São Paulo, quarta-feira, 20 de outubro de 2010

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O IMPÉRIO VOTA

Expresso anti-Obama

Folha pega carona em ônibus de conservadores que cruza os EUA, levando pessoas que querem "resgatar" o país das políticas do presidente

ANDREA MURTA
ENVIADA ESPECIAL A RENO E ELKO (NEVADA)

Anoitece, a temperatura cai, mas cerca de 200 conservadores e curiosos aguardam pacientemente em um gramado da pequena Elko (Nevada), de 17 mil habitantes, pela chegada do comboio do grupo político ultraconservador Tea Party Express.
É a segunda parada do tour do grupo, parte da rede de ativistas antigoverno conhecida como Tea Party, que se tornou a sensação das campanhas para o Congresso dos EUA em 2010.
O comboio de três ônibus luxuosos, seguidos por vans de grandes redes de TV, ainda percorrerá 28 cidades pelas próximas duas semanas, chegando em Concord (New Hampshire) na véspera da eleição do próximo dia 2.
A Folha pegou carona entre Reno, onde a excursão começou, anteontem, e Elko, uma viagem de cinco horas pelo deserto do Nevada.
Em uma eleição que poderá ser desastrosa para o Partido Democrata, a influência dos grupos do Tea Party é inegável.
Mesmo sem garantias de conquista de cadeiras para seus candidatos, os ultraconservadores já obtiveram vitória ao forçar quase todas as campanhas para a direita.
Um dos trunfos, além da impopularidade do governo em meio à crise, é o foco nos "grotões" do país.
Em seu tour, o Tea Party Express chegará a fazer seis comícios em um único dia, em cidadezinhas perdidas da "América profunda".
"Vamos a lugares como o norte de Michigan, onde nenhum outro grupo político vai. Nosso alcance é único", diz Howard Kaloogian, fundador da iniciativa.
É assim que americanos que nunca antes se envolveram em política vêm se engajando, atraídos pelo discurso que prega governo mínimo e faz críticas alarmistas ao "socialismo" da Casa Branca.

BANDA DE ROCK
Na estrada, não há desconforto. "Às vezes parece que estamos num tour de uma banda de rock", afirma Kaloogian.
Entre um comício e outro, há festinhas, brigas, banheiros entupidos, incontáveis entrevistas à imprensa e muito trabalho.
Um dos ônibus, o mais animado, fica com os artistas; outro com os palestrantes; e um terceiro, com a administração e alguns jornalistas.
Ali, os assentos são de couro, há uma cozinha com micro-ondas e geladeira, ao menos quatro TVs de tela plana, internet móvel, tomadas em abundância.
As TVs vão ligadas na emissora direitista Fox News. À tarde, o noticiário mostra o caso de Fort Hood, quando um psiquiatra muçulmano do Exército matou 13 soldados. "Por que não abateram esse cara?", diz uma participante do tour.
"Agora ele fica aí querendo um julgamento justo."

ESTREANTES
A maioria dos integrantes é novata na política, como Darla Dawald, de longos cabelos tingidos de loiro, franjinha repicada, blusa de seda laranja estampada e maquiagem carregada.
Diretora do grupo conservador ResistNet.com e convidada do Tea Party Express, ela afirma que só virou ativista depois de ver resgates com fundos públicos a bancos. "Tive de fechar meu negócio por causa da economia.
Cadê o meu resgate?" Kaloogian é exceção -serviu três mandatos como legislador na Califórnia, entre 1994 e 2000- e sofre críticas de outros grupos do Tea Party: "se acham mais "puros" porque não têm ninguém experiente".
O Tea Party Express também faz campanha para alguns candidatos. Os principais são Sharron Angle, que disputa o Senado em Nevada, Christine O"Donnell, candidata em Delaware, e Joe Miller, do Alasca.
Foram gastos mais de US$ 2 milhões em propaganda para esses três -só O"Donnell consumiu US$ 1 milhão.
"Nenhum dos nossos escolhidos perdeu uma primária", diz Kaloogian. "Só em Delaware estamos atrás nas pesquisas para a eleição."
Os tours também são caros: ao menos US$ 1 milhão para duas semanas. A verba vem de doações individuais e algum merchandising (vendem camisetas, revistas etc).

DE RAIZ
No gramado em Elko, o comício atrasa. Horas antes, em um supercomício em Reno, a atração principal -a queridinha dos conservadores Sarah Palin- demorou mais do que o previsto em autógrafos e apertos de mão.
A plateia não desanima.
"É meu segundo comício do Tea Party", diz a comerciante Donna Engle, 61, que se mudou recentemente de Portland para Elko em busca de um ambiente mais republicano. "Gosto deles porque são de raiz, populares e defendem a Constituição."
Boa parte, porém, saiu para um comício pela primeira vez, como o casal Lonny e Pamela Matherne. "Viemos ver do que é que todo mundo está falando", afirma Pamela. "Apoiamos qualquer um que leve o país de volta a uma moral mais conservadora."
Já Lonny ataca o presidente Barack Obama. "Ninguém sabe direito se ele nasceu nos EUA ou não, é tudo mal explicado", diz, em alusão a teorias conspiratórias que questionam a elegibilidade do democrata para a Presidência.
"Gosto dos republicanos porque são um pessoal mais limpo", acrescenta.
Já no escuro, os ônibus são novamente carregados, e o comboio parte para o hotel onde passa a noite. Na manhã seguinte, partiriam às 9h para a próxima parada.


A jornalista ANDREA MURTA viajou de Reno a Elcko no Tea Party Express


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