São Paulo, domingo, 23 de maio de 2010

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Rusga com Caracas afeta colombianos refugiados na divisa

Drama de perseguidos por paramilitares e pelas Farc é agravado pela tensão bilateral e pela crise econômica

Situação na fronteira de mais de 2.000 km é desafio diplomático e militar ao sucessor do presidente Álvaro Uribe

FLÁVIA MARREIRO
ENVIADA A SAN CRISTÓBAL (VENEZUELA) E CÚCUTA (COLÔMBIA)

A colombiana Gisele, 22, mal sai do seu casebre, numa favela recém-criada na periferia de San Cristóbal, Venezuela, a cerca de 70 km da fronteira com seu país.
"Há infiltrados deles por aqui. Estou tentando ir para mais longe", conta.
Perseguida por paramilitares, após o assassinato de seu marido -que, segundo ela, atuou no grupo paramilitar Águilas Negras-, ela mudou-se cinco vezes dentro da Colômbia desde 2006. Ganhou um colete à prova de balas e um rádio do governo.
"Como um rádio pode me proteger?", desespera-se a mãe de Gisele, que fugiu com ela e seus três filhos.
Cansada do acosso e da habilidade de seus perseguidores em encontrá-la, ela pediu refúgio na Venezuela há um ano. Mas nem assim se sente segura -nem diz seu nome verdadeiro.
Na favela em que mora se acumulam histórias sórdidas de colombianos perseguidos por paramilitares ou pelas Farc (Forças Armadas Revolucionárias na Colômbia).
Fazem parte dos 200 mil que chegaram na última década ao país.
Como se não bastasse o drama crônico da região, a zona foi sacudida nos últimos anos por mais duas crises: o aumento da presença armada ilegal no lado venezuelano e o rastro de depressão econômica e tensão deixado pela arrastada e inflamada disputa entre o colombiano Álvaro Uribe e o venezuelano Hugo Chávez.
O panorama faz da divisa de mais de 2.000 km um ponto nevrálgico do conflito colombiano de quatro décadas e um desafio militar e diplomático para o sucessor de Uribe, que começa a ser eleito no próximo domingo.
Caberá ao próximo presidente colombiano tentar contornar o ponto mais débil da estratégia de segurança do atual governo: o encurralamento da guerrilha contra as fronteiras, incluindo a do país com o Brasil, sem que os militares tenham uma linha sólida de defesa na divisa.
Tudo isso num ambiente de ambiguidades -no caso da Venezuela, acusada por Bogotá de permissividade às Farc- e de desconfiança -no caso do Equador, rompido com a Colômbia após ataque a acampamento da guerrilha no país em 2008- que dificulta a cooperação militar e até civil na área.
Enrique Vallas, diretor da Acnur, o comissariado para refugiados da ONU, em San Cristóbal, afirma que as rusgas diplomáticas já trazem sequelas aos refugiados.
"O discurso de Bogotá recomendando que colombianos não venham à Venezuela chega a ser perverso. Os que estão fugindo pensam: devo ou não devo ir?"


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