|
Próximo Texto | Índice
IRAQUE SOB TUTELA
Ex-ditador é acusado da morte de 143 xiitas e pode ser levado à forca; defesa quer adiamento do processo
Sob críticas, começa julgamento de Saddam
DA REDAÇÃO
Quase 23 meses após ser encontrado em um buraco no povoado
de Ad Dawr, nas cercanias de Tikrit, onde foi criado, Saddam
Hussein, o ditador que governou
o Iraque de 1979 a 2003, vai hoje a
julgamento. Dentre as muitas
acusações que pesam contra ele,
foi escolhida para o primeiro procedimento (do que pode vir a ser
uma série) a mais simples de levantar provas: a execução de 143
xiitas no vilarejo de Dujail, norte
do país, em 1982. A pena máxima
prevista é o enforcamento.
De hoje até o eventual cadafalso,
no entanto, é possível se desenrolar uma novela. Para começar, o
principal advogado de Saddam,
Khalil al Dulaimi, anunciou ontem que pediria um adiamento de
três meses no processo. Motivo: a
defesa não teve tempo e acesso suficientes para examinar as pilhas
de documentos sobre o caso.
Segundo envolvidos no julgamento, a corte deve conceder o
adiamento, ainda que por um período menor do que o solicitado.
"Vamos alegar que é inconstitucional levar a julgamento o presidente legítimo do Iraque", declarou Al Dulaimi. "Saddam Hussein é o presidente legítimo, e a
corte é ilegítima, pois a invasão
norte-americana é ilegal, e tudo
que foi construído a partir dela é
tão ilegal quanto ela."
Embora a existência do tribunal
-criado especialmente para julgar os crimes referentes ao regime
do ex-ditador e de seu partido
Baath- tenha sido chancelada
pela Assembléia Nacional iraquiana, ele foi criado pela autoridade provisória dos EUA, com dinheiro vindo principalmente de
Washington, e teve seus cinco juízes treinados pelos americanos.
Outro ponto contestado é se o
fato de Saddam ser julgado por
iraquianos que viveram seu sangrento regime lhe daria a chance
de um julgamento imparcial.
No último domingo, a organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch emitiu
um documento que critica duramente o tribunal. Entre outras
coisas, observa que não há necessidade de que o ex-ditador seja
"comprovadamente culpado,
além de dúvidas razoáveis", alega
que as disputas entre as facções
políticas iraquianas pelo controle
do tribunal prejudicaram seu
equilíbrio e cita a impossibilidade
de o ex-ditador, se condenado à
morte, ter a pena comutada.
Para os críticos, Saddam deveria
ser julgado em uma corte internacional, como o ex-ditador iugoslavo Slobodan Milosevic.
Mas o premiê Ibrahim al Jaafari
afirma que o tribunal iraquiano é
justo e que o ex-ditador é culpado.
"Não acho que haja crimes mais
evidentes no mundo do que os
cometidos por Saddam", disse.
Cinco parentes do xiita Al Jaafari
foram executados durante o regime do ex-ditador. Já a Casa Branca, pelo porta voz Scott McClellan, declarou que "decidir como
punir Saddam Hussein por seu
crimes contra a humanidade e as
brutalidades contra os iraquianos" depende da população local.
Não está certo ainda que o julgamento será televisionado, como aventado na semana passada.
Além de Saddam, sete de seus
ex-assessores, incluindo o ex-vice
Taha Yassin Ramadan, vão a julgamento. Segundo a acusação,
eles são responsáveis pela morte
de 143 xiitas e pelo seqüestro e pela destruição das propriedades de
outras 399 famílias do povoado de
Dujail, onde Saddam sofreu uma
tentativa de assassinato em 1982.
Se condenado à morte, Saddam
pode apelar. Mas, uma vez emitida a decisão final, deve ser executado em até 30 dias. Caso não receba a pena máxima, o ex-ditador
deve passar por novos julgamentos referentes a outros crimes, entre eles o massacre de cerca de 180
mil curdos na campanha de Anfal
(1987-88) e acusações ligadas à
guerra com o Irã (1980-88).
Al Dulaimi, que se reuniu ontem por 90 minutos com Saddam,
disse que ele está com "o moral alto" e "confia em sua inocência".
Com agências internacionais
Próximo Texto: Caso deverá ter impacto político considerável, afirmam analistas Índice
|