São Paulo, terça-feira, 23 de março de 2004

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ANÁLISE PALESTINA

Sharon age contra o Hamas antes de se retirar de Gaza

OTÁVIO DIAS
DA REDAÇÃO

Ao matar o xeque Ahmed Yassin, fundador do grupo terrorista Hamas e importante líder religioso e político da faixa de Gaza, o premiê Ariel Sharon quer mostrar que está agindo contra o terrorismo enquanto, ao mesmo tempo, prepara a retirada unilateral do Exército israelense do território palestino ocupado por Israel.
"Israel teme que, se o Hamas passar por vencedor e, eventualmente, assumir o controle sobre Gaza, crescerá a pressão para que o Exército também abandone a Cisjordânia", disse o palestino Said Zeedani, 54, diretor-geral da Comissão Independente Palestina para os Direitos dos Cidadãos.
Professor licenciado de filosofia da Universidade Al Quds, em Jerusalém oriental (árabe), Zeedani prevê mais violência e um enfraquecimento da Autoridade Nacional Palestina frente ao Hamas.
Leia entrevista à Folha, por telefone, de Ramallah (Cisjordânia).
 

Folha - Há uma relação direta entre o atentado do Hamas no porto de Ashdod no último dia 14, no qual morreram dez israelenses, e a decisão de Israel de matar o xeque Yassin agora?
Said Zeedani -
Temia-se em Israel a ocorrência de um ato terrorista de grandes proporções vindo da faixa de Gaza. Imediatamente após o atentado em Ashdod, o governo israelense resolveu fazer uma série de ações na faixa de Gaza: decidiu atacar o Hamas em todos os lugares e em todos os níveis. A morte do xeque Yassin foi o clímax. Essa ação está relacionada com a decisão do premiê Ariel Sharon de retirar o Exército israelense de Gaza.

Folha - Por quê?
Zeedani -
Sharon quer dar a impressão de que está saindo de Gaza porque é do interesse de Israel e não de que estaria fugindo diante da pressão dos militantes palestinos, como uma força ocupante derrotada. Há muito debate, em Israel, sobre o precedente da retirada israelense do sul do Líbano, pois a maneira como foi feita deu ao Hizbollah a imagem de ter triunfado. Os israelenses não querem repetir isso. Mas, mais importante, Israel teme que, se o Hamas passar por vencedor e, eventualmente, assumir o controle sobre Gaza, crescerá a pressão para que o Exército israelense também abandone a Cisjordânia.

Folha - Quais serão os resultados dessa ação?
Zeedani -
As emoções estão muito intensas, os militantes palestinos já ameaçaram se vingar e terão de fazer algo, pois todos esperam uma resposta. O que farão, contra quem e quando, é difícil saber. Isso levará a uma outra resposta por parte de Israel. Ou seja, o ciclo da violência vai continuar.

Folha - Que conseqüências a morte de Yassin terá para a Autoridade Nacional Palestina?
Zeedani -
A ANP foi muito destruída e está quase sem poder de fazer alguma coisa, principalmente na faixa de Gaza. A conseqüência direta será o fortalecimento do Hamas, pois o xeque Yassin era muito popular. Em tempos de violência, são os mais radicais que ganham apoio, porque eles apelam para as emoções e não para a razão, para os sentimentos de vingança em vez de compromissos políticos. Pelo menos no curto prazo, a ANP sairá enfraquecida.


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