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São Paulo, domingo, 20 de julho de 2003

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REINO UNIDO

Polícia confirma morte de cientista -provavelmente por suicídio- envolvido em polêmica dos relatórios sobre o Iraque

Blair pede calma e evita falar de renúncia

Katsumi Kasahara/ Associated Press
O premiê britânico, Tony Blair, em Tóquio, responde a perguntas sobre a morte do especialista em armas David Kelly


DA REDAÇÃO

A polícia britânica confirmou ontem que um corpo encontrado na véspera pertencia ao especialista em armas de destruição em massa David Kelly, 59, conselheiro do Ministério da Defesa envolvido nas acusações de manipulação de informações sobre o Iraque pelo governo britânico.
Ele provavelmente se matou, segundo a polícia.
As acusações foram o estopim de uma crise política no gabinete do premiê Tony Blair, agravada agora pela morte de Kelly. Uma pesquisa da Mori de 29 de junho mostrou que Blair tem o apoio de apenas 35% dos britânicos -no início do ano era de 49%- e que 58% dizem não confiar nele.
No Japão, escala de um giro diplomático pela Ásia, Blair lamentou a morte do cientista e anunciou a abertura de um inquérito, pedindo que se evitassem especulações até o fim da investigação.
"Espero que possamos deixar de lado as especulações e a troca de acusações", declarou Blair após deixar uma reunião com o premiê Junichiro Koizumi perto de Tóquio. "Devemos mostrar respeito e conter as emoções. Eu volto a expressar meu profundo pesar por essa tragédia." Abatido, ele não respondeu a perguntas sobre uma possível renúncia.
Questionado por um repórter "se tinha as mãos sujas de sangue", Blair permaneceu sério e não respondeu.
Junto do corpo de Kelly, achado em um bosque em Southmoor (região central da Inglaterra), foram encontradas uma faca e uma caixa de analgésicos. "A causa da morte foi uma hemorragia provocada por um ferimento no pulso esquerdo, aparentemente causado por instrumento cortante", disse um porta-voz da polícia.
O líder do Partido Conservador (oposição), Iain Duncan Smith, exortou Blair a voltar a Londres, mas o gabinete de Blair afirmou que a viagem de uma semana à Ásia não será encurtada.
A parlamentar trabalhista (governista) e ex-atriz Glenda Jackson, crítica da guerra, pediu a renúncia do premiê. "Não vejo como o governo pode funcionar direito", afirmou.

Sem suspeitos
"Nossa investigação prossegue, mas não há indício, no momento, de que outra pessoa esteja envolvida [na morte de Kelly]", disse o porta-voz da polícia. A palavra "suicídio" é evitada por policiais.
Janice Kelly, mulher do cientista, registrou seu desaparecimento na noite de quinta-feira, após ele não voltar de uma caminhada.
Segundo Janice, Kelly estava extremamente nervoso por estar envolvido na polêmica. Dois dias antes, ele testemunhara à Comissão de Assuntos Externos do Parlamento que investiga o uso das informações sobre o Iraque.
Kelly foi apontado como a fonte de um repórter da BBC que acusou o principal porta-voz de Blair, Alastair Campbell, de ter mudado um relatório sobre as supostas armas de destruição em massa iraquiana para deixá-lo "mais sexy" e conquistar apoio para a guerra.
O cientista, no entanto, negou veementemente que tivesse dado as informações ao jornalista Andrew Gilligan, mas confirmou tê-lo encontrado. Gilligan não revelou sua fonte, mas não negou que fosse o cientista.
A reportagem da BBC deu origem a uma troca de acusações entre a rede de rádio e TV, de controle público, e o governo. Após a divulgação do artigo, cresceram as pressões vindas tanto da oposição como do próprio Partido Trabalhista para que Blair e seu gabinete esclarecessem se as informações falsas sobre o Iraque foram usadas deliberadamente para cooptar a opinião pública.
Críticos da guerra disseram que Kelly foi "sacrificado" para preservar a reputação de Blair e Campbell ao ser forçado a desmentir a BBC. "Acho que ele não conseguiu lidar com a tempestade", disse o jornalista Tom Mangold, amigo próximo do cientista.

Com agências internacionais

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