São Paulo, sábado, 17 de março de 2007

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China dá garantia à propriedade privada

Em entrevista, premiê diz reconhecer hegemonia americana e afirma que não usará reservas para enfraquecer o dólar

Pergunta a Wen Jiabao sobre líder deposto em 1989 é censurada na internet; dirigente chinês encerra sessão anual do Parlamento

Greg Baker/Associated Press
Integrantes do Congresso chinês ouvem hino nacional no encerramento da sessão anual, na qual Wen Jiabao (dir.) disse que país enfrenta "crises camufladas"


JOSEPH KAHN
DO "NEW YORK TIMES", EM PEQUIM

O primeiro-ministro chinês, Wen Jibao, disse ontem que seu país ainda enfrenta obstáculos sérios para seu desenvolvimento interno e que não procurará desordenar o quadro financeiro mundial dominado pelos Estados Unidos.
O premiê deu longa entrevista coletiva após o encerramento da sessão legislativa do Parlamento, que durou apenas 12 dias. Os deputados votaram projeto que protege a propriedade privada e fizeram as empresas estrangeiras pagar a mesma alíquota de Imposto de Renda (25%) que as chinesas.
A China tem o Parlamento mais numeroso do planeta, com 2.889 cadeiras, e uma das legislaturas mais curtas.
O projeto pelo qual empresas estrangeiras deixarão de pagar um IR menor foi aprovado com apenas 37 votos contrários. Quanto à lei sobre a propriedade privada, ela foi rejeitada por apenas 52 deputados.
Wen se referiu a problemas gerados pela ascensão chinesa como poder financeiro e militar e prometeu políticas contra o aquecimento global. Argumentou que seu país ainda está em desenvolvimento, que se espelharia nos países mais ricos e continuaria a atuar "com responsabilidade".

Modéstia estudada
Governantes chineses sempre adotaram uma atitude de estudada modéstia para evitar abordar suas ambições políticas, econômicas e diplomáticas. Mas o tom defensivo de Wen é excepcional, em razão de seu superávit comercial, reservas em moedas estrangeiras, orçamento militar e poluição, o que gera questões sobre o impacto mundial de seu país.
Ele se referiu às "crises camufladas" que ameaçam a economia chinesa, que permanece a seu ver "desequilibrada, pouco coordenada, instável e insustentável", apesar do rápido crescimento. Também criticou a "superconcentração" de poderes que alimenta a corrupção e aumenta as desigualdades entre mais pobres e mais ricos.
"Nossos dois grandes objetivos serão desenvolver as forças produtivas da sociedade e promover a justiça social e a igualdade", afirmou. Fazendo comparação, disse que "a velocidade de uma frota não é determinada pela embarcação mais rápida, mas pela mais lenta".
Afirmou que seu governo cogita novos meios para investir suas reservas cambiais de US$ 1 trilhão e que nada fará para prejudicar os ativos mundiais em dólar americano.

Orçamento militar
As despesas militares chinesas neste ano crescerão 17,8% e atingirão US$ 44,9 bilhões, quase alcançando o Reino Unido e a França, os dois países que mais gastam depois dos Estados Unidos.
Para Wen, essas despesas, comparativamente ao tamanho e à população da China, são menores que as de países ricos e equivalentes às de países em desenvolvimento.
Indagado sobre o recente teste de um míssil anti-satélite, Wen respondeu que não procurou atingir satélites de outros países e que seu país é favorável a um tratado que proíba que armas sejam colocadas em órbita.
Como a China se tornou o maior consumidor de energia depois dos Estados Unidos e provavelmente o maior emissor de gases, Wen disse pretender "atuar com responsabilidade" na redução das emissões, apesar de não estar obrigado a obedecer as metas do Protocolo de Kyoto.
Afirmou ser necessária uma reforma política para combater a corrupção, hoje presente "no primeiro escalão" do Partido Comunista. Indagado se pretendia transformar seu país numa democracia, respondeu que a China já era "uma democracia socialista", mas que ela, no entanto, precisa ainda de longo tempo para se aperfeiçoar.
Aconselhou os ocidentais a não pressionarem os chineses no sentido de uma mudança de regime e disse que a liberdade, os direitos humanos, a igualdade e a fraternidade não eram atributos exclusivos dos países de regime capitalista.
Essa posição é criticada por grupos de direitos humanos, que acreditam que as liberdades políticas são incompatíveis com o regime de partido único.
Ele foi indagado sobre Zhao Ziyang, dirigente expurgado em 1989 por se opor à repressão de militantes democratas e que morreu em desgraça em 2005. Era ainda um próximo colaborador de Wen, e um livro por ele escrito foi recentemente publicado em Hong Kong.
"Eu não li esse livro", respondeu. Esse trecho de sua entrevista foi eliminado da transcrição que o governo chinês colocou na internet.


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