São Paulo, sábado, 21 de abril de 2001

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ÁFRICA

Joseph, filho do presidente assassinado, busca renovação

No Congo, filho de Kabila dispensa a velha-guarda ao formar governo

Associated Press
Joseph Kabila durante conversações de paz em Lusaka (Zaire)


MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

Ao formar sua primeira equipe de governo, há uma semana, o presidente do Congo (ex-Zaire), Joseph Kabila, 29, livrou-se da velha-guarda do gabinete herdado de seu pai, Laurent-Désiré Kabila, assassinado em janeiro passado.
Embora continue a respeitar o equilíbrio de forças no governo, que dá a Angola e Zimbábue parte do poder, Kabila privilegiou professores universitários e especialistas na formação de sua equipe.
"O simples fato de que Joseph Kabila tenha mudado radicalmente o gabinete e tenha se afastado dos ex-assessores pessoais de seu pai mostra que ele busca sangue novo", analisou para a Folha o antropólogo ruandês José Kagabo, pesquisador da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais, em Paris.
"Isso mostra que ele não exclui novas saídas para o país e indica que ele descartou do governo pessoas que não queriam verdadeiras negociações de paz", acrescentou Kagabo, que é doutor em história da África e autor de vários livros sobre o continente.
Depois da morte de Kabila-pai, o país viu crescer o ímpeto de um processo de paz orquestrado pela ONU, após dois anos e meio de um conflito regional sangrento. Com isso, Kabila-filho sentiu a necessidade de manter o equilíbrio entre seus principais aliados.
Assim, um homem de confiança de Angola, Irung Awane, foi indicado para a Defesa, e outro, do Zimbábue, Mwenze Kongolo, recebeu a pasta da Segurança Nacional e da Ordem Pública.
Contudo o que mais agrada aos congoleses é a saída de assessores pessoais de Kabila-pai, como Gaëtan Kakudji (Ministério do Interior), Abdoulaye Yerodia (Justiça) e Pierre-Victor Mpoyo, que era assessor direto da Presidência do país. Na semana passada, o ex-chefe da polícia nacional Célestin Kifwa foi exonerado.
Afinal, como afirmou Kabila-filho ao "Le Monde", as prioridades do novo governo são "a paz e a segurança". Ele disse que pretende dar início a um diálogo entre todos os representantes da população, mas reiterou seu pedido de que Exércitos de outros Estados deixem o país.
Nos últimos três meses, para buscar apoio da comunidade internacional para o processo de paz, Joseph Kabila visitou 18 capitais na África, na Europa e na América do Norte.
Desde 1998, vários Estados estão em guerra dentro do vasto e rico território congolês. À época, Kabila-pai entrou em confronto com seus ex-aliados de Uganda e Ruanda, que o haviam ajudado a depor o ditador Mobutu Sese Seko, em 1997. Forças ugandenses e ruandesas invadiram, então, o leste do país para apoiar rebeldes que lutavam contra Kabila-pai.
Com o auxílio de Zimbábue e Angola, Kabila-pai colocou diversos obstáculos à implementação do acordo de paz assinado em Zâmbia, em 1999, exigindo que os Exércitos invasores deixassem o país antes do início do diálogo.
Kabila-filho, porém, parece ter conseguido o que muitos analistas duvidavam: dar novo alento às negociações de paz graças à promessa de diálogo e a um acordo com a ONU, que garantiu o envio de forças de paz para proteger observadores internacionais.
No que se refere a bloquear o processo de paz, parece que, de repente, os papéis se inverteram. Agora, no noroeste do país, o Movimento para a Libertação do Congo, apoiado por Uganda, recusa-se a recuar suas tropas em 15 km, como havia sido acordado, dizendo que isso colocaria em risco a vida de civis.
Na semana passada, em Kisangani, cidade estratégica situada no nordeste do território congolês, os rebeldes da Reunião para a Democracia Congolesa, que contam com o auxílio logístico e financeiro de Ruanda, impediram que 120 soldados marroquinos da ONU pousassem no aeroporto local.
A ONU tem cerca de 500 soldados encarregados de manter a paz em território congolês controlado por Kinshasa, porém ainda não conseguiu enviar nenhum a áreas que estão sob o domínio de rebeldes -boa parte do leste do país.



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