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Oposição paquistanesa faz acordo para formação de governo
Com mais da metade das cadeiras do Parlamento do país, partidos de viúvo de Benazir e de ex-primeiro-ministro inimigo de Musharraf anunciam coalizão
IGOR GIELOW
ENVIADO ESPECIAL A ISLAMABAD
A oposição paquistanesa
anunciou ontem um acordo para a formação do novo governo
do país, três dias depois de derrotar de forma esmagadora o
partido que apóia o regime do
presidente Pervez Musharraf.
"Estaremos juntos na defesa
da democracia e para fortalecer
o Parlamento", afirmou Asif Ali
Zardari, o viúvo da ex-premiê
Benazir Bhutto e herdeiro de
seu PPP (Partido do Povo Paquistanês), que ficou em primeiro lugar no pleito de segunda-feira (88 das 272 cadeiras).
Ele falou em sua casa ao lado
de Nawaz Sharif, arquiinimigo
de Musharraf e que foi deposto
pelo então chefe do Exército
quando era primeiro-ministro,
em 1999. Formou um partido, a
facção Nawaz da Liga Muçulmana do Paquistão (PML-N),
que ficou em segundo lugar na
eleição (66 cadeiras).
"Nós concordamos numa
agenda comum. Vamos trabalhar para formar o governo central e nas Províncias", disse
Sharif. Político muito mais experiente que Zardari, ele dominou a entrevista coletiva para o
anúncio, fazendo piadas e respondendo pelo líder do PPP.
De quebra, Zardari não é
unanimidade em seu partido
por conta das acusações de corrupção nas gestões de sua mulher. Ele foi poupado na campanha largamente porque a propaganda do partido era baseada
na venda como mártir da política assassinada em dezembro
-"vote em Benazir, vote PPP"
era slogan corrente.
Mas há fios soltos na união. O
primeiro é prático: a oposição
não tem ainda maioria de dois
terços para passar emendas
constitucionais e processos importantes, como um pedido de
impeachment de Musharraf.
Para tanto, Zardari ontem fez
um pré-acordo com o Partido
Nacional Awani (da etnia pashtun), que tem só dez cadeiras na
Assembléia Nacional, mas que
é majoritário na Assembléia
Provincial da Fronteira Norte,
podendo atrair deputados independentes à base.
E há dúvidas sobre o que será
possível fazer de fato. Musharraf nunca governou num sistema verdadeiramente parlamentarista -os premiês que
indicou eram fantoches seus.
Ninguém sabe em que nível se
dará o embate entre o Executivo, resumido a presidente e
Forças Armadas, e um novo gabinete montado pelo Parlamento hostil.
Ontem, Musharraf recebeu
um telefonema do seu maior
aliado, o presidente americano,
George W. Bush, para congratulá-lo pelas eleições. "Parece
piada. Ele liga para elogiar o
presidente pela obrigação dele?
Ainda mais com o seu partido
morto nas urnas", disse o analista Liaquat Rehman.
Bush considerou a eleição
uma "vitória na guerra ao terror". Resta saber de quem, uma
vez que o PPP já se posicionou a
favor de parar os ataques do
Exército paquistanês contra
extremistas compatriotas nas
regiões tribais. "Na prática,
contudo, é quase impossível
desacoplar a política de Islamabad da ditada por Washington",
afirmou Asad Durrani, chefe do
serviço secreto de 1990 a 1992.
Além disso, há uma questão
sobre a qual Zardari e Sharif dizem estar preocupados, mas
cuja solução ainda é incógnita:
o Judiciário, sob intervenção
desde novembro, quando Musharraf deu um golpe, afastou e
deteve sete membros da Suprema Corte e suspendeu garantias constitucionais.
Para os governistas, os juízes
estavam abusando de suas
prerrogativas e tentando legislar ao derrubar medidas do
Executivo, e o estado de emergência já foi suspenso.
Para os advogados, a rua é a
saída. Houve protestos ontem
em todo o país e eles deram um
ultimato ao governo Musharraf: haverá marchas diárias se
os 13 juízes presos em todo o
país, incluindo o chefe da Suprema Corte, não forem soltos
até 7 de março.
Houve protestos em Islamabad, Karachi, Lahore e Peshawar. Em Islamabad, só a intervenção do oposicionista Sharif
impediu conflito de grandes
proporções entre cerca de 500
advogados e as forças de segurança que bloquearam o acesso
à casa de Ifitkhar Chaudhry, o
presidente da Suprema Corte,
preso desde novembro.
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