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Cobertura estatal chinesa reforça ódio do "nós contra eles"
TV mostra tibetanos só como agressores e a maioria han como vítima; na internet, chineses seguem tendência oficial
Províncias com minorias são metade do território do país; Xinjiang, que abriga uigures muçulmanos, é rica em reservas de gás e carvão
DE PEQUIM
A cobertura que a tevê estatal
chinesa tem feito dos protestos
do Tibete reforça a imagem do
"nós" contra "eles". São repetidas as imagens de lojas e mercados pertencentes a cidadãos
han destruídos em Lhasa, a capital do Tibete. O choro de cidadãos chineses feridos merece
destaque nos principais telejornais do país, perguntando-se
"por que nós?".
Mas não há uma única cena
que mostre tibetanos sofrendo
repressão policial, nem nada
sobre as mortes de cidadãos tibetanos, que o governo não reconhece (tibetanos no exílio falam em até cem mortes).
Apenas na quinta-feira, a
agência estatal Xinhua informou que a polícia também atirou em manifestantes, na Província de Sichuan, mas não deu
detalhes. Há pelo menos 120 tibetanos presos.
Na blogosfera chinesa, a divisão continua. São inúmeros os
textos que acusam os tibetanos
de "ingratos" e "preguiçosos",
afinal a China tem investido
muito no Tibete (e a Província
era miserável e feudal até 1951,
quando invadida pela China).
Segunda classe
"A tensão vai muito além da
economia, há ressentimento
das minorias que se julgam cidadãos de segunda classe, que
têm menos direitos que os chineses han", disse à Folha Robbie Barnett, professor da Universidade Columbia (veja entrevista à pág. A16).
A Folha conversou com estudantes tibetanos que estão
em Pequim. Fazem parte da
elite provincial, pois seus pais
puderam mandá-los fazer a
universidade na capital.
Com medo de fazer qualquer
comentário político, pediram
anonimato. Mas revelaram que
temem que, quando terminarem a universidade, terão mais
dificuldades para conseguir um
bom emprego por serem tibetanos. Dizem que há muito preconceito e que os chineses han
sempre têm a prioridade.
E ainda dizem que, para os tibetanos, não há a válvula de escape do êxodo rural que existe
em outras Províncias. Sem falar chinês, os camponeses tibetanos não conseguem emprego
em outras regiões.
O espaço tibetano também
foi desmembrado. Áreas de população tibetana hoje estão sob
jurisdição de províncias como
Qinghai, Sichuan e Gansu, onde protestos aconteceram após
a repressão em Lhasa. Metade
da população tibetana da China vive fora do Tibete.
Inundação étnica
Alguns especialistas chamam
de "inundação étnica" o que a
China tem feito nas últimas décadas, ao estimular que milhares de chineses han habitem as
Províncias com algum risco separatista.
Em 1955, 90% da população
da província de Xinjiang, no extremo ocidental do país, era
formada por não-chineses,
principalmente os muçulmanos sunitas hui e os xiitas uigures. Hoje, quase 60% da população é de origem han.
Na Mongólia Interior, a enchente étnica é maior: dos 23
milhões de habitantes, apenas
4 milhões são mongóis.
No Tibete, os assentamentos
foram mais sutis por causa das
condições geográficas da região, mas em Lhasa os principais negócios já estão nas mãos
de chineses han.
Tibete e Xinjiang detêm mais
de 22% do território chinês.
Se a situação geográfica do
Tibete, que faz fronteira com a
Índia, é estratégica para a China, Xinjiang, a Província onde a
maioria dos muçulmanos chineses vive, é rica em reservas de
carvão e gás.
(RJL)
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