São Paulo, quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

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EUA manterão embargo, diz Washington

Presidente Bush pede "eleições livres", ecoado por John McCain; democratas Obama e Hillary adotam tom conciliador

Dezenas saem às ruas em Little Havana, em Miami, mas com menos entusiasmo do que em 2006, quando Fidel se afastou por doença

SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A MIAMI (FLÓRIDA)

A Casa Branca reagiu com ceticismo à renúncia de Fidel Castro ontem, enquanto candidatos da oposição e parlamentares de ambos os partidos pediram mudanças na política dos EUA em relação a Cuba. Já em Little Havana, encrave de exilados cubanos e descendentes no coração de Miami (Flórida), houve menos comemoração do que em 2006, quando foi anunciada a doença do líder.
Informado da renúncia durante escala em Ruanda, na África, o presidente George W. Bush afirmou que o país deveria convocar eleições para escolher um sucessor depois de meio século de governo comunista. "E eu quero dizer [eleições] livres e justas, não as encenadas que os irmãos Castro tentam vender como democracia real", afirmou Bush.
"Os EUA vão ajudar o povo de Cuba a perceber as benesses da liberdade", afirmou, sem detalhar como o país faria isso. Indagado sobre se o ato mudava algo na conturbada relação entre os dois países, Bush respondeu: "A pergunta na verdade deveria ser o que [a renúncia] significa para o povo de Cuba. Foram eles que sofreram sob Fidel Castro".
Em Washington, John Negroponte, o número dois do Departamento de Estado, disse que o fim do embargo imposto pelos EUA à ilha era "improvável". Por decisão de 1962, ratificada em 1992 e ampliada em anos seguintes, os norte-americanos são proibidos de fazer transações financeiras, econômicas e comerciais com Cuba, com exceções humanitárias.
Em carta enviada ontem à secretária de Estado, Condoleezza Rice, mais de cem representantes (deputados federais) de ambos os partidos majoritários pediram uma revisão completa dessa política. "Isso é uma relíquia da Guerra Fria", disse o democrata James McGovern, de Massachusetts.
"Políticos americanos têm sido historicamente tímidos ao discutir mudanças nessa política, largamente devido a sua pouco saudável e irracional obsessão com Fidel Castro", afirmou, em teleconferência ontem. "Agora, ele saiu de cena, e devemos ver isso como uma oportunidade."

Na campanha
É pouco provável que Bush ou o atual Congresso consigam fazer algo antes das eleições. Não foi por outro motivo que os três principais pré-candidatos a sua sucessão se manifestaram a respeito da renúncia.
Repetindo o discurso mais confrontador da Casa Branca, o republicano John McCain disse que a renúncia estava "atrasada em meio século". "A liberdade para o povo cubano ainda não está ao alcance, e os irmãos Castro claramente pretendem se manter aferrados ao poder", disse. "Devemos pressionar o regime a soltar os presos políticos, legalizar os partidos e convocar eleições monitoradas internacionalmente."
Já o senador democrata Barack Obama afirmou que o dia de ontem "deveria marcar o fim de uma era sombria na história de Cuba". Para o candidato da oposição, que tem como proposta de política externa um diálogo com os dirigentes estrangeiros considerados inimigos, "os EUA devem estar preparados para tomar os primeiros passos para normalizar as relações e afrouxar o embargo".
O mesmo tom conciliatório foi adotado por Hillary Clinton. "Eu diria à nova liderança [cubana] que o povo dos EUA está pronto para encontrá-la se ela se mover em direção ao caminho da democracia."

Na "calle" Ocho
Em 2006, ao chegar a notícia de que Fidel Castro estava doente e os rumores de que corria risco de morte, centenas foram às ruas com bandeiras, buzinaço e cantos de "na, na, na, na, Fidel, good-bye". Ontem, cerca de cem pessoas se reuniam em frente ao tradicional restaurante Versailles, na "calle" Ocho. Dos 3 milhões de hispânicos da Flórida, estima-se que 500 mil sejam cubanos.
Miguel Saavedra não se impressiona com a notícia. "Isso não passa de um show que o governo de Havana criou para agitar a mídia e confundir o povo de Cuba", diz o líder do grupo anticastrista Vigília Mambisa. Ainda assim, ele comemorava com uma bandeira cubana.
Nas rádios voltadas para a comunidade, comentaristas veteranos baixavam o tom. "É um dia como outro qualquer", disse o apresentador Armando Pérez Roura, da Rádio Mambi. "Mudança será quando os cubanos não forem mais perseguidos pelo que pensam, quando houver liberdade de expressão e eleições de verdade."
Em Miami, o comando da Guarda Costeira não mudou a rotina. "Está tudo normal", disse Barry Bena, porta-voz da força. Em 2006, as autoridades locais lidaram com a hipótese de um êxodo em massa da ilha para a Flórida, que dista apenas 145 km. Segundo Bena, até a conclusão desta edição não havia atividades fora do comum.


Com agências internacionais


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