São Paulo, terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

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Conflito diplomático também visa público interno, diz analista

THIAGO GUIMARÃES
DA REPORTAGEM LOCAL

A escalada da tensão entre Argentina e Reino Unido acerca da prospecção de petróleo nas ilhas Malvinas é funcional às necessidades de ambos os governos, que enfrentam dificuldades internas. Também se explica pelo declínio nas reservas do recurso nos dois países.
A avaliação é do ex-secretário de Energia da Argentina Daniel Montamat (1999 a 2000), crítico da política energética dos anos Kirchner -governos Néstor (2003-2007) e Cristina.
Para Montamat, o decreto de Cristina do último dia 16, que impôs controles à navegação com destino às ilhas ou proveniente delas, é puramente político, já que, na prática, não inviabiliza a exploração na região. "O material para esse trabalho chega por águas e portos não argentinos, o que encarece mas não impede a prospecção", diz.
Com popularidade em baixa, arrastada por problemas como inflação e conflitos setoriais, Cristina, afirma Montamat, procura agitar uma bandeira -a da soberania sobre as ilhas- que é consenso no país.
Para o analista, o discurso nacionalista também cai bem ao primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, que ainda passa faturas pela crise econômica e vê a oposição conservadora a ponto de vencer as eleições deste ano, após 12 anos de poder do Partido Trabalhista.
Embora não haja confirmação de jazidas de petróleo e gás nas águas das Malvinas, só a promessa de novas fontes já alimenta a disputa, dado que as reservas da Argentina e do Reino Unido estão em declínio -a produção britânica de petróleo e gás cai 5% ao ano, e as reservas argentinas estão 34% abaixo do patamar dos anos 90.
Informes sobre o potencial petrolífero das ilhas falam de 3 bilhões a 60 bilhões de barris. As reservas comprovadas do Reino Unido e da Argentina são de, respectivamente, 3,4 bilhões e 2,6 bilhões de barris.
"Se as reservas chegam ao mínimo de 3 bilhões de barris, já é algo apetecível para todos", diz Montamat. Os cálculos sobre as reservas do pré-sal brasileiro, por exemplo, vão de 15 bilhões a 80 bilhões de barris.
Empresas britânicas prospectaram petróleo na região em 1998, mas a exploração foi vista como não lucrativa. Agora, novos estudos e o barril a US$ 70 levaram a pequena Desire Petroleum a alugar uma plataforma, que depois será usada por mais três empresas.
A eventual confirmação de reservas na região terá consequências geopolíticas, diz o analista, pois o afluxo de royalties para as ilhas facilitaria a mudança de seu status colonial para "Estado livre associado", confirmando a política britânica de autossuficiência para as ilhas e complicando a reivindicação argentina por soberania.


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