São Paulo, quarta-feira, 19 de julho de 2006

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Com novos ataques, Beirute acorda do sonho da reconstrução

Cidade vê retrocesso do impulso ao turismo e à economia após a guerra civil

GUSTAVO CHACRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE NOVA YORK

A Nigéria também anunciou que retirará 5.000 cidadãos nigerianos que estão no Líbano. Essa medida deixa claro o caos que se tornou o território libanês em menos de uma semana. Um país envolto a inúmeros conflitos civis como a Nigéria teme pela segurança de seus cidadãos na região.
O site do projeto Solidere (www.solidere-online.com.lb), levado adiante pelo premiê Rafik Hariri, morto em atentado em 2005, continuava no ar ontem tentando vender a imagem de uma Beirute reconstruída por US$ 2 bilhões.
A estratégia libanesa para alavancar sua cambaleante economia nos últimos anos foi vender a imagem de que o país estava reerguido da guerra civil e que Beirute voltava a ser a mais atraente cidade do Oriente Médio, com suas praias, restaurantes e a possibilidade de, como os libaneses gostam de dizer, tomar um banho de mar e esquiar no mesmo dia.
O bilionário Hariri esteve duas vezes no Brasil para vender este novo Líbano, abrindo inclusive uma empresa com este nome (Novo Líbano). Seu filho esteve em São Paulo no ano passado para manter de pé o ideal do pai, com o objetivo de atrair um número maior de brasileiros para visitar o Líbano. O Brasil sempre foi considerado um mercado potencial para os libaneses, pois vivem no país cerca de 6 milhões de descendentes -a população do Líbano é de 3,4 milhões.
O objetivo de Hariri foi alcançado. O clube Monte Líbano de São Paulo voltou a organizar viagens para o Líbano como fazia nos anos 60 e 70. Milhares de outros foram por conta própria aproveitando ofertas de agências de turismo. Novamente os descendentes podiam visitar com segurança as cidades de onde vieram as suas famílias, como Marjayoun, Hasbaya, Rachaya e muitas outras.
Excursões foram organizadas para que os jovens descendentes de libaneses pudessem conhecer o Líbano moderno, com as atracões da rua Monot em Beirute, as boates de Kaslik, ao norte da cidade, e visitar os festivais de música nas ruínas romanas de Tiro e de Baalbeck ou os restaurantes à beira-mar de Biblos, antiga cidade dos fenícios.
No ano passado, durante a Revolução dos Cedros, parecia claro que o Líbano se tornaria novamente um grande destino turístico, como nos anos 60, com capas em revistas no Brasil e no mundo. Muitos árabes de países mais ricos no golfo Pérsico passaram a ver em Beirute a possibilidade de aproveitar a vida ocidental sem ir para o Ocidente, onde muitos passaram a se sentir mal recebidos após o 11 de Setembro. Redes de hotéis também investiram dinheiro no mercado libanês, assim como restaurantes e companhias aéreas.

Pesadelo
Mas tudo terminou nesta semana. Não foi a primeira vez que o Líbano foi bombardeado no verão. Nos anos 90, isso já havia acontecido durante a operação "Vinhas da Ira". Mas naquela época Israel ainda ocupava o sul do Líbano, que permanecia em guerra.
Desta vez, para os libaneses, o país dos cedros já estava reconstruído. O velho centro de Beirute havia deixado de ser aquela cidade fantasma para se converter num centro onde todas as diversas facções se juntavam para aproveitar as noites do verão sem brigas.
Com o seqüestro dos soldados pelo Hizbollah e o conseqüente ataque israelense, essa região de Beirute está novamente às moscas, apesar de ainda não ter sido alvejada, ao contrário do sul do capital. Festivais de música foram cancelados, os hotéis esvaziaram, os moradores que puderam fugiram para as montanhas e os estrangeiros se espremem em navios para deixar o país.
E Beirute mais uma vez se converte no destino preferido dos jornalistas de guerra. Para muitos libaneses, o país havia acordado do pesadelo da guerra civil. Agora, muitos acham que acordou de um sonho no qual ele havia sido reconstruído.


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