São Paulo, sábado, 20 de outubro de 2007

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Benazir culpa serviço secreto por ataque

Alvo de megaatentado, ex-premiê do Paquistão evita acusar o ditador Musharraf, com quem tenta costurar acordo político

Explosões mataram mais de 130 no sul do país; líder política, que acaba de voltar do exílio, promete "viver ou morrer" com paquistaneses

Rizwan Tabassum/France Presse
Funeral de vítima do ataque de quinta em Karachi; atentado duplo contra a caravana da ex-premiê Benazir Bhutto deixou ao menos 139 mortos e feriu mais de 150

CLARA FAGUNDES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Após escapar ilesa dos atentados que mataram 136 pessoas nas comemorações de seu retorno, Benazir Bhutto disse ontem saber quem tentou assassiná-la. A ex-premiê, que evitou responsabilizar diretamente o ditador Pervez Musharraf -com quem há meses negocia um ainda inconcluso acordo-, disse que o ataque foi planejado por dignitários do ex-ditador Mohammed Zia (1977-88) infiltrados na agência central de inteligência do Paquistão, ISI.
"Nos culpamos uma agência de inteligência e exigimos ação contra ela. Não foram os militantes", disse o marido de Benazir, Asif Zardari, à TV Geo. Em 1977, o golpe de Zia derrubou Zulfikar Bhutto, pai de Benazir e fundador do PPP (Partido do Povo Paquistanês).
A ex-premiê disse não estar intimidada e prometeu ficar para "viver ou morrer" com os paquistaneses. "Esse ataque não se dirigia a mim, mas ao processo democrático", afirmou Benazir, que liderará o PPP nas eleições parlamentares previstas para janeiro.
Nenhum grupo reivindicou a autoria das explosões de quinta, provocadas por uma granada e um homem-bomba. Os investigadores, que têm grupos jihadistas entre os principais suspeitos, tentam identificar o suicida -a cabeça do suposto terrorista, um homem de aproximadamente 20 anos, foi encontrada no local.
De acordo com o jornal paquistanês "Dawn", o terrorista correu em direção ao veículo de Benazir instantes antes da explosão, alertando os manifestantes, aos gritos: "bomba, bomba". Poucos conseguiram se afastar a tempo.

Retórica islamista
Benazir tinha sido alertada, no início desta semana, para três ataques planejados por organizações ligadas ao grupo terrorista Al Qaeda e à milícia fundamentalista Taleban. Numa bravata com tintas eleitorais, desdenhou: muçulmanos não ousariam tanto, pois sabem que "queimariam no inferno" por atacar uma mulher.
As referências religiosas têm sido constantes nos primeiros dois dias da ex-premiê no Paquistão, após oito anos de exílio. Ontem, ela homenageou as vítimas do atentado, "que fizeram o sacrifício máximo".
Ainda não se sabe o impacto da recém-adotada retórica islâmica de Benazir, que lidera um partido laico. O seu retorno atraiu uma multidão vinda de vários lugares do país e coloriu com as cores da bandeira paquistanesa as ruas de Karachi, no sul do Paquistão. Mas, entre os eleitores históricos do PPP, as credenciais democráticas de Benazir estão desgastadas pelo flerte com o regime ditatorial.

Longe de um consenso
"Ela não é tão popular no Paquistão [quanto no Ocidente]", comentou o analista político Rasul Rais, da Universidade de Lahore, em entrevista à Folha. Investigada por corrupção e lavagem de dinheiro também na Europa, Benazir terá ainda de convencer os céticos da alegada "motivação política" de todas as acusações contra ela.
O professor considera improvável que o PPP, ou qualquer outro partido, alcance maioria nas eleições de janeiro. "Os paquistaneses têm muita simpatia pelas vítimas de ataques terroristas. Mas ainda é incerto se Benazir conseguirá capitalizar isso politicamente."
Sobre o acordo com Musharraf, Rais diz ser cedo para comentar. Só será possível vislumbrar o posicionamento das peças no tabuleiro eleitoral após as decisões da Suprema Corte sobre a elegibilidade do ditador, a anistia dada a Benazir e a situação de Nawaz Sharif -o premiê deposto em 1999 teve sua tentativa de retorno frustrada em setembro.
Para o analista, a questão não é tanto quais agremiações se alinharão mas se, em conjunto, conseguirão estabelecer uma competição nos moldes legais. "Há uma forte percepção de que, para as eleições serem justas, é necessária a participação de todos os atores políticos."

Com agências internacionais


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