São Paulo, sexta-feira, 21 de outubro de 2011

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ANÁLISE

Fim de ditadura personalista fará futuro regime ser totalmente novo

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A TÚNIS

Em entrevista à Folha há alguns meses, em seu consultório dentário no Cairo, o maior escritor egípcio da atualidade, Alaa al Aswany, tentava entender a resistência do ditador Hosni Mubarak em aceitar que seu tempo no poder chegara ao fim.
"Ditadores tendem a criar uma realidade paralela, em que o ego e a muralha de aduladores a sua volta o isolam da realidade em que vive o resto do povo", disse.
Poucos cabem tão bem nessa teoria como Muammar Gaddafi, morto ontem em Sirte, sua cidade natal. Em 42 anos no poder, o ditador fez da Líbia o seu excêntrico universo particular.
O Estado era Gaddafi, e Gaddafi era o Estado líbio. Sua morte marca o rompimento sem volta com um regime personalista que não deixa legado nem herdeiros.
Ao contrário do Egito, onde os militares que davam sustentação à ditadura de Mubarak continuam dando as cartas, a Líbia abre um capítulo totalmente novo.
Seja qual for o caráter do novo regime (laico ou islâmico, democrático ou repressor, multipartidário ou tribal), será totalmente diferente. O legado político de Gaddafi vai para o lixo da história.
Embora a Líbia esteja em 53º no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano da ONU), 20 posições acima do Brasil, a distribuição de riqueza era desigual e obedecia a critérios de filiação tribal e lealdade ao regime.
Um exemplo é o leste do país, que sempre foi hostil a Gaddafi e não por acaso alavancou a revolução. Benghazi e outras cidades da área foram negligenciadas em favor dos bastiões do gaddafismo.
O recomeço sem as amarras do antigo regime, porém, não é sinônimo de que a transição será sem retrocessos.
A divisão entre as facções contrárias a Gaddafi e o temor de onda de perseguição aos seguidores do ditador é a maior preocupação do premiê interino, Mahmoud Jibril.
O desafio é juntar os cacos de uma sociedade montada há décadas sobre uma estrutura de poder tribal e estabelecer, até as eleições, um governo transitório reconhecido por todos, com o agravante da economia fragilizada.



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