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EUA admitem multipolaridade pela primeira vez
Novo documento da inteligência norte-americana prevê mundo com "vários atores" em 2025, inclusive não-estatais
Organizações terroristas como a Al Qaeda perderão força antes do previsto,
diz relatório do Conselho
de Inteligência Nacional
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
A dois meses do fim e meia
década depois de a "intelligentsia" mundial apontar a tendência, o governo de George W.
Bush admitiu pela primeira vez
em documento oficial que o
mundo caminha para se tornar
"multipolar" -ou seja, os EUA
continuarão uma potência econômica e militar sem igual, mas
perderão poder relativo.
"Um sistema global multipolar está surgindo com a ascensão de China, Índia e outros",
afirma texto divulgado ontem
pelo Conselho de Inteligência
Nacional (NIC, na sigla em inglês). "O poder relativo de atores não-estatais -empresas,
tribos, organizações religiosas
e mesmo criminosas- também
vai aumentar."
Os EUA, conclui o texto,
"permanecerão o país mais poderoso, mas serão menos dominantes." O reconhecimento está no relatório "Tendências
Globais 2025 - Um Mundo
Transformado". Com 120 páginas, é o quarto exercício não-sigiloso sobre tendências mundiais futuras que a associação
de agências de inteligência prepara para o governo norte-americano em duas décadas.
O NIC acredita que todo o
sistema internacional construído no pós-Segunda Guerra
passará por uma "revolução".
"Novas forças como Brasil,
Rússia, Índia e China não só terão uma cadeira na mesa internacional de decisões como vão
trazer novas exigências e novas
regras do jogo" para ela.
Entre outras coisas, o relatório prevê que continue a transferência de riqueza sem precedentes do Oeste para o Leste e o
crescimento econômico atual,
com a ascensão à classe consumidora de 1,5 bilhão de pessoas,
o que aumentará a ameaça de
escassez de recursos naturais
como energia, alimento e água.
Ainda diz que o potencial para conflitos crescerá. Mas afirma que a Al Qaeda está em declínio e deve perder força antes
do que calculavam os analistas
-a organização alienou parte
de sua base de apoio entre muçulmanos ao matar indiscriminadamente e não lidar diretamente com problemas como a
pobreza e o desemprego.
Debate
O conceito contemporâneo
de multipolaridade vem sendo
debatido pela esquerda do pensamento mundial há alguns
anos. Nele, há vários, e não só
um pólo de poder -os EUA.
Também não há mais lugar para a bipolaridade da Guerra
Fria, quando o mundo se dividia sob a influência dos EUA e
da então União Soviética, nem
para uma versão atual dessa,
com a China no segundo papel.
Nos últimos anos, o conceito
foi abraçado por nomes do establishment norte-americano
como Richard Haass, do prestigioso Council on Foreign Relations, e o escritor Fareed Zakaria. Agora, chegou a vez de a inteligência norte-americana colocar a chancela oficial. Inédita
no relatório anterior, a palavra
"multipolar" surge em 34 referências no atual texto.
Já o Brasil, diz o texto, "vai se
tornar a potência regional líder,
mas seus esforços de promover
a integração sul-americana serão realizados apenas parcialmente", diz o texto, que dedica
um capítulo inteiro ao país, de
tom geralmente elogioso, em
que se destacam as descobertas
recentes de petróleo.
Em um dos textos "do futuro" -o recurso é usado algumas
vezes no relatório-, o chanceler brasileiro de 2021 escreve
uma carta para o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva. Nele, diz que o Brasil está
mediando um conflito entre
EUA, China e Índia iniciado no
golfo de Omã por conta de acesso a petróleo e gás natural. E sugere o Rio como palco de negociações, citando o Carnaval.
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