São Paulo, domingo, 22 de novembro de 2009

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Brasil corteja Irã por voz no Oriente Médio

Ao receber polêmico presidente iraniano amanhã, Lula põe à prova pretensão de assumir mediação em questões globais

Ahmadinejad busca romper isolamento político devido a programa nuclear; críticos veem equívoco do Brasil em querer "ser amigo de todos"

SAMY ADGHIRNI
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

As atenções do mundo diplomático se voltarão amanhã para Brasília, onde o presidente Luiz Inácio Lula da Silva receberá o polêmico colega do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, num encontro para selar a aproximação das potências regionais com interesses convergentes.
Ao estender o tapete vermelho para um dos líderes mais odiados do mundo, Lula colocará à prova a pretensão de transformar o Brasil em potência diplomática capaz de dialogar com polos geopolíticos antagônicos sem ser cooptado.
Oficialmente, os EUA alegaram ver com bons olhos a hipótese de o Itamaraty ajudar a normalizar as relações do Irã com o Ocidente.
Mas o sentimento dominante em Israel e países europeus mescla ceticismo e resignação com a decisão brasileira de receber um presidente conhecido pelas posições provocadoras, acusado de patrocinar atos terroristas no Oriente Médio e que é expoente de um programa nuclear suspeito de ter fins militares -o que Teerã nega.
Para os críticos, Lula comete, ao receber Ahmadinejad, um erro de avaliação que pode prejudicar a candidatura brasileira a um assento permanente no Conselho de Segurança (CS) da ONU em vez de alavancar a ambição do Itamaraty de entrar no rol dos protagonistas globais.
Um diplomata europeu disse à Folha que o Brasil se engana ao achar que é apropriado ser "amigo de todo mundo".
Há ainda forte repúdio à visita do iraniano na frente interna. Movimentos judaicos, homossexuais, baha'is e de defesa de direitos humanos vêm organizando protestos anti-Ahmadinejad e prometem fazer barulho. Partidos de oposição, como o PSDB, apontam os laços Brasil-Irã como prova da politização da diplomacia brasileira pelo presidente petista.
A visita de Ahmadinejad chama ainda mais a atenção pela conjuntura em que ocorrerá.
O Brasil, que assume em janeiro cadeira rotativa do CS, será o primeiro país ocidental a receber o iraniano após a sua contestada reeleição em junho.
O conservador teve o apoio explícito do líder supremo, Ali Khamenei, teoricamente alheio a disputas políticas, e usou o aparato de segurança nacional para calar à força uma onda de protestos que viu indícios claros de fraude no pleito.
Enquanto boa parte do Ocidente repudiava a violência contra manifestantes, Lula saiu em defesa do iraniano, comparando os protestos a choro de torcedores de futebol.
Lula deixou claro que considera Ahmadinejad um interlocutor como qualquer outro e que o Brasil continuará expondo com clareza suas diferenças, principalmente sobre o questionamento do Holocausto.
O governo brasileiro também insiste em que conversas de paz no Oriente Médio devem incluir a participação de todos os envolvidos. O Brasil sustenta que o Irã é um país incontornável e que isolar Teerã acabaria beneficiando as alas mais radicais do regime. Há ainda interesse em aumentar o comércio, hoje modesto.

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