São Paulo, terça-feira, 19 de abril de 2011

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ANÁLISE

Fragilidade americana tende a realimentar incerteza global

FERNANDO SAMPAIO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há muitas décadas, considera-se que os títulos de dívida emitidos pelo Tesouro Nacional dos EUA têm risco baixíssimo de inadimplência.
A percepção generalizada de que é muito remota a perspectiva de o governo americano não conseguir honrar esses títulos, aliada ao fato de que tradicionalmente é muito fácil encontrar quem queira comprá-los, os coloca como a referência central de mercado ("benchmark"): há décadas, os demais títulos de dívida (de governos e empresas) embutem na remuneração que pagam a quem os compra um prêmio pelos riscos maiores em que o investidor incorre ao preterir a compra de um "Treasury".
É por isso que o anúncio feito ontem pela agência Standard & Poor's, de que estuda rever para pior a sua avaliação do risco de inadimplência do Tesouro dos EUA, foi recebido com certo espanto. E o fato perturbador acabou apontado como fator para a queda das Bolsas e das moedas de vários países (como o real) mundo afora.
Esse movimento é paradoxal: uma das mais importantes das agências dedicadas à avaliação de risco de ativos financeiros afirma ter dúvidas se o porto mais seguro das finanças globais ainda deve ser visto como tal, e os investidores, ao invés de correr para se desfazer dos seus "Treasuries" e demais ativos ligados ao dólar, fazem o movimento inverso: vendem outros ativos, considerados de risco mais alto. Em outras palavras, fogem para o dólar, ao invés de fugir do dólar.
Movimentações paradoxais como essas têm sido observadas com frequência desde que o frenesi global de crédito e de especulação iniciado em 2003 desaguou em grave crise financeira, a partir de meados de 2007.
O paradoxo das commodities também é perturbador.
Devido às dificuldades atravessadas pelos países desenvolvidos, e apesar do dinamismo de muitas economias de renda mais baixa (como o Brasil e, muito mais importante, a China), no mundo considerado como um todo ainda há bastante desemprego e máquinas paradas.
E, no entanto, a grande maioria dos produtos primários se encontra com cotações entre as mais altas da história.
Essas constatações reiteram o receio de que os impasses gerados pela crise financeira -sobretudo a aguda fragilização das finanças dos governos de vários países de renda mais alta, a começar pelos EUA- ainda por um bom tempo tenderão a realimentar o clima global de grande incerteza.

FERNANDO SAMPAIO, economista, é sócio-diretor da LCA Consultores.


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