São Paulo, terça-feira, 17 de junho de 2008

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Panelaço contra o governo Cristina mobiliza milhares

Protesto, que começou com ato de líder ruralista detido no sábado, se espalha além de bairros nobres de Buenos Aires

Governo e campo medem força em manifestações amanhã; desabastecimento causado por bloqueios se agrava e economia sofre


Juan Mabromata - 14.jun.08/France Presse
Caminhões parados em um bloqueio de produtores rurais em estrada argentina

ADRIANA KÜCHLER
DE BUENOS AIRES

Os panelaços contra o governo de Cristina Kirchner, que se concentravam em bairros mais nobres de Buenos Aires, tomaram ontem à noite as ruas da capital e se espalharam por regiões mais simples e por outras cidades, como Córdoba, Rosário, Mendoza e Bariloche.
A senha para o movimento de milhares de pessoas foi a transmissão, pela televisão, de uma marcha liderada em Gualeguaychú, 200 km ao norte de Buenos Aires, pelo líder da ala mais radical dos produtores rurais, Alfredo De Angeli, que foi detido no sábado por bloquear uma estrada e liberado sete horas depois.
A detenção de De Angeli e de outros 19 ruralistas, que se recusavam a liberar o tráfego, levou o setor agrário a decretar o quarto locaute desde 11 de março, quando o governo aumentou os impostos sobre a exportação de grãos para garantir o abastecimento interno, conter o preço dos produtos e redistribuir os lucros do setor.
O conflito entre o campo e o governo argentino promete se acirrar ainda mais amanhã, com a realização de dois grandes atos rivais. A base de apoio do governo convocou uma manifestação na praça de Maio, em frente à Casa Rosada, em Buenos Aires, em defesa do governo de Cristina Kirchner, enquanto o setor agropecuário promoverá um dia de protestos em todo o país.
Do primeiro ato, participarão o ex-presidente Néstor Kirchner, sindicatos, piqueteiros e movimentos sociais que apóiam o governo; o segundo deve ter apoio da população do interior e da classe média e alta das grandes cidades.

Desabastecimento
Diante da falta de diálogo, a mobilização mostra que a crise, que já dura quase cem dias, está longe de terminar. Os locautes dos ruralistas, que impedem a venda e a passagem de alimentos e combustíveis nas estradas, vêm provocando desabastecimento no país. Nos últimos dias, donos de caminhões que transportam grãos se somaram aos bloqueios -argumentam que estão sem trabalho.
Os bloqueios de estradas causam desabastecimento de combustíveis e falta de alimentos. Em La Plata, capital da Província de Buenos Aires, metade dos postos de combustível teve de fechar por falta de gasolina.
Nos supermercados de todo o país, faltam alimentos como azeite e laticínios, e várias padarias tiveram sua produção afetada pela escassez de farinha. Por não ter como dar vazão à produção de leite, empresas do setor têm distribuído ou jogado fora centenas de milhares de litros por dia.
A falta de produtos agrava ainda mais o aumento de preços, que já era fator de crise antes do conflito, e freia o consumo. As vendas do Dia dos Pais, no domingo, caíram pelo menos 10% em relação a 2007.
Em vez de aproveitar o "boom" do preço das commodities agrícolas no mercado internacional, estima-se que o país tenha perdido US$ 1,6 bilhão em vendas ao exterior com a paralisação da comercialização de grãos para a exportação.
Operadores do setor imobiliário, um dos que mais cresce no país, afirmam que as vendas caíram entre 20% e 30% durante a crise. Diante desse cenário, especialistas afirmam que a economia argentina, que cresce a mais de 8% anuais há cinco anos, pode sofrer um esfriamento em 2008 e avançar apenas entre 5,5% e 6%. A economia não é o único setor afetado. A imagem positiva de Cristina caiu 30 pontos, de 56% para 26% durante a crise, segundo o instituto Poliarquia.
Caminhoneiros brasileiros estiveram envolvidos em conflitos porque queriam passar pelos piquetes rurais.


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