São Paulo, domingo, 23 de novembro de 1997.




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CÚPULA SOCIAL
Empresas criam cargos de tempo parcial, com salários um pouco menores, o que garante competitividade
Emprego meio período avança na Europa

CLÓVIS ROSSI
enviado especial a Luxemburgo

A redução da jornada de traba lho, o mais recente enfoque para combater o desemprego, entrou apenas de passagem na pauta da Cúpula Social que a UE (União Eu ropéia) encerrou anteontem em Luxemburgo.
Nem precisava. Aos poucos, co meça a se disseminar, a ponto de o chanceler luxemburguês, Jacques Poos, prever: "A idéia das 35 ho ras semanais se imporá a todos no início do século 21."
Talvez seja um exagero, mas o fa to é que o trabalho em tempo par cial, a versão mais exacerbada da redução da jornada, avança noto riamente na Europa. Nos 15 países da UE, já são 16% os que traba lham meio período.
O mais recente exemplo é o da Siemens, a maior empregadora da Alemanha, com seus 197 mil fun cionários.
Acordo com o sindicato permi tiu que os empregados de 55 anos ou mais reduzam à metade a jor nada de trabalho, com corte sala rial de apenas 18%.
Cerca de 8.400 trabalhadores da Siemens trabalham meio período. Seu principal executivo, Heinrich von Pierer, considera o esquema não um custo adicional, mas um meio de melhorar a produtividade.
Detalhe: a previsão é de que o lu cro da empresa crescerá este ano, em relação ao ano passado, mes mo com a turbulência nos merca dos financeiros.
Na Alemanha, aliás, a Volkswa gen havia sido a pioneira no esque ma de reduzir a jornada (para 28,8 horas semanais), com um corte menor dos salários. Salvou 30 mil empregos e voltou a dar lucro.

Mais lazer
Na Holanda, a Philips adotou igualmente horários flexíveis, também com ajuste nos salários, para que os custos de produção não aumentassem.
Já o trabalho em tempo parcial tornou-se verdadeira mania: 38,1% dos holandeses trabalham "part-time", de longe o índice mais alto na UE.
Esse é um dos motivos que com põem o chamado "milagre holan dês", expressão pouco imaginati va para designar um país que redu ziu o desemprego (para 6,1%, con tra a média européia de quase 11%), reduziu também o déficit or çamentário e vê a sua economia crescer.
Não é, em todo o caso, um mila gre sem custos: os salários reais (descontada a inflação) médios são hoje inferiores aos de 1970.
De todo modo, o trabalho "part-time" é menos polêmico do que a redução da jornada para 35 horas semanais, como pretendem impor, por lei, os governos da Itá lia e da França para o início do pró ximo século.
Na prática, representa combinar a fome com a vontade de comer: em países como a Holanda, em que os problemas básicos estão re solvidos e a qualidade de vida é al tíssima.
Muita gente pode, então, dar-se ao luxo de ganhar menos, desde que trabalhe menos e sobre mais tempo para a família, o lazer, as viagens etc.
Já a redução da jornada, em tese, encarece os custos para as empre sas, a menos, claro, que os salários sejam reduzidos na mesma pro porção, o que os sindicatos não aceitam.
"Reduzir as horas de trabalho pode ser útil apenas em casos mui to específicos e onde houver acor do entre empresas e sindicatos, sempre levando em conta as con sequências sobre a competitivida de da economia", diz, por exem plo, Padraig Flynn, comissário (espécie de ministro) europeu pa ra Assuntos Sociais.
O patronato não concorda nem com essa cautelosa avaliação. Pe ter Stihl, presidente das Câmaras de Comércio e Indústria da Ale manha, prega, na contracorrente, a volta à semana de 40 horas, sem aumento de salários, "para redu zir o custo da mão-de-obra e esti mular as empresas a contratar".
A polêmica mostra duas coisas: o fato de que trabalhar menos ga nhou espaço importante na agen da européia. Mas não basta para permitir a previsão de que as 35 horas logo se generalizarão, feita pelo luxemburguês Jacques Poos.



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