São Paulo, sexta-feira, 19 de janeiro de 2001

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EUA

Em discurso de despedida na TV que durou sete minutos, presidente diz que seus dias no serviço público "não acabaram"

Clinton se despede com estocadas em Bush
Reuters - 17.jan.2001
Clinton, com a filha, aponta seu nome em rua de Little Rock



MARCIO AITH
DE WASHINGTON

Num discurso de sete minutos, o presidente dos EUA, Bill Clinton, resumiu seu legado de oito anos na Casa Branca e se despediu da população norte-americana com estocadas sutis contra seu sucessor, George W. Bush, que assume amanhã a Presidência norte-americana.
Exibindo uma cara abatida, Clinton listou os benefícios da prosperidade econômica promovida durante seu governo, informou que seus dias de serviço público "não acabaram" e não fez nenhuma menção a aspectos do escândalo sexual que marcou sua experiência no cargo mais importante do mundo.
Clinton desejou sorte a seu sucessor, contra quem deu pequenos golpes disfarçados de apelos. "Num mundo mais conectado, devemos manter nossa liderança. Para isso, é preciso mais do que compaixão, é preciso ação", disse Clinton, numa referência ao "conservadorismo com compaixão", principal slogan da campanha de Bush.
O presidente também apelou ao próximo governo para que mantenha a disciplina fiscal adotada por Clinton na Casa Branca. Essa providência não consta das prioridades de governo de Bush, que pretende gastar o superávit fiscal cortando impostos.
Clinton, o segundo presidente mais jovem a deixar a Casa Branca em toda a história norte-americana, sai do governo com um índice de popularidade de 67%, quatro pontos percentuais a mais que Ronald Reagan e 11 pontos acima de George Bush, pai de seu sucessor.
Além das estocadas em Bush, Clinton deixa a Casa Branca tendo colocado cascas de banana no caminho de seu sucessor.
Entre entrevistas e discursos emocionados de despedida, Clinton assinou, no último mês, portarias e regulamentos criando facilidades e benefícios inéditos para sindicatos de trabalhadores, entidades ambientais e outros grupos de interesse contrários à plataforma corporativa de Bush.
Entre as medidas, já chamadas de "pacote de maldades" por republicanos, Clinton permitiu que entidades ambientais tenham acesso a acordos internacionais de comércio antes de serem assinados pela Casa Branca, criou áreas de proteção ambiental em propriedades que seriam usadas comercialmente por interesses ligados a Bush, proibiu contratos públicos com empresas que desrespeitem leis trabalhistas e relaxou o sigilo fiscal de autoridades.
"Estamos acompanhando com preocupação essas medidas de última hora e tomaremos decisões a respeito depois que Bush assumir o cargo", disse Scott McClellan, porta-voz da equipe de transição do novo governo.
Embora possa revogar todas essas medidas em seu primeiro dia de governo, Bush arcará com um custo político que não esperava.
Carl Pope, diretor executivo do Sierra Club, uma das principais entidades ambientais dos EUA, disse que seu grupo e outras organizações conservacionistas lutarão contra qualquer tentativa de Bush de rever as medidas ambientais de Clinton. "São avanços importantes que precisam ser mantidos", disse ele.
O mundo corporativo reagiu com indignação. "Não ficaremos quietos enquanto os últimos dias da administração são usados para criar regras motivadas politicamente que, se mantidas, teriam um efeito devastador sobre empresas e trabalhadores", disse Thomas Donohue, presidente da Câmara de Comércio dos EUA. Donohue apoiou Bush.
A medida que mais irritou os empresários foi a portaria que proibiu agências federais de assinarem contratos com empresas que violarem leis trabalhistas e ambientais. Uma obsessão de Clinton durante seus dois mandatos, a idéia foi discutida pela Casa Branca com empresários nos últimos dois anos. Segundo a Câmara de Comércio, governo e companhias haviam concordado que uma portaria só seria baixada de forma consensual -o que não acabou ocorrendo.
A maior prejudicada foi a Enron, que financia campanhas de Bush desde que ele se lançou à vida pública, na década de 80. Bush e a Enron defendem o aumento das áreas de exploração de petróleo nos EUA, idéia combatida pelos ambientalistas.


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