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São Paulo, segunda-feira, 24 de março de 2003

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ESTRATÉGIA MILITAR

Avanço das forças dos EUA não empurra todas as tropas iraquianas que encontra

Rapidez ignora bolsões de inimigos

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

A maior resistência demonstrada ontem por tropas iraquianas não vem apenas do fato deles estarem defendendo seu país, em vez de um país conquistado, como fora no Kuait em 1991.
É em parte um subproduto da própria rapidez do avanço anglo-americano.
O avanço rápido não empurra consigo todas as tropas iraquianas que encontra pela frente, ele vai deixando um grande número de tropas isoladas que ficam em "bolsões" na agora retaguarda americana.
São as tropas que seguem atrás da ponta-de-lança que têm de lidar com esses bolsões de resistência. Foi o caso ontem dos fuzileiros navais americanos da 1ª Divisão de Marines em Nassiriah. A cidade já tinha sido ultrapassada pelas tropas na vanguarda, da 3ª Divisão de Infantaria Mecanizada, no sábado.
A 2ª Brigada da 3ª Divisão fez um avanço muito rápido, cerca de 370 km em apenas 40 horas até Najaf, um dos mais rápidos da história (uma divisão é uma unidade de cerca de 15.000 a 20.000 homens, dependendo do país ou do tipo; uma brigada é um dos seus componentes, com cerca de 6.000 homens).
Mas o avanço deixou um bom número de iraquianos para trás, que ontem surpreenderam os marines quando cruzavam pontes de alto valor estratégico em Nassiriah.
Segundo o correspondente Michael Wilson, do "New York Times", a emboscada na cidade começou no nascer do Sol, quando um grupo de fuzileiros navais se aproximava pelo sul.
Wilson acompanha o batalhão de artilharia dos marines que seguia alguns quilômetros atrás e recebeu pedido dos soldados para apoiá-los com seu fogo.
Mas a falta de informação sobre os alvos atrasou o fogo de artilharia. O risco de acertar os marines também era muito grande, pois estavam muito próximos dos iraquianos.
A tática iraquiana visa a atrasar o avanço americano. O fato de entrarem em combate aproximado dentro da cidade também dificulta a utilização pelos americanos do seu muito maior poder de fogo.
A presença de iraquianos na retaguarda mostra também que as tropas de apoio logístico que seguem atrás as de combate também correm perigo.
Os prisioneiros americanos que foram mostrados pela televisão não pertencem a uma unidade combatente, mas sim a uma de apoio, a 507ª Companhia de Manutenção -tanto que incluía uma mulher.
Os prisioneiros tiveram o azar de pegar um caminho errado de madrugada em Nassiriah e topar com uma emboscada de iraquianos em uma área já ultrapassada mas não totalmente "varrida". Os marines ainda acharam quatro deles feridos na cidade.
O subcomandante da ofensiva, o general americano John Abizaid, declarou em uma coletiva de imprensa ontem que "há perigo para os soldados no terreno, mas não há perigo para a operação".
Mesmo o porto de Umm Qasr, um dos primeiros objetivos da ofensiva, ainda não estava totalmente seguro.
Imagens de televisão mostravam ontem artilharia e tanques britânicos da 7ª Brigada Blindada em ação no sul do país. A 7ª Brigada é apelidada de "Ratos do Deserto" por ter lutado no Saara durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e seu símbolo é um ratinho típico da região.
A relutância anglo-americana em penetrar as cidades e se envolverem em combates de casa a casa significa uma continuação do perigo mesmo em áreas próximas ao Kuait.
Muito da resistência até agora tem sido obra de milícias, polícia secreta e membros do partido Baath, lembrando uma guerra de guerrilhas. São unidades leais a Saddam Hussein, embora não tão bem armadas como a Guarda Republicana, ou a Guarda Republicana Especial.
Os problemas mais graves para os americanos ainda estão por aparecer. Saddam Hussein cercou Bagdá com suas unidades mais fiéis e mais bem equipadas. São centenas de veículos blindados e tanques de fabricação russa, dos mais modernos disponíveis no Iraque.
A grande dúvida é saber se a Guarda Republicana vai querer lutar fora ou dentro de Bagdá. Em qualquer dos casos as tropas americanas vão ter um osso bem mais duro de roer pela frente.


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