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Cocaleiros acusam Usaid de financiar opositores
Morales apoiou expulsão de agência; droga vem ao Brasil
DA ENVIADA À REGIÃO DO CHAPARE
"Somos território livre de ingerência estrangeira", comemora Humberto Puma, porta-voz do sindicato cocaleiro da
Vila 14 de Setembro, na exuberante região do Chapare, no
centro da Bolívia.
Puma contava a expulsão,
executada por ele e colegas produtores de coca, dos representantes da Usaid, a agência de fomento dos EUA, em junho.
"Ocupamos o prédio e eles tiveram de sair do Chapare."
Referendados pelo presidente Evo Morales, os sindicalistas
acusaram os americanos de financiarem ações dos opositores na região, parte do departamento de Cochambamba. A representação americana nega.
A Usaid investia em projetos
de substituição da coca por cultivos alternativos, assim como
o governo. Mas os cocaleiros dizem que se negavam à substituição total da folha, como queria a agência americana, uma
vez que a coca tem mercado garantido, legal ou ilegal.
A expulsão pode custar à Bolívia a renovação dos convênios
de cooperação com os EUA, do
dinheiro de combate ao narcotráfico propriamente -já em
queda e estimado em US$ 25
milhões neste ano- ao mais
defendido por empresários, o
ATPDEA, que dá vantagens a
produtos do país no cobiçado
mercado americano.
Na semana que passou, David T. Johnson, secretário-assistente no Birô para Questões
Internacionais de Narcotráfico
e Policiamento do Departamento de Estado americano,
reclamou da expulsão da Usaid
e disse que era um assunto a ser
decidido pelos dois governos, e
não pelas entidades cocaleiras.
Mas é difícil separar o que é
governo e interesses de grupo.
Morales acumula as funções de
presidente da República e presidente das confederações cocaleiras do Chapare, cargo para
o qual foi reeleito em julho.
No final de semana passado,
Morales foi ao Chapare fazer
seu último ato de campanha
-entregar um cheque venezuelano de US$ 210 mil para
uma fábrica de industrialização
de coca que deve ficar pronta
em 2009. No domingo, votou
no referendo que lhe confirmou no cargo, com aprovação
de 67,4%. O vilarejo chaparenho de Vila 14 de Setembro parou para esperar o presidente e
o seguiu pelas ruas lançando
confetes.
A dedicação de Morales ao
Chapare funciona eleitoralmente na região e como apelo à
imprensa estrangeira, mas o
efeito sobre o público interno
geral, inclusive sobre seus simpatizantes, não é unânime. Há
queixas em La Paz, região onde
tem forte respaldo, de que o
sindicalista não aprendeu a falar para "todos os bolivianos".
Nacionalização e Brasil
Em meio à incerteza e às diferenças quanto à ajuda externa americana, o governo Morales diz que vai aumentar a verba
própria para a luta antidrogas,
o que define como "nacionalizar" essa política. Hoje os programas são pagos com ajuda
dos EUA e da União Européia.
Num Estado pobre e com outras urgências, caso falhe a ajuda externa e não venha o aporte
do governo, o principal efeito
de um eventual aumento da cocaína boliviana deve ser sentido no Brasil. Segundo a polícia
do país andino, ao menos 85%
da droga produzida vem para o
mercado nacional.
De acordo com a ONU, 30%
das cerca de cem toneladas métricas de cocaína produzidas
pela Bolívia vem do Chapare.
Questionado sobre os plantios
dedicados à droga na região,
Humberto Puma não nega e rebate: "Isso não vai mudar enquanto os países desenvolvidos
não combaterem o consumo e o
tráfico. Só assim o agricultor
não vai ter para quem vender".
(FLÁVIA MARREIRO)
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