São Paulo, domingo, 18 de outubro de 2009

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ONU e EUA investigam abusos em Honduras

Comissão das Nações Unidas chega hoje ao país para averiguar denúncias

Há relatos de pessoas presas sem mandados, torturas e mortes; para testemunhas, Exército persegue zelayistas depois de manifestações

ANA FLOR
ENVIADA ESPECIAL A TEGUCIGALPA

Pessoas detidas sem autorização judicial, torturas, mortos, feridos nos hospitais. Enquanto as negociações para o fim da crise política em Honduras não avançam, organizações internacionais começam a investigar denúncias de violações contra direitos humanos ocorridas desde o golpe de Estado de 28 de junho.
Hoje chega ao país uma equipe do Alto Comissariado para Direitos Humanos da ONU. O grupo ficará três semanas para fazer um relatório detalhado sobre o assunto. Além da equipe, desde a semana passada um funcionário do Departamento de Estado dos EUA está em Honduras para encontros com a sociedade civil para averiguar as mesmas denúncias.
A Folha conversou com familiares e pessoas que sofreram ataques da polícia.
A situação no país se agravou depois da volta do presidente deposto, Manuel Zelaya, a Tegucigalpa. O governo interino decretou a suspensão de diversas garantias constitucionais -em uma medida ainda em vigor, apesar das promessas de Micheletti de revogá-la- e instituiu um toque de recolher.
Durante o toque de recolher, ao menos três pessoas foram mortas, mais de cem ficaram feridas e 2.000 foram detidas, de acordo com o Comitê de Direitos Humanos de Honduras. Ontem, um sindicalista que estava em estado grave há quatro semanas após ser baleado se somou à cifra, segundo movimentos pró-Zelaya.
Entre os feridos está Adalberto Rodríguez, 18, que até a última sexta estava internado no Hospital Escola, sem previsão de alta. Ele levou um tiro no rosto no dia 22 de setembro, quando estava do lado de fora de casa durante o toque de recolher. Outros dois amigos também foram feridos.
Adalberto conta que participava diariamente das marchas do movimento de resistência contra o golpe. Naquele dia, os policiais jogaram, além de bombas de gás lacrimogêneo, jatos de tinta vermelha para marcar os manifestantes. "A gente fugia do Exército, mas outros policiais nos encontravam mais tarde. Vi muita gente sendo presa assim", conta.
A vendedora Augustina Moncada, 32, também disse ter sido agredida durante o toque de recolher. "Saí para comprar comida de manhã e os policiais estavam na esquina. Gritavam que eu era da resistência, me acertaram nas costas com um cassetete", diz ela, que denuncia a prisão de quatro parentes. "Foram levados para a penitenciária e não ouvimos mais notícias deles", afirma.
A ONG Human Rights Watch (HRW) denunciou que autoridades hondurenhas bloqueiam investigações de abusos e violência. Segundo a HRW, a área do Ministério Público responsável pelas denúncias tem o trabalho dificultado por superiores e pela polícia.
Há dois dias, o embaixador dos EUA Hugo Llorens manifestou sua preocupação com as denúncias de violações dos direitos humanos no país e com a continuidade do decreto que estabelece o "estado de sítio".
Apesar de Roberto Micheletti ter afirmado publicamente que o decreto foi suspenso, até hoje não houve publicação no diário oficial. A repressão contra as manifestações continua, assim como a proibição de funcionamento de dois meios de comunicação pró-Zelaya.

Medidas
Enquanto os líderes da Alba (Aliança Bolivariana para as Américas) aprovaram anteontem novas sanções econômicas e comerciais contra o governo interino de Honduras, os EUA, que desde o golpe de 28 de junho cortaram ajuda financeira em diversas áreas, não falam em aprofundar a pressão.
Segundo um diplomata do país que acompanha as negociações em Tegucigalpa, o cancelamento dos vistos de membros do governo interino, além do corte nos recursos, já são medidas "bastante duras". Micheletti e ministros tiveram vistos para os EUA cancelados.
Autoridades americanas tem exercido pressão sobre parlamentares hondurenhos, empresários e candidatos a presidente em busca de uma resolução rápida para a crise que inclua a restituição de Zelaya. Se isso não ocorrer, diversos países ameaçam não reconhecer as eleições de 29 de novembro.
Ainda ontem, um recurso apresentado por um advogado não ligado a Zelaya pedindo que seja revisado o decreto que retirou o presidente do poder foi aceito para análise pela Suprema Corte do país, mas sem prazo. Não havia expectativa de qualquer resultado da ação que tivesse impacto na crise.


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