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Censura a filme na China leva cinéfilos a Hong Kong
Chineses dos centros urbanos começam a protestar contra cortes em "Lust, Caution"
Filme de Ang Lee, sobre
amor durante a Segunda
Guerra, é vetado por Pequim
devido a cenas de sexo e por
retratar traidor como herói
HOWARD W. FRENCH
DO "NEW YORK TIMES"
As fileiras de visitantes chineses a Hong Kong vêm sendo
engrossadas por uma categoria
inédita de turistas: os cinéfilos.
Devido à censura de um filme
sobre amor e traição em Xangai
durante a Segunda Guerra, do
cineasta taiwanês Ang Lee, milhares de fãs de cinema da China estão indo a Hong Kong para
assistir à versão completa de
"Lust, Caution".
O fato destaca a rápida mudança nas atitudes do público
diante da censura governamental às artes, que não costumava ser questionada, e gerou
debate sobre a regulamentação
de filmes na China.
Viajantes já visitaram Hong
Kong para assistir a filmes no
passado, mas os números eram
muito menores. Os críticos e
comentaristas locais atribuem
o interesse pelo filme de Lee a
diversos fatores, da divulgação
boca-a-boca ao conteúdo sexual ousado eliminado da versão censurada, passando pelo
sutil subtexto político raramente visto em filmes chineses. O mais importante, porém,
talvez seja a ascensão de uma
classe urbana afluente no rico
leste da China, cada vez mais
acostumada a escolher o que fará parte de suas vidas.
Pelo menos um fã chinês de
cinema tentou processar a Administração do Rádio, Cinema
e Televisão, que regulamenta o
setor, por cortar parte do filme.
Lee, o diretor, afirmou que o
material censurado foi definido
como politicamente inaceitável em Pequim porque reforçava a idéia da simpatia que surge
entre uma jovem chinesa e um
colaborador dos ocupantes japoneses de Xangai.
Muitos membros da indústria chinesa do cinema apóiam
a idéia de adotar um sistema de
classificação como o dos EUA,
que segundo eles reduziria a
necessidade de censura direta.
Mas as autoridades do cinema
até agora resistem a esse apelo.
Alguns dos visitantes que vão
a Hong Kong dizem que aceitam os motivos que embasam a
existência de um sistema de
censura, em um país com tamanhas disparidades regionais de
renda e educação, mas acreditam que a prática já não seja
justificável nas cidades.
"Sou contra a censura, mas
creio que compreendo por que
ela continua necessária no país
como um todo", disse Yan Jiawei, um designer gráfico de
Xangai que assistiu a "Lust,
Caution" em recente viagem de
negócios a Hong Kong. "A
questão está relacionada ao nível educacional das pessoas."
Profissionais do cinema chinês disseram que o fato de
"Lust, Caution", mesmo censurado, estar em exibição na China demonstra até que ponto os
parâmetros daquilo que é considerado aceitável se expandiram desde o começo da era de
reformas, há duas décadas.
Embora muita gente pareça
ter sido atraída pelo filme de
Lee em razão das cenas de sexo,
que ainda hoje variam de mornas a inexistentes na maioria
dos filmes chineses, um fator
ainda mais inédito, para um filme lançado no país, é a idéia de
um traidor retratado como personagem atraente, e não vilão,
em um dos papéis centrais.
"O país sem dúvida está se
abrindo e avançando mais e
mais, e essa é a maré da história, que não se pode deter", disse Fang Li, um importante produtor chinês. "No entanto,
diante de uma economia de
mercado que está se desenvolvendo com tamanha rapidez,
jamais vi um setor tão atrasado
quanto o de cinema, na China."
Fang diz que boa parte da
responsabilidade por isso cabe
aos censores, pessoas em geral
idosas que operam em comitê e
convidam diferentes ramos do
governo a comentar os filmes.
Outros críticos do sistema dizem que os censores do país se
tornaram muito mais cuidadosos em eliminar os rastros de
seu trabalho. Wu Di, pesquisador do Centro Chinês da Arte
Cinematográfica, em Pequim,
afirma que, quando o diretor
Tian Zhuangzhuang realizou
"The Blue Kite", um filme de
1993 sobre a Revolução Cultural, assunto proibido na China,
todas as empresas do setor foram notificadas de que não deveriam voltar a contratá-lo.
"Agora, sob a chamada sociedade harmônica, eles não agiriam de maneira tão escancarada", diz Wu, citando a teoria do
presidente Hu Jintao. Em lugar
de divulgar uma notificação de
que contratar uma pessoa está
proibido, hoje as autoridades
conseguem resultado semelhante com uns poucos telefonemas, que não deixam rastro. "Lust, Caution" tem estréia
no Brasil prevista para 8 de fevereiro próximo.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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