São Paulo, domingo, 23 de abril de 2000


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SOCIEDADE
Estatísticas e estilo de vida dos descendentes dos nativos se parecem com os do Terceiro Mundo
Aborígine vive pior que a média do país


KATHY MARKS
do "The Independent",

em Sydney

Eles são cidadãos do mesmo país, mas poderiam estar vivendo em planetas diferentes, tão diversas são suas condições e expectativas de vida.
A maioria dos australianos -87% dos homens e 93% das mulheres- pode prever que irá viver mais de 50 anos. A não ser, é claro, que tenham tido o azar de nascer aborígines.
Menos da metade dos homens aborígines (47%) e apenas 59% das mulheres descendentes dos nativos da região antes da colonização européia ultrapassam os 50 anos de vida.
Uma análise dos índices de mortalidade dos anos 1995-97, divulgada este mês pelo Birô Australiano de Estatísticas, oferece evidências da existência de duas Austrálias: a comunidade majoritária de origem ocidental ou asiática, cujos padrões de saúde são típicos do Primeiro Mundo, e a comunidade minoritária "terceiro-mundista", que se caracteriza pela saúde deficiente e péssimas condições de vida.
As desvantagens materiais começam no berço.
Os bebês aborígines têm três vezes mais chances de morrer antes de completar 1 ano de vida; em quase todas as outras faixas etárias, os índices de mortalidade dos aborígines são maiores do que os dos outros australianos -e também do que os de outros povos indígenas, como os maoris da vizinha Nova Zelândia ou os índios norte-americanos.
De acordo com a autora do estudo, Joan Cunningham, as principais causas de morte entre os aborígines adultos são doenças circulatórias e respiratórias, diabetes, câncer e contusões ou ferimentos.
Cunningham constatou que a maioria das mortes precoces pode ser atribuída à situação de desvantagem socioeconômica em que vivem os aborígines. Para a pesquisadora, os povos indígenas sofrem desvantagens não apenas em vida, mas também na morte.
Entre os aborígines e os habitantes nativos das ilhas do estreito de Torres, que compõem 2% da população australiana total (19 milhões de pessoas), a maior diferença de expectativa de vida ocorre na faixa dos 35 aos 54 anos, quando a incidência de mortes é de seis a sete vezes maior entre os indígenas australianos do que nos outros setores da população do país.
Para Cunningham, os adultos aborígines morrem de doenças crônicas até 30 anos antes do que os outros australianos. E muitos morrem de doenças que podem ser prevenidas.
O estudo constatou que os aborígines também correm risco maior de ter uma morte violenta. Nas comunidades indígenas, os índices de morte por homicídio, suicídio e ferimentos também são substancialmente superiores aos do resto da Austrália.

Suicídios
O índice de suicídio entre os aborígines é 70% mais alto do que no resto do país, no caso dos homens, e 40% entre as mulheres. Mais de quatro vezes mais aborígines do que outros australianos morrem em acidentes de carros, e entre sete e oito vezes mais aborígines são assassinados.
A Associação Médica Australiana pediu ao governo que destine mais verbas à saúde dos aborígines.
O presidente da associação, David Brand, afirmou que, no prazo de poucas décadas, países como Canadá, Estados Unidos e Nova Zelândia conseguiram promover grandes melhoras na saúde de suas populações indígenas, ao contrário do que ocorre na Austrália.
Um relatório divulgado em 1997 pela comissão de Direitos Humanos e Igualdade de Oportunidades constatou que, para milhares de aborígines, a vida é feita de decomposição familiar, dependência de drogas e álcool, violência e angústia mental, tudo isso exacerbado pela política de assimilação que lhes foi imposta entre os anos 1920 e 1960, sob a qual milhares de aborígines -a chamada "geração perdida"- foram afastados de suas famílias.


Tradução de Clara Allain


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