São Paulo, domingo, 18 de setembro de 2005

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ALEMANHA VOTA

Favorita contra o social-democrata Schröder, a conservadora Merkel pode não obter força bastante para reformas

Alemães decidem modelo de Estado na urna

MÁRCIO SENNE DE MORAES
ENVIADO ESPECIAL A BERLIM

Dividida entre a direita -que prega a continuidade das reformas do mercado de trabalho e da Previdência Social para alentar a cambaleante economia- e a esquerda -que iniciou as reformas porém defende a manutenção de uma importante rede de proteção social-, mais de 60 milhões de eleitores alemães estão aptos a decidir hoje que modelo de Estado privilegiarão nos próximos anos.
Com exceção das últimas eleições legislativas, o país não vive campanha tão polarizada há mais de duas décadas. E, seguindo o exemplo do pleito de 2002, a campanha teve muita agitação político-partidária e diferentes alternativas, embora tenha sido a mais curta (cinco semanas) da história desde a fundação da República Federal da Alemanha, em 1949.
Angela Merkel, candidata da aliança conservadora formada pela União Democrata Cristã (CDU) e pela União Social Cristã (CSU), é a favorita para substituir seu maior rival político atual, o social-democrata Gerhard Schröder, na Chancelaria alemã.
Nas últimas semanas, ela apostou todas as suas fichas na necessidade de aprofundar as reformas da Previdência e de flexibilizar o mercado de trabalho para dinamizar a economia alemã, que, há mais de uma década, apresenta níveis insignificantes de crescimento -exceto em 2000 (3%).
Com isso, o desemprego, o mais forte tema da campanha democrata-cristã, atinge hoje 11,4% da mão-de-obra ativa do país (4,7 milhões de pessoas de uma população total de 82,5 milhões), e o número de falências e de concordatas de empresas (sobretudo as de baixo número de empregados) poderá chegar a 35 mil em 2005.
Merkel pretende, portanto, continuar a desmantelar o tão aclamado Estado do Bem-Estar Social alemão. Este, para os conservadores e para seus aliados liberais -além dos mercados financeiros e dos sindicatos patronais-, não tem mais força para enfrentar a concorrência externa imposta pela globalização e encontra-se fragilizado por conta do envelhecimento de sua população, que, logicamente, deixa a Previdência ainda mais onerosa.
Todavia a vitória de Merkel, que a tornaria a primeira mulher à frente do governo da Alemanha, poderá não ser tão doce quanto o quadro que se desenhava há apenas algumas semanas.
Afinal, sua intenção é governar ao lado dos principais aliados dos conservadores, os liberais do FDP (Partido Democrata Liberal), mas as pesquisas dizem que isso poderá não ser possível em razão da recuperação do Partido Social-Democrata (SPD), de Schröder, iniciada após o triunfo do carismático chanceler (premiê) num debate há duas semanas.
Isso abriria caminho para a chamada "grande coalizão", que uniria os conservadores a seus maiores rivais na cena política alemã, os social-democratas. Tal perspectiva seria negativa para a Alemanha, de acordo com a maior parte dos especialistas, pois haveria um sério risco de bloqueio das reformas -com ambos os partidos buscando parecer mais simpático ao público, tendo em vista eleições futuras. O único caso de grande coalizão na história alemã do pós-guerra (em que os dois maiores partidos dividiram o poder) ocorreu de 1966 a 1969, sob o comando do chanceler Kurt Georg Kiesinger, talvez o menos conhecido líder do país dos últimos 60 anos. Por enquanto, a CDU e o SPD descartam a formação de uma aliança.
Como pôde miraculosamente fazer em 2002, Schröder ainda tem esperança de virar o jogo no último minuto. Para tanto, aposta no alto número de indecisos (30%) e nos temas que mais agradam a seu eleitorado: a manutenção dos benefícios sociais, embora seu governo tenha começado a reformar o Estado do Bem-Estar Social, e a política externa.
Assim, ele descreve sua oponente como uma nova Margaret Thatcher, a primeira-ministra britânica que realizou reformas radicais no Reino Unido nos anos 80 "à custa dos trabalhadores".
Na esfera internacional, ele reitera que as disputas devem ser resolvidas pacificamente, numa alusão direta à sua oposição, já em 2002, à invasão do Iraque, que lhe valeu preciosos votos no último pleito legislativo. Cerca de 70% dos alemães são contrários à participação do país em guerras.
Mesmo que Merkel seja eleita, não se deve, contudo, esperar reformas radicais. Afinal, Schröder sofreu várias derrotas em eleições regionais por conta das impopulares reformas que introduziu, cenário que a candidata conservadora quer de toda forma evitar.


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