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São Paulo, sábado, 18 de outubro de 2003

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Vaticano rediscute caráter vitalício do papado

DO ENVIADO ESPECIAL

A saúde frágil de João Paulo 2º, 83, e a expectativa de vida cada vez maior das pessoas -especialmente nos países desenvolvidos- fizeram com que o Vaticano começasse a rediscutir o caráter vitalício do pontificado. Esse seria um dos temas sobre os quais os cardeais têm conversado em reuniões fechadas.
O cardeal belga Godfried Danneels disse que no futuro próximo será comum que os papas renunciem e que eles "devem ser livres para decidir o momento de se aposentarem". "Cada vez vivemos mais tempo, e não é possível continuar com essa responsabilidade quando se tem 90 ou 100 anos, mesmo que se recebam os melhores cuidados", disse, no último dia 9, Danneels, visto como um dos possíveis sucessores de João Paulo 2º.
As leis eclesiásticas permitem explicitamente a renúncia de um papa, mas exigem que a decisão seja tomada livremente e que seja "devidamente manifesta". A decisão, extremamente rara na história da igreja, não precisa da aceitação de nenhuma autoridade.
O cânone 332 do Código de Direito Canônico (principal documento legislativo da Igreja Católica) afirma que, "se acontecer que o romano pontífice renuncie a seu múnus (cargo), para a validade se requer que a renúncia seja livremente feita e devidamente manifestada, mas não que seja aceita por alguém".
O Código de Direito Canônico não prevê, no entanto, nenhuma medida concreta no caso de perda das faculdades mentais do líder católico. Também não está claro quem seria o encarregado de tomar uma decisão se a situação chegasse a esse ponto.
O último papa a renunciar por vontade própria foi Celestino 5º, em 1294. Já o papa Gregório 12 foi forçado a abdicar por causa de disputas internas em 1415.

Saúde frágil
Em agosto de 2002, o papa admitiu, pela primeira vez, que vinha sofrendo pressões para que renunciasse e abrisse caminho para a eleição de um novo líder católico. Sua saúde frágil, agravada pelo mal de Parkinson (desordem do sistema nervoso) e pela artrose no joelho, despertaram rumores de que ele renunciaria durante a viagem que fazia à cidade de Cracóvia, que o consagrou como arcebispo e cardeal, antes de ser eleito papa, em 1978.
Ele negou qualquer intenção de abandonar a liderança católica, e o cardeal chileno Jorge Medina Estevez afirmou ter ouvido o papa dizer, em particular, que não renunciaria "porque Jesus não desceu da cruz".
A maior parte dos cardeais, ao menos publicamente, declara ser contra uma eventual renúncia.
No início deste mês, um cardeal disse que o papa está próximo da morte. O cardeal austríaco Christoph Schönborn, 58, arcebispo de Viena e um dos principais líderes católicos europeus, afirmou que João Paulo 2º "está se aproximando dos últimos dias e meses de sua vida". Foi o primeiro clérigo da alta hierarquia católica a reconhecer que o estado de saúde do papa é muito frágil. "O mundo inteiro está testemunhando um papa doente, incapacitado e que está morrendo", declarou.
O papa mais uma vez surpreendeu. Depois das declarações, realizou uma cerimônia de canonização na praça de São Pedro e viajou a Pompéia. Anteontem, apesar das dificuldades, celebrou uma missa na praça de são Pedro, onde permaneceu durante mais de duas horas.
De acordo com o cardeal Angelo Sodano, secretário de Estado do Vaticano, o papa tem problemas de saúde, mas está plenamente à frente da Igreja Católica.
Sodano disse que, "sem dúvida alguma", João Paulo 2º é quem toma decisões relativas ao cotidiano da igreja e questões relacionadas ao cerca de 1 bilhão de católicos no mundo.
"Não estou fingindo que o papa está bem, não. É óbvio que o tempo para todo mundo... é uma lei da vida que alguém com 83 anos não tenha a força de alguém com 33 anos", disse. (PDF)


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