tenha maior proximidade com assuntos de países vizinhos e lidere o processo de integração da América do Sul.
Lula deixou claro que o papel ativo do Brasil na articulação de um grupo de países amigos empenhados na busca de uma solução para a crise venezuelana, formalizado anteontem, dará o tom de sua política externa para a América do Sul.
"Precisamos abrir novos espaços, vamos desbravar a América do Sul, que está tão próxima e tão distante ao mesmo tempo", declarou o presidente pela manhã, na base aérea de Quito (Equador), antes de voltar ao país.
O Brasil, de acordo com Lula, exercerá sua vocação natural para comandar a integração continental. "Acho incrível que todos os países da América do Sul vejam no Brasil uma liderança natural para o continente. Só o Brasil é que durante 500 anos não enxergou e não quis fazer isso", disse.
Na visão de Lula, o país tem de "desabrochar". "O Brasil precisa fazer como se fosse um botão de rosa, desabrochar de uma vez por todas, assumir sua grandeza e dar a contribuição que tem de dar à América do Sul e ao mundo."
Nos últimos dois dias, a liderança do Brasil foi defendida pelos presidentes Hugo Chávez (Venezuela) e Lucio Gutiérrez (Equador). Lula listou exemplos de possível integração do Brasil com outros países e falou da expansão de financiamentos do BNDES ao Equador, assistência agrícola e científica à Colômbia e ações comuns de combate ao tráfico.
"Esta viagem [ao Equador] consolidou uma coisa: temos muito que contribuir [com países vizinhos] em políticas de saúde, educação, combate à fome, desenvolvimento tecnológico", declarou o presidente. Para ele, o governo brasileiro está começando a construir uma "nova América do Sul".

Venezuela
Ao referir-se especificamente à crise venezuelana, Lula fez críticas à oposição a Chávez, que quer a saída do presidente, e aos EUA, país que defende a antecipação de referendo sobre o mandato presidencial, marcado para agosto.
"O dado concreto que ninguém pode questionar é que o presidente Chávez tem um mandato constitucional. A partir daí é que temos de encontrar uma saída."
Lula lembrou sua própria trajetória política para reforçar a defesa do respeito às regras. "Participei do maior movimento cívico da história do meu país, a campanha pelas Diretas [1984]. Perdemos, choramos, mas acatamos. Perdi três eleições, mas vocês nunca me viram dizer que tinha de derrubar o presidente no dia seguinte", afirmou.
Com ironia, disse que a baixa popularidade de um presidente não é fator suficiente para removê-lo do cargo -a oposição argumenta que Chávez é reprovado pela maioria da população.
"Se nós aceitarmos a lógica de que uma pesquisa que dá um presidente com baixa aceitação é razão para tirá-lo, vai ter troca antecipada de presidente em todos os países", disse. Lula também tomou o cuidado de dizer que não quer interferir em questões de um país vizinho, como acusa a oposição na Venezuela, mas auxiliar.
"Não estamos querendo dizer o que deve ser feito, porque o povo venezuelano é por demais inteligente, por demais esperto, para saber o que é melhor para ele."
Em uma crítica indireta aos EUA, o presidente afirmou não crer que a antecipação de eleições seja suficiente para solucionar a questão venezuelana. "Tem gente que acha que a solução se dará com uma simples eleição. Eu não acredito. Antes, é preciso pactuar a sociedade venezuelana", disse.
O presidente justificou a inclusão dos EUA no Grupo de Amigos afirmando que os norte-americanos, por terem maior proximidade com a oposição venezuelana, poderão ajudar.
"É preciso ter pessoas com pensamentos antagônicos para construir consenso. A pluralidade é que vai possibilitar a construção de um processo de paz, e os EUA têm pensamento mais próximo da oposição", disse.
Até a formação do grupo, anteontem em Quito, EUA e Brasil lutavam para liderá-lo.


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