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ARTIGO
O estado do discurso
WILLIAM SAFIRE
DO "NEW YORK TIMES"
O grande evento desta semana
da campanha presidencial é o discurso que o presidente George W.
Bush fará sobre o Estado da
União. Seguem 12 pontos que merecem ser observados.
1. Saudações: "Meus compatriotas" foi a fórmula usada por dois
séculos; hoje, é sexista. "Colegas
americanos" funciona melhor.
2. Adjetivo definidor: o Estado
da União é ...o quê? "Forte" é bem
visto; JFK usava "bom"; Gerald
Ford, em seu primeiro discurso,
ousou qualificá-lo de ""não bom".
Se Bush escolher um adjetivo novo, vai reverberar.
3. Aplausos interrompendo o
discurso: o Congresso, em sessão
conjunta, se dispõe a bater palmas
a cada vez que o presidente muda
a direção de seu olhar. Mas observe como os líderes democratas
Tom Daschle e Nancy Pelosi farão
questão de deixar as mãos bem
paradas. Veja, também, as reações cuidadosamente moduladas
dos pré-candidatos John Kerry,
Joe Lieberman, John Edwards e
Richard Gephardt, se é que terão
tempo de comparecer.
4. Tema dominante: "Guerra ao
Terror" já cansou, mas "Era da Liberdade" ainda não pegou por
completo. "Sociedade de oportunidades" é demasiado voltado
apenas à platéia nacional. Como o
discurso tem de mencionar tantos
assuntos diferentes, teremos sorte
se for possível interligar os três
pudins temáticos principais.
5. Apontar com orgulho: Bush
deve primeiro nos assegurar de
que estamos vivendo um novo
boom econômico, depois atribuir
a si mesmo o crédito por ele, mostrando como as reduções que
promoveu nos impostos propiciaram a virada da recessão pós-bolha que ele herdou de "uma administração anterior", cujo nome
ele nunca menciona.
6. Colocando panos quentes no
abacaxi étnico que veio à tona na
semana passada: Bush vai dar as
boas-vindas aos 10 milhões de
"ilegais" que hoje vivem nas sombras. Apesar de negar que se trate
de uma anistia -palavra que, para os conservadores, tem aquele
som incômodo de giz riscando
uma lousa-, deverá repetir em
tom dramático a oferta que fez
aos hispânicos que trabalham duro e não têm documentos.
7. Para levar adiante o idealismo
kennedyesco da inusitada prévia
publicitária do discurso: salto direto da Lua para Marte.
8. Mais temas roubados da oposição: não basta que o Medicare
(sistema de saúde) pague remédios para os idosos. A expectativa
é que Bush proponha que as despesas com saúde possam ser deduzidas dos impostos de todos,
menos os muito ricos.
9. Compaixão criativa: este pode
ser o momento apropriado para
entregar às pessoas um controle
maior sobre seu próprio futuro,
ampliando as poupanças com incentivos fiscais. Bush pode, ainda,
moderar a idéia da emenda contra o casamento de homossexuais, oferecendo incentivos aos
heterossexuais de baixa renda para que continuem casados.
10. Destaque de última hora ligado ao noticiário: algo de positivo relativo às reuniões de Paul
Bremer com o secretário-geral da
ONU, Kofi Annan, mostrando
que Bush encontrou um "papel
vital" que a ONU deve exercer na
construção do Iraque.
11. A justeza moral e o alcance
histórico da combinação de defesa da pátria com ataque preventivo: a decisão de Bush de levar a
guerra até o inimigo virou ponto
central de sua Presidência; ele será
obrigado, hoje, a reafirmar com
eloqüência seus objetivos e sua intenção de "manter-se firme no rumo empreendido". Ao mesmo
tempo, não deve hesitar em reconhecer o custo humano. Seria o
caso de observar um momento de
silêncio em homenagem às vítimas da coalizão e iraquianas.
12. Será que Bush vai evocar a
bênção de Deus no meio do clima
secular e político de hoje à noite?
Pode contar com isso.
Tradução de Clara Allain
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