São Paulo, sábado, 23 de agosto de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Congresso derruba "Lei da Selva" no Peru

Após protestos de indígenas, legisladores vetaram decretos de García que facilitavam venda de terras

FLÁVIA MARREIRO
DA REDAÇÃO

O Congresso do Peru derrubou ontem dois decretos do presidente Alan García contra os quais comunidades indígenas e camponesas promoveram 11 dias de intensos protestos, com bloqueios de estradas e a ocupação de uma hidrelétrica.
Chamados de "Lei da Selva", os decretos derrubados, por 66 votos a 29, modificavam lei de 1995 sobre investimento em terras de posse comunitária, facilitando a decisão de permitir sua exploração ou venda. As regiões, parcialmente já exploradas ou em prospecção, são ricas em gás e minérios.
Com apenas 22% de aprovação nas pesquisas, García viu derreter sua frágil maioria no Congresso. Até siglas conservadoras em geral alinhadas mudaram de lado para evitar o "custo social" da lei.
"É um novo amanhecer para todos os povos do país e para os peruanos que querem se desenvolver em liberdade", comemorou, das galerias do Congresso, Alberto Pizango, o principal líder dos protestos. Na cidade amazônica de Bagua, manifestantes cantaram o hino nacional em suas línguas.
A "Lei da Selva" provocou a mobilização de lideranças indígenas, principalmente da Amazônia peruana, que argumentam não terem sido ouvidas sobre o tema -como regem leis internacionais adotadas pelo Peru- e que as regras ameaçam os 65 povos da região.
Pelos decretos, os povos amazônicos poderiam decidir a exploração ou a venda de suas terras em votação por maioria simples dos integrantes das comunidades. A lei original, do governo Fujimori (1990-2000), previa maioria de dois terços.
Diante dos protestos, o governo decretou estado de emergência e enviou soldados para proteger gasodutos. As manifestações foram suspensas na terça, quando o Legislativo decidiu tratar o tema.

Poderes e diálogo
Alan García baixou as normas em maio, apoiado em poderes especiais dados pelo Congresso para que ajustasse leis do país ao TLC (Tratado de Livre Comércio) com os EUA.
Anteontem, foi à TV defender-se. Acusou a oposição de "paternalismo" e disse que os indígenas seriam destinados "a mais um século de miséria".
Ontem, voltou a dizer que ele, que em seu primeiro governo, nos anos 80, atacou investidores, sabe que a estratégia não ajuda de fato os pobres.
Para o analista político Santiago Pedraglio, do jornal "Perú21", o governo foi "arrogante" ao não debater o tema. "García fala do decreto como se fosse o direito de vender um apartamento. Se venderem a terra, podem sumir como povo. Nunca vi protestos como estes nas regiões de selva. São mais comuns na parte andina."
Segundo Pedraglio, não há exigência da mudança no TLC. "Até onde sei, não há nem pressão nos bastidores." Mas, diante dos governos esquerdistas vizinhos, a meta de García é atrair investimentos para mineração e gás, ainda mais quando se fala de uma possível crise energética, num governo já acossado pela inflação.
Não estava claro ontem se o presidente García poderia vetar a derrogação e devolver os decretos ao Congresso, opção mencionada por governistas. A Defensoria do Povo também os questionou e os remeteu ao Tribunal Constitucional, que ainda não avaliou o tema.

Com agências internacionais



Texto Anterior: América Latina: Assessor de Obama se reúne com embaixadores da região
Próximo Texto: Tragédia na Espanha: Turbina não causou acidente da Spanair, indica vídeo
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.