UOL


São Paulo, quarta-feira, 23 de julho de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

REINO UNIDO

Premiê diz que identificação de cientista como fonte da BBC não partiu dele; cresce pressão sobre ministro da Defesa

Blair nega ter autorizado vazamento de fonte

MARIA LUIZA ABBOTT
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DE LONDRES

O premiê britânico, Tony Blair, negou ontem ter autorizado a identificação do cientista David Kelly como a fonte da reportagem da rede BBC que acusou o governo de ter "tornado mais sexy" o dossiê contra o Iraque. Kelly foi encontrado morto -ele teria se suicidado- na sexta-feira, após intensa pressão da mídia e de autoridades, a partir da veiculação de seu nome como fonte da BBC.
"Não autorizei o vazamento do nome de David Kelly", disse Blair enquanto voava de Xangai a Hong Kong. A negativa aumenta a pressão sobre o ministro da Defesa, Geoff Hoon, apontado ontem pelo "Financial Times" como responsável pela autorização à assessoria de imprensa do ministério para confirmar Kelly como a fonte. No sábado, Hoon negara ter dito quem era a fonte, mas não falou nada sobre a autorização.
Ontem, o ministério disse que "as especulações" sobre o vazamento são "enganosas" e indicou que Hoon deverá testemunhar no inquérito se for chamado pelo juiz encarregado, lorde Brian Hutton.
No avião, pressionado para responder por que o governo tinha confirmado a jornalistas que o cientista era a fonte da BBC, Blair disse que essa era "uma questão completamente diferente" e que o inquérito que vai investigar o caso poderia verificar isso.
A guerra, o fato de que não foram encontradas armas de destruição em massa no Iraque e a morte do cientista estão abalando a credibilidade e reduzindo a popularidade de Blair. Ele não escapou de questões sobre o caso nem mesmo de estudantes chineses, com quem se encontrou ontem. Foi salvo quando um deles pediu que cantasse uma música dos Beatles. Sua mulher, Cherie, o socorreu, cantando "When I'm 64".
A pressão sobre a BBC também está elevada. Segundo o jornal "The Times", há um racha no conselho de administração da empresa pública, encarregado, entre outras coisas, de avaliar o padrão de jornalismo da rede. Segundo o "Times", o conselho só aceitou respaldar a reportagem de Andrew Gilligan no programa Today, da rádio 4 da BBC -e que provocou a briga com o governo-, por pensar que a informação, embora de fonte única, vinha de um alto funcionário do serviço de inteligência. Kelly não era.
O jornal diz que foi convocada uma reunião de emergência do conselho da BBC para tratar do caso, o que foi negado pelo presidente da empresa. Já o "Financial Times" diz que, na reunião dos diretores, há duas semanas, "não foi questionada a veracidade" da reportagem. Segundo o "FT", eles só examinaram se os princípios que orientam o jornalismo da BBC tinham sido seguidos.
A BBC apresentou parte de sua defesa, divulgando a informação de que Kelly foi a fonte de dois outros repórteres da empresa que fizeram reportagens semelhantes à de Gilligan. Segundo a empresa, o cientista conversou com Gavin Hewitt, que divulgou suas informações no jornal da noite da TV BBC1, no dia 29, e com Susan Watts, que fez reportagem semelhante no jornal da noite da TV BBC2, três dias mais tarde.
Mas há diferenças na ênfase que cada um dos jornalistas deu e até mesmo nas informações obtidas de uma mesma pessoa. Gilligan é o mais enfático dos três e o "FT", em seu editorial de ontem, diz que as diferenças são "preocupantes".
Com os procedimentos da empresa em questionamento por outros integrantes da mídia britânica e até mesmo por programas da própria BBC, aumentam as pressões para mudanças no sistema de regulamentação e fiscalização da rede pública de rádio e TV.
A BBC é a única controlada e fiscalizada pelos seus diretores, indicados pelo governo. As demais são controladas pelo órgão regulador independente, o Ofcom, encarregado de fiscalizar até mesmo a qualidade do conteúdo. Já se especula que a BBC possa ser submetida ao controle do Ofcom.


Texto Anterior: Índia: Ataque a militares na Caxemira deixa 11 mortos
Próximo Texto: Acidente: Fogo atinge a Torre Eiffel, em Paris
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.