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São Paulo, domingo, 20 de julho de 2003

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Brasileiros "formam" camponeses latino-americanos

DA REDAÇÃO

Não é só pela fama que o MST brasileiro vem influenciando outros grupos latino-americanos. Desde 1998, o MST é o anfitrião de um seminário anual, organizado pela Cloc (Coordenadoria Latino-americana de Organizações do Campo), denominado "Curso de Capacitação de Militantes de Base do Cone Sul", do qual participam diversas organizações camponesas latino-americanas.
O último seminário foi realizado em abril, em Foz do Iguaçu (PR). Entre os participantes, havia 37 paraguaios, 14 argentinos e cinco chilenos. Em outras ocasiões, em seminários realizados no interior do Mato Grosso do Sul, houve participação também de bolivianos, costarriquenhos, colombianos, cubanos, equatorianos, guatemaltecos, salvadorenhos, haitianos, hondurenhos e mexicanos, entre outros.
A existência do seminário levou grupos de ruralistas a protestarem contra o que chamaram de "curso de guerrilha". "É uma espécie de exportação do know-how do MST", afirma João Bosco Leal, presidente do MNP (Movimento Nacional dos Produtores).
Os dirigentes do MST dizem que o grupo "não ensina nada" nos cursos, que serviriam como fórum de debates e troca de experiências. "Qualquer coisa que fazemos, os fazendeiros dizem que é curso de guerrilha", reclama Egídio Brunetto, coordenador nacional do MST baseado no MS e membro da Secretaria de Relações Internacionais do grupo.
"Como é que vamos ensinar alguém a ocupar terra se isso é feito há 500 anos, não fomos nós que inventamos?", questiona ele. "O curso é para debater coisas como o neoliberalismo, a questão das sementes transgênicas, a Alca."
A página do MNP na internet destaca alguns trechos da apostila do curso, com frases sobre ocupações, "desobediência civil" e "luta revolucionária".
Uma militante do MST que participou de um dos seminários diz que as frases foram tiradas do contexto e que algumas dessas idéias podem até mesmo ser compartidas por alguns membros do movimento ou das organizações internacionais, mas não fazem parte do objetivo do curso.
Segundo Brunetto, a integração latino-americana é um dos objetivos do MST, mas o grupo não pretende exportar modelos para os demais grupos. "O que nós buscamos é levar solidariedade para os outros. O que é que teríamos para ensinar para os bolivianos, por exemplo, que têm uma história de luta muito mais antiga que a nossa e que conseguiram uma reforma agrária há 50 anos?", diz. Segundo ele, a próxima conferência internacional da Via Campesina (ONG mundial de defesa da reforma agrária), que será realizada no Brasil no ano que vem, servirá "para discutir a integração latino-americana".
A Via Campesina é um dos principais fóruns nos quais o intercâmbio entre as organizações camponesas acontece. O MST é o único representante brasileiro na organização, que reúne também, na América do Sul, grupos representativos como a Confederação Camponesa do Peru, a Confederação Nacional Agrária, também do Peru, a Confederação Sindical Única de Trabalhadores Camponeses da Bolívia e a Federação Nacional Sindical Unitária Agropecuária, da Colômbia.
"A luta pela terra está se estendendo pela América Latina, e sem dúvida o MST tem inspirado esse movimento", afirma Rafael Alegria, secretário internacional de Operações da Via Campesina. "Mas cada um tem sua característica, ninguém precisa copiar o MST", diz. (ROGERIO WASSERMANN)

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