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JUSTIÇA
Supremo legitima superpoderes de Bush
Em tempos de guerra, a mais alta corte dos EUA apoiou a expansão da autoridade presidencial
MARCIO AITH
DE WASHINGTON
Apesar dos protestos de entidades de direitos humanos e de críticas isoladas do Congresso, precedentes históricos da Suprema
Corte dos EUA legitimam a concentração de poderes da Casa
Branca e a supressão de liberdades civis promovidas pelo presidente George W. Bush desde os
atentados de 11 de setembro.
Sob o argumento de que os EUA
foram vítimas de atos de guerra,
não de crimes praticados por extremistas autônomos, Bush conseguiu expandir o poder do Executivo a níveis equiparáveis, segundo o jornal "Washington
Post", aos do presidente Franklin
D. Roosevelt durante a Segunda
Guerra Mundial.
Até o momento, organizações
não-governamentais, advogados
de pessoas detidas sem acusação
clara e o Congresso não demostraram interesse em mover uma
ofensiva judicial ampla contra os
poderes de Bush.
Presume-se que os descontentes estejam sendo constrangidos
pelo índice recorde de aprovação
de Bush, que chegou a 90%, e pela
disposição clara da população de
abrir mão de liberdades individuais em nome da segurança.
"Mas isso não explica tudo. A
verdadeira razão é que não há nada que eles possam fazer", disse à
Folha David Cole, professor de
Direito da Universidade de Georgetown. "Como em quase todos
os conflitos dos quais os EUA participaram, as portas do Judiciário
provavelmente lhes serão fechadas enquanto o clima de guerra
perdurar e a sociedade continuar
priorizando a segurança."
Se considerarmos que o combate ao terrorismo é uma guerra
convencional, Bush seria só um
dos vários presidentes dos EUA a
concentrar poderes e restringir liberdades em tempos de conflito.
O estudo mais sério sobre a relação entre as guerras e o fortalecimento do Poder Executivo americano foi escrito pelo atual presidente da Suprema Corte dos
EUA, William Rehnquist.
O estudo mostra que a cúpula
do Judiciário americano legitimou todos os poderes excepcionais do Executivo durante guerras. O autor vê essa jurisprudência com simpatia.
Em 1919, durante a Primeira
Guerra Mundial, a Suprema Corte confirmou a condenação de
Charles T. Schenck, líder socialista preso por escrever e distribuir
panfletos urgindo jovens a resistir
ao alistamento militar.
Schenck fora preso com base
nas várias ordens (conhecidas como "Espionage and Sedition
Acts", ou "Leis contra Espionagem e Perturbação da Ordem Pública") do presidente Woodrow
Wilson que determinaram a detenção e o julgamento sumário de
pessoas com convicções "antiamericanas".
Em seu voto a favor da condenação de Schenck, o juiz da Suprema Corte Oliver Wendell Holmes escreveu: "O discurso às vezes representa um perigo imediato e claro de provocar o mal... O
Congresso tem o direito de evitar
que isso ocorra".
Hoje, segundo professores de
direito, essa decisão serve como
principal precedente jurídico da
supressão de liberdades civis e de
acúmulo de poder em guerras.
A segunda decisão histórica da
corte veio durante a Segunda
Guerra Mundial (1939-1945), período em que o presidente Franklin D. Roosevelt determinou o
julgamento militar de civis que seriam agentes sabotadores do governo alemão.
Em 1942, a Suprema Corte analisou recurso movido por um desses supostos agentes que, alegando ser filho de cidadãos americanos naturalizados, pedia para ser
julgado por um tribunal civil.
De forma unânime, a corte rejeitou o recurso sob a alegação de
que até cidadãos norte-americanos perdem a proteção do sistema
legal quando se tornam agentes
do inimigo. Seis homens foram
executados por cortes militares.
Dois receberam penas de prisão
depois de colaborarem com os
militares.
Em 1998, numa das poucas entrevistas concedidas por Rehnquist durante o lançamento de
seu livro, ele declarou que a tendência da Suprema Corte dos
EUA é a de legitimar ou se abster
de julgar o acúmulo de poderes da
Casa Branca enquanto guerras estiverem em andamento.
Ele lembrou que, em 1946, só
depois da vitória dos aliados, a
Suprema Corte encontrou um espaço na agenda para anular a imposição de uma lei marcial instituída no Estado do Havaí (onde
vários descendentes de japoneses
viviam) cinco anos antes, logo depois dos ataques a Pearl Harbor
(em 1941).
Alguns advogados acreditam
que, diferentemente da posição
da Suprema Corte em outros conflitos, ela poderia agora ser menos
generosa com a Casa Branca porque, ao menos formalmente, o
Congresso dos EUA não declarou
guerra ao Afeganistão ou a outro
país- embora a expressão "guerra contra o terrorismo" ter se
transformado num slogan oficial.
No entanto, como o dia 11 de setembro de 2001 mudou as referências sobre os danos causados
pelo terrorismo, tal observação
pode ser recebida pela corte como
um simples detalhe. Além de serem os maiores atentados já registrados na história, os ataques do
dia 11 de setembro foram os eventos que provocaram mais mortes
de cidadãos dentro dos EUA num
único dia.
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