|
Próximo Texto | Índice
Brasil corteja Irã por voz no Oriente Médio
Ao receber polêmico presidente iraniano amanhã, Lula põe à prova pretensão de assumir mediação em questões globais
Ahmadinejad busca romper isolamento político devido a programa nuclear; críticos veem equívoco do Brasil em querer "ser amigo de todos"
SAMY ADGHIRNI
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
As atenções do mundo diplomático se voltarão amanhã para Brasília, onde o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva receberá o polêmico colega do Irã,
Mahmoud Ahmadinejad, num
encontro para selar a aproximação das potências regionais
com interesses convergentes.
Ao estender o tapete vermelho para um dos líderes mais
odiados do mundo, Lula colocará à prova a pretensão de
transformar o Brasil em potência diplomática capaz de dialogar com polos geopolíticos antagônicos sem ser cooptado.
Oficialmente, os EUA alegaram ver com bons olhos a hipótese de o Itamaraty ajudar a
normalizar as relações do Irã
com o Ocidente.
Mas o sentimento dominante em Israel e países europeus
mescla ceticismo e resignação
com a decisão brasileira de receber um presidente conhecido
pelas posições provocadoras,
acusado de patrocinar atos terroristas no Oriente Médio e
que é expoente de um programa nuclear suspeito de ter fins
militares -o que Teerã nega.
Para os críticos, Lula comete,
ao receber Ahmadinejad, um
erro de avaliação que pode prejudicar a candidatura brasileira
a um assento permanente no
Conselho de Segurança (CS) da
ONU em vez de alavancar a ambição do Itamaraty de entrar no
rol dos protagonistas globais.
Um diplomata europeu disse
à Folha que o Brasil se engana
ao achar que é apropriado ser
"amigo de todo mundo".
Há ainda forte repúdio à visita do iraniano na frente interna. Movimentos judaicos, homossexuais, baha'is e de defesa
de direitos humanos vêm organizando protestos anti-Ahmadinejad e prometem fazer barulho. Partidos de oposição, como o PSDB, apontam os laços
Brasil-Irã como prova da politização da diplomacia brasileira pelo presidente petista.
A visita de Ahmadinejad chama ainda mais a atenção pela
conjuntura em que ocorrerá.
O Brasil, que assume em janeiro cadeira rotativa do CS,
será o primeiro país ocidental a
receber o iraniano após a sua
contestada reeleição em junho.
O conservador teve o apoio
explícito do líder supremo, Ali
Khamenei, teoricamente
alheio a disputas políticas, e
usou o aparato de segurança
nacional para calar à força uma
onda de protestos que viu indícios claros de fraude no pleito.
Enquanto boa parte do Ocidente repudiava a violência
contra manifestantes, Lula
saiu em defesa do iraniano,
comparando os protestos a
choro de torcedores de futebol.
Lula deixou claro que considera Ahmadinejad um interlocutor como qualquer outro e
que o Brasil continuará expondo com clareza suas diferenças,
principalmente sobre o questionamento do Holocausto.
O governo brasileiro também insiste em que conversas
de paz no Oriente Médio devem incluir a participação de
todos os envolvidos. O Brasil
sustenta que o Irã é um país incontornável e que isolar Teerã
acabaria beneficiando as alas
mais radicais do regime. Há
ainda interesse em aumentar o
comércio, hoje modesto.
Próximo Texto: Visita culmina três anos de flerte bilateral Índice
|