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"Populismo é epidemia passageira"
Para especialista em Leste Europeu, nacionalismo na região é reação retardada a angústias nascidas com o fim do comunismo
Moralização é a arma da direita para conquistar a larga camada da população que perdeu seus parâmetros sociopolíticos, diz Smolar
CHRISTOPHE CHÂTELOT
DO "MONDE"
O polonês Aleksander Smolar é especialista em política do
Leste Europeu no Centro Nacional de Pesquisas Científicas
(CNRS), da França, e também
presidente da Fundação Stefan
Batory, de Varsóvia.
Ele acredita que o populismo
nacionalista seja uma epidemia
passageira nesse conjunto de
países em que a população mais
humilde perdeu seus parâmetros com o fim do comunismo.
Na Bulgária, pesquisas indicam que Volen Siderov, do Ataka (partido anti-semita), deve
chegar hoje em segundo lugar
nas eleições presidenciais. Na
Lituânia a extrema direita tem
30% do eleitorado. Na Polônia
e Eslováquia ela tem 20%. No
Romênia chegou a 13%.
As idéias em jogo são por vezes exóticas. Na Romênia, os
extremistas querem o retorno
às fronteiras pré-1939. Na Eslováquia, a minoria húngara se
torna o bode expiatório de todos os males. Na Hungria, o líder da direita conservadora estampa em seu automóvel um
mapa de seu país em 1920, com
território maior que o atual.
Aleksander Smolar compara
a reconstrução do capitalismo a
uma certa exaltação à amoralidade. É por isso que o moralismo e os valores nacionais baseados na religião são agora
evocados por essa nova direita .
Eis sua entrevista.
PERGUNTA - Há uma ascensão do
populismo no Leste Europeu?
ALEKSANDER SMOLAR - A resposta
é negativa, caso a preocupação
seja com um populismo radical.
Mas o nacionalismo extremado
se exprime hoje com liberdade
maior, particularmente na Polônia, onde a coalizão no governo tem o Autodefesa, o Direito
e Justiça e a Liga das Famílias
Polonesas, partidos populistas.
Os três criticam as elites e as
instituições democráticas. Procuram descaracterizar ingredientes da democracia liberal.
PERGUNTA - Esses grupos são antidemocráticos?
SMOLAR - Ainda não, por enquanto. Mas o Direito e Justiça,
majoritário, resiste a tudo o que
possa limitar o poder que obteve nas urnas. Seu ideal não é
uma democracia controlada
pelas instituições. Ele desencadeou, por exemplo, uma campanha contra magistrados que
não aderiram ao governo. Os
populistas tentam suprimir a
autonomia do Banco Central e
desqualificar moralmente os
intelectuais. É como se estivessem numa "guerra civil".
PERGUNTA - Como explicar o sucesso das propostas populistas na Polônia e na Eslováquia?
SMOLAR - Foi uma reação retardada às angústias nascidas
com o final do comunismo,
quando setores imensos da população sofreram pela perda de
seus parâmetros materiais, políticos e sociais.
Na Polônia, os irmãos
Kaczynski (presidente e premiê) prometeram resolver todos os problemas por meio da
moralização dos costumes, em
lugar de elaborarem um programa econômico e social.
PERGUNTA - Como explicar que essas propostas tenham tanto apoio?
SMOLAR - Os populistas do Leste Europeu procuram dar às
pessoas confiança e dignidade,
por meio de uma retórica nacionalista e religiosa. É o que
seduz os mais humildes que
mais sofreram com as reviravoltas econômicas e sociais.
São os mais idosos, os camponeses, os de menor escolaridade. Na Eslováquia, a população
puniu os dirigentes que permitiram crescimento econômico
desde 1989. Elegeram populistas de esquerda. Não há nisso
nenhum espanto. No Leste Europeu o processo de transformação foi uma revolução capitalista, individualista. "Enriqueçam-se", dizia o establishment. Não era algo moralizador, e isso levou à decomposição das sociedades.
PERGUNTA - Mesmo assim, a população aderiu à transição...
SMOLAR - É verdade. Mas não
foi um projeto negociado. Foi
um projeto imposto pelas elites
modernizantes. Essas elites
não viam outra alternativa para
ocidentalizar seus países. Hoje,
no entanto, as populações rejeitam uma casta política que se
dissociou delas.
PERGUNTA - Casta corrompida?
SMOLAR - A corrupção era de
certo modo inevitável em Estados construídos sobre as ruínas
das instituições comunistas enfraquecidas e ineficientes. Com
as questões econômicas minimamente resolvidas, a corrupção vira um problema central.
PERGUNTA - Os populistas não
acreditam, em razão do nacionalismo, nas vantagens do ingresso na
União Européia. Há alguma crise no
horizonte?
SMOLAR - Não. Os interesses
desses países já estão visceralmente ligados às instituições
européias. Nenhum desses partidos atua no sentido de um divórcio. Mas eles também se
aprofundam no nacionalismo,
sem que a União Européia tenha meios para gerar a crise
nos modelos políticos do Leste
Europeu.
PERGUNTA - Há o risco de propagação do populismo que represente
um risco às democracias da região?
SMOLAR - O nacionalismo é
uma bandeira da classe política
e não das populações. Além disso, em países como a Polônia ou
a Eslováquia a democracia não
está em perigo. O populismo
nacionalista é uma epidemia
passageira, uma pausa, um recuo sintomático de um certo
cansaço. Precisamos permanecer atentos, sem dramatizar.
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