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COMENTÁRIOS
União Schröder-Chirac ameaça segurança coletiva
WILLIAM SAFIRE
DO "THE NEW YORK TIMES"
O chanceler (premiê) alemão,
Gerhard Schröder, está invicto:
três batalhas, três vitórias -uma
eleitoral, uma diplomática, uma
judicial. A primeira foi sua reeleição em 2002, arrancada das mandíbulas da derrota por sua adesão
de último minuto ao pacifismo
antiamericano.
Logo depois, veio o segundo
triunfo: convencer o presidente
da França, Jacques Chirac, a mudar de idéia em relação ao Iraque.
Chirac havia feito um acordo
com os EUA no final do ano passado: concordaram em adiar uma
invasão do Iraque até que os inspetores de armas da ONU fossem
ludibriados pelo Iraque durante
tempo suficiente para satisfazer a
opinião pública mundial da necessidade do uso da força militar.
Em troca, a França não exigiria
uma segunda resolução da ONU
para as forças aliadas derrubarem
Saddam Hussein.
À medida que o dia D chegava, a
França enviou seu porta-aviões
Charles de Gaulle para a futura cena de guerra. Chirac deixou claro
que, embora fosse um participante menor e relutante no ataque,
seu país não pretendia ficar de fora dos acordos de petróleo do
pós-guerra.
Então, Schröder fez uma oferta
que Chirac não poderia recusar:
uma união para afirmar de modo
permanente o domínio franco-alemão sobre as outras 23 nações
da Europa continental.
Numa surpreendente jogada
em Bruxelas (sede da União Européia), a Alemanha e a França uniram-se para modificar a prática
que estabelece uma presidência
rotativa do Conselho Europeu
(órgão decisório máximo da UE),
que garante atualmente certa influência às nações pequenas, para
um sistema com um presidente
de longo termo, uma espécie de
czar franco-alemão.
A França teve então que pagar
sua dívida com a Alemanha desrespeitando seu acordo com os
EUA na ONU.
A terceira vitória de Schröder
foi mais banal. No ano passado,
uma agência de notícias alemã divulgou a alegação de que o chanceler teria pintado os cabelos nas
têmporas. Pois Schröder, obcecado por sua imagem, enviou seus
advogados ao tribunal com um
desmentido de seu cabeleireiro.
Nesta semana, ele conseguiu
impedir que jornais sensacionalistas publicassem notícias sobre
supostos desentendimentos entre
o premiê e sua quarta mulher.
O que essas vitórias judiciais
dignas de riso mostram é que
Schröder não compartilha dos valores de liberdade de imprensa do
Ocidente.
Mas suas manobras diplomáticas não são motivo de risada. A
proposta alemã pretende partir a
Otan (aliança militar ocidental liderada pelos EUA), separando o
Reino Unido e os Estados Unidos
de uma Europa federal dominada
pela Alemanha e pela França
(com a França atuando no papel
menos importante).
Não é de se admirar que a inútil
ameaça francesa de veto a uma resolução -o que Chirac sabe que
não acontecerá- relembre países
poderosos e populosos como a
Índia e o Japão da desigualdade
de um país de porte médio como
a França ter poder de veto no
Conselho de Segurança (CS) da
ONU. E da necessidade de impedir que a Alemanha o obtenha.
As vitórias de Pirro do chanceler são parte do cenário de crise
existencial que o CS da ONU está
trazendo para si mesmo. A questão iraquiana não é de guerra versus paz. Mas sim de segurança coletiva versus cada nação por si
mesma.
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