São Paulo, sexta-feira, 21 de novembro de 2008 |
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Equador recorre para não pagar BNDES
Quito vai a tribunal internacional questionar empréstimo de US$ 243 milhões contraído para construir hidrelétrica da Odebrecht
FABIANO MAISONNAVE DE CARACAS Quito anunciou ontem ter recorrido à arbitragem internacional para não pagar o empréstimo de US$ 243 milhões contraído no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). O montante foi destinado à construção da hidrelétrica San Francisco, obra da empresa brasileira Odebrecht que apresentou problemas técnicos um ano após iniciar sua operação. O presidente equatoriano, Rafael Correa, estuda inclusive dar um calote na dívida antes mesmo de uma decisão final. "O governo quer anular o contrato de crédito alegando violações legais e constitucionais. A demanda solicita medidas cautelares para evitar os pagamentos", disse à Folha Jorge Glass, porta-voz do governo para assuntos de dívida externa. Segundo ele, a ação foi introduzida anteontem na Câmara de Comércio Internacional, com sede em Paris, e segue as regras previstas no contrato. Glass disse que as supostas irregularidades incluem taxas de juros excessivas e o fato de que, embora se trate de um empréstimo voltado ao financiamento de importação de produtos e serviços brasileiros, a Odebrecht adquiriu equipamentos na França e comprou cimento e ferro no Equador. Relatório final sobre a dívida pública equatoriana apresentado ontem cita outras irregularidades, como a assinatura de "dez contratos ampliadores", aumentando os custos da obra, a submissão do empréstimo "à legislação brasileira, isto é, a um ordenamento jurídico e a uma jurisdição estrangeira ao Estado equatoriano". Glass afirmou que cabe à arbitragem internacional julgar se as supostas irregularidades foram cometidas pela Odebrecht, o BNDES ou ambos. Ele não soube informar quanto do empréstimo falta ser pago. Questionado sobre a interrupção do pagamento antes de uma decisão da arbitragem, Glass diz que o governo está "estudando" a possibilidade. O funcionário de Correa voltou a bater na tecla de que não se trata de uma questão diplomática com o Estado brasileiro, mas de um problema com uma empresa privada. "Este é um tema puramente jurídico, nunca percebi nenhuma crise. Há motivos suficientes diante da opinião pública internacional sobre o que a Odebrecht fez no país. Que eu saiba, a Odebrecht é uma empresa 100% privada. Não sei a qual crise o senhor se refere, as relações com Brasil são extraordinárias." Por meio de sua assessoria de imprensa, o BNDES informou que o banco não vai se manifestar a respeito da ação do governo do Equador. Segundo a assessoria, trata-se de uma questão diplomática que deve ser resolvida pelo Itamaraty. Por sua vez, o Itamaraty informou que vai esperar ser notificado pela Câmara de Comércio Internacional sobre a solicitação de arbitragem. Longa negociação Os problemas entre o governo equatoriano e a Odebrecht começaram em meados do ano, quando a usina de San Francisco, a segunda maior do país, teve de ser paralisada durante quatro meses por causa de problemas na turbina e no túnel por onde passa a água. Depois de meses de negociação sem resultados, Correa anunciou em outubro a rescisão dos quatro contratos da Odebrecht no país e uma investigação de suas operações. Em reação, o governo brasileiro cancelou por tempo indeterminado a negociação de projetos de infra-estrutura com Quito, inclusive o eixo Manta-Manaus, entre a capital amazônica e o porto do Pacífico. O empréstimo do BNDES ao exterior tem como regra que o banco só financie obras se houver a exportação de bens e serviços de empresas brasileiras -no caso, a Odebrecht. Caso Correa opte pelo calote, terá um caminho a percorrer, pois o empréstimo é garantido pelo CCR (Convênio de Pagamentos e Créditos Recíproco), uma câmara de compensação de crédito e débitos da Aladi (Associação Latino Americana de Integração), que Brasil e Equador integram. Periodicamente, os bancos centrais fazem um acerto de contas. Se o devedor deixar de pagar, o BC desse país assume o débito -na prática, um seguro-calote. A decisão de Quito coincide com um momento em que a instituição brasileira busca mais recursos fora do país para atender ao aumento da demanda por seus créditos devido à escassez de outras linhas sob a crise financeira internacional. Estratégia anticrise O empréstimo do BNDES é o primeiro de uma série de revisões que Correa pretende fazer no curto prazo. O mesmo relatório que cita irregularidades no contrato com o banco brasileiro recomenda um calote de quase 40% da dívida externa do país, também por causa de supostos indícios de corrupção -um total de US$ 3,9 bilhões. Recentemente, Correa disse que pode deixar de pagar parte da dívida externa ante a queda do preço do petróleo, principal atividade econômica do país. Colaboraram as Sucursais do Rio e de Brasília Próximo Texto: Chávez usa ameaças para tentar conquistar Estado mais rico Índice |
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