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MISSÃO NO CARIBE
Para general Bacellar, novo líder das forças da ONU no país, sem presença estrangeira haveria guerra civil
Haiti cobra uso da força, diz chefe militar
CAROLINA VILA-NOVA
DA REDAÇÃO
O governo interino haitiano
pressiona a Missão de Estabilização da ONU no Haiti (Minustah)
por um uso contundente de força
para controlar a situação de segurança. A afirmação é do general
Urano Teixeira da Matta Bacellar,
58, de Bagé (RS), que assumiu em
31 de agosto o comando militar da
Minustah, com 6.250 "capacetes
azuis", em substituição ao general
Augusto Heleno Ribeiro Pereira.
"Mas não podemos esquecer
que essa é uma missão de paz e o
emprego da força tem de ser de
acordo com o que está previsto",
disse. O militar avalia que a missão tem sido bem-sucedida em
estabilizar o Haiti, contrariando o
que sustentam relatórios de organizações de direitos humanos e
setores da sociedade haitiana.
Na entrevista concedida à Folha, de Porto Príncipe, ele não
quis responder se a decisão do
Brasil de enviar tropas ao Haiti é
um erro de política externa, se essa presença cumpre a agenda
americana na região e quanto
tempo a missão ficará no país.
![](http://www1.folha.uol.com.br/fsp/images/ep.gif)
Folha - O sr. chegou há pouco ao
Haiti para assumir a Minustah. Em
que situação encontrou o país?
General Urano Teixeira da Matta
Bacellar - Encontrei uma situação
calma no interior no país, equilibrada e controlada, sem maiores
problemas de violência, embora
episódios de criminalidade ainda
persistam, particularmente em
regiões da capital, Porto Príncipe.
A situação é equilibrada na maior
parte da cidade, mas ainda problemática em áreas mais características de violência e criminalidade. No geral, o país vive situação
de certa calma, com alguns pontos críticos, como Cité Soleil e Cité
Militaire [favelas da capital], embora já tenha melhorado muito.
Folha - Mas há críticas de que
houve a deterioração na situação
de segurança, como indica a recente onda de seqüestros na capital.
Bacellar - Na maior parte da cidade, a situação é de normalidade. Agora, existem as áreas-problema, onde a criminalidade é
maior e a violência persiste. Houve uma redução acentuada de seqüestros em agosto. Agora, em setembro, estamos observando um
pouquinho de aumento nos seqüestros e assaltos, mas circunscrito àqueles bairros que já citei.
Folha - Quais são os principais desafios que a missão vai enfrentar?
Bacellar - O principal desafio do
terceiro contingente brasileiro é
prosseguir mantendo o controle
das áreas onde já se obteve um
grau elevado de controle, que é a
região de Bel Air [favela de Porto
Príncipe]. A situação lá há alguns
meses era difícil, era uma região
conflitiva onde predominava o
banditismo. Hoje, graças à presença do batalhão brasileiro, Bel
Air mudou sensivelmente. Já existem postos de saúde funcionando, as escolas estão funcionando,
os microônibus estão circulando,
embora de vez em quando ocorram atitudes de violência, seja
contra elementos da nossa tropa,
seja contra a própria população.
Folha - Seu antecessor, o general
Heleno, diz que o problema do Haiti não é militar e critica a falta de
investimentos sociais pela comunidade internacional. Como justificar
a presença militar nesse contexto?
Bacellar - A presença da missão
decorre de um mandato da ONU.
Na situação de crise naquele momento, para tentar estabilizar o
país, realmente forças militares tinham de ser empregadas. A crise
social existe, o general Heleno está
certo sobre a necessidade de investimentos sociais. São coisas
que caminham juntas, mas são diferentes. A presença militar se justifica pelo mandato do Conselho
de Segurança da ONU, que permite a existência de uma força
que atue contra elementos desestabilizadores visando buscar o
mínimo de segurança para que o
país possa seguir sua trajetória.
Folha - E a missão logrou isso?
Bacellar - A missão tem logrado
seus objetivos dentro da seqüência de atividades previstas, como
o apoio ao governo transitório, o
apoio à reestruturação e à reforma da Polícia Nacional e a existência de uma sensação de maior
segurança entre a população.
Folha - O sr. já sofreu pressão, como o general Heleno disse ter sofrido, para que haja uma ação mais
ofensiva no controle da segurança?
Bacellar - No Haiti, é persistente
entre as autoridades o desejo de
uma atuação mais ofensiva, do
componente militar da missão,
contra as gangues, os malfeitores
que existem aqui e querem criar
insegurança em meio à população. Esse componente tem atuado
e marcado presença com sua responsabilidade no que diz respeito
à segurança, mas não podemos
esquecer que é uma missão de paz
e o emprego da força tem de ser
de acordo com o que está previsto
pelas próprias Nações Unidas e
com as regras de emprego dessa
força militar. A tropa não está
aqui para uma guerra, mas para
cumprir um mandato com uma
aplicação adequada da força.
Folha - As eleições se aproximam, e com isso há a perspectiva
de aumento da violência. Haverá
um incremento das operações?
Bacellar - Existe um plano de segurança em andamento e, naturalmente, haverá uma intensificação dessas ações e um planejamento específico para a proximidade do período eleitoral. O que
se busca é evitar situações incontroláveis e que as eleições ocorram em clima de normalidade.
Folha - Há condições de segurança para as eleições de novembro?
Bacellar - Neste momento, sim,
há condições de haver as eleições.
Mas temos ainda um período até
20 de novembro em que precisamos observar os acontecimentos.
Folha - Seria melhor que o Brasil
não tivesse se envolvido no Haiti? A
situação estaria pior no país se não
fosse a presença da Minustah?
Bacellar - A participação do Brasil é uma decisão de governo. Já a
presença da Minustah decorre de
uma situação de desequilíbrio e
de uma possível guerra civil que
ocorreria. Se nada tivesse sido feito, uma guerra civil teria ocorrido.
Folha - Grupos de direitos humanos e entidades haitianas denunciam a ocorrência de abusos nas
operações militares, com a morte
de civis. Como o sr. responde a isso?
Bacellar - Não tenho de responder, mas as operações foram realizadas como um imperativo do
mandato das Nações Unidas. O
chefe da missão, o embaixador
[Juan Gabriel] Valdés, já deu uma
extensa entrevista explicando a
necessidade dessas operações e as
condições em que elas foram realizadas. Cabe lembrar que a atuação cautelosa das tropas e o cuidado em evitar baixas civis, considerando-se o ambiente operacional
da área densamente povoada que
temos aqui, sempre foi uma característica da missão. Quando
ações mais rigorosas são necessárias diante do enfrentamento por
parte de bandidos contra a própria presença da tropa, infelizmente acaba ocorrendo algum
dano que a gente chama de danos
colaterais ou baixas civis, que são
desagradáveis e que não são o objetivo da força que está aqui. Se
por ventura ocorre, é lamentável e
decorre de uma situação operacional, do ambiente urbano, da
densidade populacional e, inclusive, do uso da população como
escudo humano pelos bandidos.
Folha - O sr. confirma então baixas civis por operações da missão?
Bacellar - Não confirmo nada.
Disse que, respondendo às denúncias de baixas civis, nos enfrentamentos já foram observadas mortes de civis, com tiros que
não se sabe se vieram da tropa ou
de bandidos. Isso já foi noticiado.
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