São Paulo, sábado, 23 de novembro de 2002

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NIGÉRIA

Artigo causa revolta em muçulmanos, que, em protesto contra concurso, iniciam confrontos com cristãos e policiais

Protestos contra Miss Mundo matam 105

Pius Utomi Ekpei/France Presse
Nigerianos em caminhão levando oito cadáveres para serem enterrados em Kaduna (norte da Nigéria), onde confrontos iniciados por muçulmanos deixaram mais de cem mortos


DA REDAÇÃO

Pelo menos 105 pessoas morreram em Kaduna (norte da Nigéria) em três dias de confrontos iniciados por muçulmanos enfurecidos com o fato de o país ser o anfitrião do concurso de Miss Mundo, disse a Cruz Vermelha.
Na tarde de ontem, muçulmanos e cristãos carregando de machetes a fuzis lutavam uns contra os outros e contra a polícia nas ruas de Kaduna, cheias de carros carbonizados e pneus queimados. Centenas de habitantes fugiam de suas casas em chamas.
Segundo a Cruz Vermelha, 3.000 pessoas foram obrigadas a deixar suas casas e 521 ficaram feridas. Cinco igrejas e uma mesquita foram destruídas.
"Dois filhos meus foram mortos hoje. Eles foram arrancados de casa por policiais e soldados, foram mortos e queimados", disse Bello Mijinyawa, um habitante muçulmano da cidade.
Testemunhas afirmaram que os conflitos se espalharam de bairros predominantemente muçulmanos para áreas dominadas por cristãos, apesar de um toque de recolher de 24 horas.
Há dois anos, mais de 2.000 pessoas morreram em confrontos por causa da oposição de não-muçulmanos à introdução da "sharia" no Estado de Kaduna.
A Nigéria ganhou o direito de ser a anfitriã do concurso depois que uma nigeriana venceu o último evento, na África do Sul.
Grupos islâmicos avisam há meses que a realização do concurso, que eles alegam promover a promiscuidade e a indecência, seria recebida com protestos. Suas objeções fizeram com que a final fosse adiada para depois do mês sagrado muçulmano do Ramadã.
A violência em Kaduna irrompeu na quarta-feira, quando muçulmanos incendiaram a sucursal do jornal de Lagos "This Day", que publicara no sábado um artigo questionando as objeções dos muçulmanos ao concurso.
"O que o profeta Muhammad acharia [do Miss Mundo]? Com toda a honestidade, ele provavelmente escolheria uma mulher entre elas [as candidatas]", escrevera o jornalista Isioma Daniel. O diário publicou pedidos de desculpas na segunda e anteontem.
O incêndio rapidamente se transformou no início de um protesto geral contra o concurso.
"O governador se recusou a receber manifestantes que foram entregar uma petição contra o artigo", disse um morador. "Policiais jogaram gás lacrimogêneo e abriram fogo contra as pessoas, na frente da sede do governo."
Segundo testemunhas, jovens saíram então arrancando os pôsteres de campanha do governador Ahmed Makarfi, que concorre à reeleição e é aliado do presidente da Nigéria, Olusegun Obasanjo.
Muçulmanos começaram depois a atacar cristãos e a entrar em confronto com a polícia.
Confrontos irromperam ontem em Abuja (capital), onde a final do concurso deve ocorrer em 7 de dezembro, mas foram reprimidos em poucas horas pela polícia.


Com agências internacionais

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