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Divergências bloqueiam reunião da OEA
Colômbia chega a encontro que deveria encerrar crise regional com nova denúncia contra o governo do Equador, que nega
Negociações se arrastavam desde domingo sem que resolução de consenso fosse anunciada; Bogotá insistia em justificar bombardeio
ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADA ESPECIAL A WASHINGTON
A reunião de ontem de chanceleres da OEA (Organização
dos Estados Americanos) foi
marcada para selar em termos
práticos o acordo de paz entre a
Colômbia e o Equador, mas
acabou servindo justamente
para o contrário: um recuo na
pacificação, com a retomada de
agressões de lado a lado. Até o
início da madrugada de hoje,
depois de 14 horas de discussões, os países não haviam chegado a um acordo.
Por volta das 23h30 (0h30 de
terça em Brasília), o chanceler
brasileiro, Celso Amorim, interveio duramente. Propôs que,
ou os chanceleres dos dois países chegavam a um consenso
sobre a resolução final, ou se
encerrasse a reunião enumerando três pontos básicos e se
convocasse um novo encontro
mais adiante -o que seria um
reconhecimento do fracasso
dos entendimentos.
O principal impasse foi quanto aos termos da resolução final. A própria OEA fez uma síntese das propostas apresentadas, mas o Equador insistia em
usar termos duros contra a Colômbia, "rechaçando" o bombardeio das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) em seu território no
início do mês. Em resposta, a
Colômbia insistia na versão de
que o Equador dá guarida a
guerrilheiros.
A delegação colombiana já
chegara ontem à reunião de
chanceleres com cópias, distribuídas informalmente a jornalistas, de uma foto do segundo
homem das Farc, Raúl Reyes,
que acabou morto no bombardeio colombiano no Equador,
ao lado de um homem que seria
o ministro da Segurança equatoriano, Gustavo Larrea.
A foto teria sido retirada de
um dos computadores apreendidos na operação colombiana
que matou Reyes e foi usada como uma espécie de prova das
relações entre o governo Correa e a guerrilha. Os equatorianos rapidamente negaram que
o homem da foto fosse Larrea.
Os colombianos, porém, insistiram. Questionado por que
o seu país falava em paz e ao
mesmo tempo usava argumentos como aqueles contra o
Equador, o chanceler da Colômbia, Fernando Araújo, respondeu: "Bons amigos têm que
falar a verdade".
Foi nesse clima que chanceleres e embaixadores na OEA
tiveram discussões na sede da
OEA, em Washington, entre
cinco propostas iniciais: da
própria organização, da Colômbia, do Equador, dos EUA e
uma conjunta, da Venezuela e
do México. Até o fechamento
desta edição, as reuniões continuavam a portas fechadas.
No domingo à noite, o diretor-geral da OEA, José Miguel
Insulza, reuniu um grupo de
embaixadores -inclusive o
brasileiro Osmar Chohfi- para
chegar a uma proposta. As discussões, que não prepararam
um consenso, foram até a 1h30
da madrugada de ontem.
Enquanto as discussões seguiam, a controvérsia em torno
da foto ganhava corpo. No
Equador, o ministro Larrea
afirmou que, enquanto o governo colombiano continuasse sua
"campanha" para o vincular às
Farc, Quito não reataria as relações diplomáticas com Bogotá.
O ministro identificou o
companheiro de Reyes na imagem como secretário do Partido Comunista argentino, Patricio Echegaray -que, mais tarde, à agência Efe, confirmou ser
ele o homem na foto.
Larrea cobrou retificação do
jornal colombiano "El Tiempo", que publicou a imagem na
edição de ontem. Em sua página de internet, o jornal diz que
uma fonte da polícia "se apressou em entregar a imagem sem
terminar todas as verificações".
"Terroristas"
A proposta apresentada pela
Colômbia na OEA foi muito criticada nos bastidores, inclusive
pelos brasileiros, por se referir
várias vezes às palavras "terroristas" e "terrorismo", inclusive
como forma de justificar o
bombardeio no Equador. Foi
recebida como sendo, na verdade, dos EUA -que preferiram
ficar à sombra.
Já os equatorianos insistiam
em usar expressões duras como
"rechaçar" e falar em "injustificados ataques e agressões" sobre a ação do Exército colombiano, recuando à fase anterior
de acertos da própria OEA.
Para o chanceler brasileiro,
Celso Amorim, essa fase -das
acusações- já tinha se esgotado nas reuniões anteriores da
própria OEA e do Grupo do Rio.
"É preciso andar para a frente."
Além de os EUA apresentarem uma proposta surpreendentemente cautelosa, o secretário de Estado assistente para
o Hemisfério Ocidental, Thomas Shannon, usou um tom
conciliador ao falar à Folha ontem sobre a dificuldade de conter o trânsito de guerrilheiros e
de contrabando entre países.
"É dificílimo controlar fronteiras enormes como as da região. Nós mesmos, nos EUA,
não temos todos esses problemas nas nossas fronteiras com
o México, apesar de todos os
esforços?", disse.
O grande esforço dos chanceleres ontem foi para que Colômbia e Equador reatassem
relações diplomáticas. "Mas os
dois principais líderes [Correa
e Uribe] precisam colaborar
mais", completou Shannon.
A jornalista ELIANE CANTANHÊDE viajou a
Washington em um jato da FAB, a convite
do Itamaraty
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