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Câmara dos EUA mira Tríplice Fronteira
Deputados aprovam moção de republicana que exorta Bush a pedir na OEA criação de força-tarefa antiterror na região
Em justificativa, deputada diz que ex-líder da Al Qaeda no Iraque instrui terroristas a vir para o Brasil e tentar entrar nos EUA via México
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
A Câmara dos Representantes dos EUA, o equivalente local à Camara dos Deputados
brasileira, aprovou moção para
que George W. Bush peça a formação de força-tarefa para
atuar contra o terrorismo no
hemisfério ocidental, especialmente na zona da Tríplice
Fronteira. A resolução pede
ainda que Bush exija que os países-membros da Organização
dos Estados Americanos (OEA)
reconheçam o Hizbollah e o
Hamas como organizações terroristas.
O alvo de ambos os pedidos é
o Brasil: é o mais citado nas justificativas da moção como palco das supostas atividades terroristas na fronteira com a Argentina e o Paraguai e é o mais
importante dos países-membros da OEA que não aceitam o
conceito de organização terrorista -para o Itamaraty, há
apenas atos terroristas. A moção causou indignação na Embaixada do Brasil em Washington e, se aprovada pelo Senado,
pode atrapalhar a relação entre
os dois países.
A proposta foi apresentada
pela republicana Ileana Ros-Lehtinen, da Flórida, que em
seu discurso de defesa na Câmara diz que o terrorista Abu
Musab al Zarqawi, principal líder da Al Qaeda no Iraque,
morto pelas tropas americanas
no dia 7 de junho, teria pedido
que membros de sua organização fossem ao Brasil com a missão de usar o país para chegar
ao México -e, uma vez lá, entrar nos EUA com objetivo de
promover ataques terroristas.
"Antes de Abu Musab al Zarqawi ter sido eliminado como
uma ameaça, há relatos de que
ele tenha instruído membros
da Al Qaeda no Iraque a ir ao
Brasil, com o objetivo de entrar
nos EUA pelo México e aqui cometer atos de terror", disse ela
no Congresso. Na semana passada, a Folha tentou ouvir a
congressista sobre a origem
dos "relatos" citados como argumentação para sua moção, já
que nunca houve menção oficial de tal ordem entre os governos americano e brasileiro.
Localizada em seu escritório
político em Miami, na Flórida,
ela afirmou via porta-voz que
precisaria das perguntas por
escrito para atender à reportagem. As questões enviadas foram: 1. Por que essa moção agora? A representante contava
com dados novos que justificassem tal ação? 2. Qual a origem dos relatos que dão conta
da suposta ordem de Al Zarqawi? 3. E se ela não temia que tal
moção fosse prejudicar as relações entre Brasil e EUA.
Menos de dez minutos depois de receber as perguntas, o
assessor de Ros-Lehtinen respondeu à Folha que, "infelizmente, Ileana não está disponível para entrevistas".
Não é a primeira polêmica
em relação a um país da América do Sul em que se envolve a
política. De origem cubana e
ultraconservadora, a congressista já foi acusada por Hugo
Chávez, da Venezuela, de ter
ajudado na tentativa de golpe
contra seu governo em 2002.
Assinada por 29 outros congressistas, entre eles o republicano Tom Tancredo (Colorado), conhecido por suas posições radicais contra os imigrantes, mas também por cinco
democratas, a Resolução 338
foi aprovada sem alterações há
20 dias e enviada ao Senado,
que a repassou ao Comitê de
Relações Exteriores, cujo presidente é o republicano Richard Lugar (Indiana), que
mantém bom diálogo com o
Brasil e promete examinar o
texto com cuidado.
"Desconforto"
A Folha apurou que o embaixador do Brasil nos EUA, Roberto Abdenur, manifestou
"profundo desconforto" ao Departamento de Estado americano e escreveu cartas de protesto a todos os signatários da
moção. Seu argumento é o de
que o texto está em descompasso com a Casa Branca, que
reconhece não haver atividades de terrorismo operativo na
região. O diplomata lembrou
também que todo dado novo de
inteligência que os EUA disponham sobre o assunto tem de
ser compartilhado com o Brasil
segundo o que reza comunicado do grupo 3 + 1 (Brasil-Argentina-Paraguai + EUA).
Não é a primeira vez neste
ano que a questão da Tríplice
Fronteira causa tensão entre
os dois países. Em abril, o Departamento de Estado disse em
seu relatório anual sobre o terrorismo que suspeitos de
apoiar grupos extremistas islâmicos aproveitam aquele território "pouco vigiado e a proximidade com comunidades islâmicas" para levantar fundos e
promover atividades ilegais.
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