São Paulo, terça-feira, 18 de março de 2008

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Divergências bloqueiam reunião da OEA

Colômbia chega a encontro que deveria encerrar crise regional com nova denúncia contra o governo do Equador, que nega

Negociações se arrastavam desde domingo sem que resolução de consenso fosse anunciada; Bogotá insistia em justificar bombardeio

ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADA ESPECIAL A WASHINGTON

A reunião de ontem de chanceleres da OEA (Organização dos Estados Americanos) foi marcada para selar em termos práticos o acordo de paz entre a Colômbia e o Equador, mas acabou servindo justamente para o contrário: um recuo na pacificação, com a retomada de agressões de lado a lado. Até o início da madrugada de hoje, depois de 14 horas de discussões, os países não haviam chegado a um acordo.
Por volta das 23h30 (0h30 de terça em Brasília), o chanceler brasileiro, Celso Amorim, interveio duramente. Propôs que, ou os chanceleres dos dois países chegavam a um consenso sobre a resolução final, ou se encerrasse a reunião enumerando três pontos básicos e se convocasse um novo encontro mais adiante -o que seria um reconhecimento do fracasso dos entendimentos.
O principal impasse foi quanto aos termos da resolução final. A própria OEA fez uma síntese das propostas apresentadas, mas o Equador insistia em usar termos duros contra a Colômbia, "rechaçando" o bombardeio das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) em seu território no início do mês. Em resposta, a Colômbia insistia na versão de que o Equador dá guarida a guerrilheiros.
A delegação colombiana já chegara ontem à reunião de chanceleres com cópias, distribuídas informalmente a jornalistas, de uma foto do segundo homem das Farc, Raúl Reyes, que acabou morto no bombardeio colombiano no Equador, ao lado de um homem que seria o ministro da Segurança equatoriano, Gustavo Larrea.
A foto teria sido retirada de um dos computadores apreendidos na operação colombiana que matou Reyes e foi usada como uma espécie de prova das relações entre o governo Correa e a guerrilha. Os equatorianos rapidamente negaram que o homem da foto fosse Larrea. Os colombianos, porém, insistiram. Questionado por que o seu país falava em paz e ao mesmo tempo usava argumentos como aqueles contra o Equador, o chanceler da Colômbia, Fernando Araújo, respondeu: "Bons amigos têm que falar a verdade".
Foi nesse clima que chanceleres e embaixadores na OEA tiveram discussões na sede da OEA, em Washington, entre cinco propostas iniciais: da própria organização, da Colômbia, do Equador, dos EUA e uma conjunta, da Venezuela e do México. Até o fechamento desta edição, as reuniões continuavam a portas fechadas.
No domingo à noite, o diretor-geral da OEA, José Miguel Insulza, reuniu um grupo de embaixadores -inclusive o brasileiro Osmar Chohfi- para chegar a uma proposta. As discussões, que não prepararam um consenso, foram até a 1h30 da madrugada de ontem.
Enquanto as discussões seguiam, a controvérsia em torno da foto ganhava corpo. No Equador, o ministro Larrea afirmou que, enquanto o governo colombiano continuasse sua "campanha" para o vincular às Farc, Quito não reataria as relações diplomáticas com Bogotá. O ministro identificou o companheiro de Reyes na imagem como secretário do Partido Comunista argentino, Patricio Echegaray -que, mais tarde, à agência Efe, confirmou ser ele o homem na foto.
Larrea cobrou retificação do jornal colombiano "El Tiempo", que publicou a imagem na edição de ontem. Em sua página de internet, o jornal diz que uma fonte da polícia "se apressou em entregar a imagem sem terminar todas as verificações".

"Terroristas"
A proposta apresentada pela Colômbia na OEA foi muito criticada nos bastidores, inclusive pelos brasileiros, por se referir várias vezes às palavras "terroristas" e "terrorismo", inclusive como forma de justificar o bombardeio no Equador. Foi recebida como sendo, na verdade, dos EUA -que preferiram ficar à sombra.
Já os equatorianos insistiam em usar expressões duras como "rechaçar" e falar em "injustificados ataques e agressões" sobre a ação do Exército colombiano, recuando à fase anterior de acertos da própria OEA. Para o chanceler brasileiro, Celso Amorim, essa fase -das acusações- já tinha se esgotado nas reuniões anteriores da própria OEA e do Grupo do Rio.
"É preciso andar para a frente." Além de os EUA apresentarem uma proposta surpreendentemente cautelosa, o secretário de Estado assistente para o Hemisfério Ocidental, Thomas Shannon, usou um tom conciliador ao falar à Folha ontem sobre a dificuldade de conter o trânsito de guerrilheiros e de contrabando entre países. "É dificílimo controlar fronteiras enormes como as da região. Nós mesmos, nos EUA, não temos todos esses problemas nas nossas fronteiras com o México, apesar de todos os esforços?", disse.
O grande esforço dos chanceleres ontem foi para que Colômbia e Equador reatassem relações diplomáticas. "Mas os dois principais líderes [Correa e Uribe] precisam colaborar mais", completou Shannon.


A jornalista ELIANE CANTANHÊDE viajou a Washington em um jato da FAB, a convite do Itamaraty


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