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O NOVO PAPA
JOSEPH RATZINGER
Igreja opta pelo reforço da ortodoxia e elege como papa o principal teólogo conservador do Vaticano
Bento 16
CLÓVIS ROSSI
IGOR GIELOW
ENVIADOS ESPECIAIS A ROMA
A Igreja Católica escolheu ontem o cardeal
alemão Joseph Ratzinger, 78 anos completados sábado, para ser o 265º papa, se computado também são Pedro, que a tradição católica
diz ter sido o primeiro pontífice.
Ratzinger adotou o nome de Bento 16.
Ao eleger Ratzinger, os 115 cardeais eleitores escolheram o mais radical defensor da ortodoxia doutrinária não só por sua função
-durante 23 anos foi o prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé de João Paulo 2º-
mas também por suas fortes opiniões pessoais.
Bento 16 inicia o seu pontificado de maneira
pouco comum. Ao contrário de seus antecessores, que costumavam desenhar sua linha
pastoral a partir da missa de entronização, no
domingo seguinte à eleição, Ratzinger o fez na
missa imediatamente anterior à escolha.
Foi anteontem, na missa "pro eligendo papa", que lhe coube celebrar, na qualidade de
decano do Colégio dos Cardeais. Ratzinger defendeu a ortodoxia, ao dizer que "ter uma fé
clara, de acordo com o credo da igreja, muitas
vezes foi rotulado como fundamentalista".
Atacou o "relativismo" -a linha liberal, no
jargão da igreja. "O relativismo, que se "deixa
arrastar para cá e para lá pelos ventos doutrinários", parece ser o único sistema aplicável
aos tempos modernos."
O cardeal alemão entrou para o conclave na
tarde de segunda como o favorito e o grande
porta-bandeira da corrente que ele próprio assumiu como "fundamentalista", embora preferisse chamá-la de defensora da "fé adulta".
Ajudou-o, além de não haver cardeal que liderasse a corrente oposta, também o fato de,
por sugestão sua, os cardeais terem decretado
blecaute informativo nos dias anteriores ao
conclave, recusando-se a dar entrevistas.
Coube a Ratzinger a última palavra antes
que os eleitores se trancassem na capela Sistina. Sua homilia foi talvez o único manifesto
político-doutrinário com começo, meio e fim
que pôde ser emitido antes das votações.
O novo papa conquistou 2/3 necessários à
eleição na quarta votação, ontem à tarde. Só se
conhecerá o número exato dos cardeais que o
escolheram se e quando vazarem depoimentos
dos prelados, obrigados ao sigilo perpétuo.
Foi o mesmo tempo e o mesmo número de
escrutínios necessários para eleger João Paulo
1º, em 1978, recorde de brevidade só superado,
no século 20, por Pio 12, eleito em 1939 nos
mesmos dois dias, mas com três votações.
A queima dos votos e das anotações usados
no conclave deveria gerar uma fumaça branca
quando o papa tivesse sido escolhido. Mas o
que se viu no fim da tarde na praça São Pedro
tomada por cerca de 100 mil pessoas era mais
próximo de uma fumaça cinza. A eleição foi
confirmada, para o público, pelo soar dos seis
sinos da basílica de São Pedro, um ato novo, às
18h03 de ontem (13h03 em Brasília).
Bento 16 apresentou-se à massa como "um
simples, humilde trabalhador na vinha do Senhor". Fez um contraponto com o "grande papa João Paulo 2º". "Consola-me o fato de que o
Senhor sabe trabalhar e atuar com instrumentos insuficientes e, sobretudo, confio em vossas orações", afirmou, antes de dar a bênção
"urbi et orbi" (à cidade e ao mundo), no balcão
acima da porta principal da basílica.
A eleição de Ratzinger em princípio elimina
a perspectiva de abrandamento da igreja em
temas relativos ao uso do corpo (métodos anticoncepcionais, casamento de homossexuais,
pesquisas com células-tronco e aborto) e a flexibilização das regras sobre participação da
mulher e de de divorciados na vida eclesial.
"Não será um homem que, pelo diálogo, se
arriscará a diluir a fé e a doutrina", antecipou o
presidente do Senado italiano, Marcello Pera,
que foi co-autor de um livro com Ratzinger.
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