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ESPANHA
Para Jorge Reverte, que estuda o conflito basco há três décadas, ETA ainda precisa dar muitas provas de que mudou de fato
É cedo para comemorar, afirma escritor
RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL
O escritor e cineasta madrileno
Jorge Martínez Reverte, 57, acha
que ainda falta muito para saber se
o cessar-fogo anunciado ontem
pelo ETA é definitivo. E que caberá ao grupo, nos próximos meses,
demonstrar que é para valer.
Reverte é um dos maiores conhecedores dos bastidores do grupo terrorista. Há 30 anos ele estuda o conflito basco. Primeiro, como jornalista da Televisão Espanhola e do jornal madrileno "El
País". Depois, escreveu ensaios e
dois romances sobre o ETA, que se
tornaram best-sellers, e dirigiu documentários sobre os terroristas
-o mais conhecido, "Yoyes",
conta a história da líder que abandonou a organização e foi assassinada pelos antigos companheiros.
Leia os principais trechos da entrevista dele à Folha.
Folha - Como o ETA pode garantir
que quer depor as armas?
Jorge Reverte - Antes, tem de deixar de extorquir os empresários
bascos com a cobrança do "imposto revolucionário". O que vai
ser difícil, porque essa é a maior
fonte de renda do grupo. Depois
tem que acabar de vez a violência
urbana que os simpatizantes do
grupo promovem no País Basco,
um vandalismo sistematizado. O
ETA se sustenta pelo medo, nas
duas situações. Não deve haver
trégua, nem anistia, aos terroristas
presos. Se a polícia encontrar algum terrorista amanhã, tem que
prender. É cedo para comemorar.
Folha - Nos últimos dois anos, não
houve nenhum atentado do ETA
com mortos. O grupo mudou depois
dos ataques em Madri, pelos quais
foi inicialmente culpado?
Reverte - Com certeza. O ETA se
cuidou mais. Há uma piada macabra aqui na Espanha que diz que o
ETA viu que depois das bombas
nos trens de Atocha, o terrorismo
não é mais popular. Por outro lado, o ETA viu que o povo espanhol
não ficou com medo depois dos
atentados. O terrorismo não funcionou. A democracia saiu fortalecida.
Folha - A direita espanhola do
Partido Popular, do ex-premiê José
María Aznar, tem acusado o governo Zapatero de ser "brando" com os
terroristas do ETA.
Reverte - Se o cessar-fogo for para valer, será uma grande derrota
para o Partido Popular. Os pactos
antiterroristas sempre foram políticas de Estado, que uniram todos
os partidos políticos. Só que quando a direita perdeu a eleição em
2004, decidiu partir para uma
oposição brutal. E acusar o governo de ser brando, de negociar com
o ETA. Mas todos os governos democráticos tiveram algum tipo de
conversa com o ETA.
Folha - Como?
Reverte - Sempre de forma clandestina e fora da Espanha. Até o
governo do Partido Popular, na
época de Aznar, manteve conversas com o ETA na Suíça. Os socialistas também fizeram isso algumas vezes. Para tomar o pulso, ver
como anda o pensamento de uma
organização tão subterrânea.
Também tratam de assuntos mais
práticos, como o remanejamento
de prisioneiros do ETA.
Folha - Em seus inícios, quando
era a cara mais violenta da oposição
à ditadura franquista, o ETA tinha
muitos simpatizantes. Hoje, qual é
a simpatia ou a sustentação que o
ETA ainda tem?
Reverte - Hoje a popularidade do
ETA é absolutamente marginal. A
Espanha é uma democracia consolidada e os espanhóis são unidos
contra o terrorismo. Mesmo no
País Basco, os partidos que têm
apoio do ETA não têm mais de
15% dos votos. Muitos deles são
apenas separatistas, mas reprovam a violência.
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