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Falta de consenso atrapalha pretensão brasileira na ONU
Especialistas debatem no Rio reforma da organização e destacam desafios ao objetivo de país de entrar no Conselho de Segurança
A questão importante é se Brasil poderia ter papel diferenciado no órgão, e não só credenciais do país para o ingresso, diz professora
CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO
A falta de consenso interno
sobre a importância de o Brasil
se tornar membro permanente
do Conselho de Segurança (CS)
da ONU é um empecilho à realização dessa meta, já bastante
difícil por depender de uma reforma à qual as cinco potências
atuais resistem e sobre a qual
há divergências entre os demais países.
Esse foi um dos pontos ressaltados por especialistas que
participaram ontem de seminário sobre o tema promovido
pela Fundação Alexandre de
Gusmão, ligada ao Ministério
das Relações Exteriores, e que
atraiu mais de cem pessoas ao
Palácio do Itamaraty (Rio).
"No Brasil há um defeito de
autoconfiança que temos de remediar. Todas as vezes em que
o Brasil faz concessão a algum
país do Sul isso é interpretado
como campanha para o CS. O
país não precisa disso, já tem os
votos da Assembleia Geral [da
ONU]", disse Ronaldo Sardenberg, ex-embaixador do Brasil
na ONU e hoje presidente da
Anatel (Agência Nacional de
Telecomunicações).
Sardenberg, que atuou no governo de Fernando Henrique
Cardoso como secretário de
Assuntos Estratégicos e ministro de Ciência e Tecnologia,
disse que o "momento de crise"
na ordem mundial é propício à
discussão da reforma, hoje objeto de negociações entre países e de uma análise formal lentíssima na organização.
Os objetivos das mudanças,
acrescentou, seriam tornar o
CS "mais legítimo" e provar "a
eficiência da democracia" na
Assembleia Geral, onde os votos dos 192 países-membros
têm o mesmo peso, mas as decisões são simbólicas.
A maioria dos 12 especialistas foi favorável à pretensão
brasileira ao CS, mas houve ênfase também nos empecilhos.
"É um processo maquiavélico. A reforma precisa ser aprovada por dois terços da Assembleia Geral e ratificada pelos
cinco membros permanentes
do CS", disse Antonio Paulo Cachapuz de Medeiros, consultor
jurídico do Itamaraty e professor da PUC de Brasília.
Antônio Carlos Peixoto, do
Centro Brasileiro de Estudos
Latino-Americanos, lembrou
que a configuração do CS, ao final da Segunda Guerra, não seguiu critério regional -como se
pretende fazer hoje, quando
mesmo sul-americanos resistem a apoiar o Brasil. "É fácil
constatar que nos vizinhos não
é palatável que um país de língua portuguesa tenha se tornado o mais forte nesta parte."
Oposição
A principal voz contra o
eventual ingresso foi a do professor de direito da USP Fábio
Konder Comparato. Ele defendeu mudança radical na atual
ordem baseada nas relações de
poder entre Estados e se declarou contra a ideia de membros
permanentes e o "cinismo oligárquico" representado pelo
CS. "[A entrada do Brasil] mudaria o sistema internacional?", questionou.
Ao comentar a intervenção
de Comparato, a professora
Maria Regina Soares de Lima,
do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio), disse
que o tema está longe de ser
teórico. A ONU, lembrou, é em
essência a organização jurídica
responsável pelo sistema de segurança coletiva e nela o "soberano", que decide que situações
são passíveis de intervenção armada, é o CS.
Por isso, o importante não
são apenas as credenciais do
Brasil para entrar, mas como, lá
dentro, o país poderia se diferenciar das atuais potências.
"Não acredito que o sistema
fundado pelos EUA vai se reproduzir. A incorporação [de
novos membros] vai ressignificar o uso da força."
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