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São Paulo, quinta-feira, 24 de abril de 2003

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IRAQUE OCUPADO

País teme influência religiosa e política do vizinho do Iraque e vê protestos xiitas como expressão democrática

EUA advertem Irã contra ação no Iraque

Emilio Morenatti/France Presse
Pela primeira vez após 24 anos de ditadura de Saddam Hussein, xiitas lotam mesquita em Karbala durante peregrinação religiosa


DA REDAÇÃO

Os EUA advertiram ontem o Irã de que não deve interferir sobre os xiitas do Iraque, administrado pela coalizão anglo-americana desde a derrubada do ditador Saddam Hussein, no último dia 9. Dos 23 milhões de iraquianos, cerca de 60% são xiitas, assim como 94% dos iranianos.
"Deixamos claro que nos opomos a qualquer interferência externa no caminho do Iraque à democracia", declarou ontem o porta-voz da Casa Branca, Ari Fleischer. "A infiltração [iraniana" para desestabilizar a população xiita se inclui nesse alerta."
O secretário da Defesa americano, Donald Rumsfeld, declarara na segunda-feira que o modelo iraniano não condiz com o "sistema democrático" que os EUA pretendem implantar no Iraque.
Já o líder de um dos principais movimentos iraquianos xiitas sediados no Irã, o Conselho Supremo para a Revolução Islâmica no Iraque, defendeu a separação entre igreja e Estado no Iraque, ao contrário do que ocorre o Irã.
"Os líderes religiosos devem assumir responsabilidades, mas não é necessário que o Iraque seja governado por religiosos. Isso depende da população", disse o aiatolá Mohammad Baqr al Hakim.
O Conselho negou dois convites americanos para participar de reuniões sobre o governo interino iraquiano, alegando ser contra a condução americana do debate.
Segundo os EUA, há um notório fluxo de iranianos para o Iraque, sobretudo para as cidades do sul, de maioria xiita -Najaf, Karbala e Basra. Secular, o regime de Saddam -um sunita- reprimia manifestações xiitas. Após a queda do regime, líderes xiitas tentam preencher o vácuo de poder.
Segundo os EUA, Irã, Coréia do Norte e o Iraque pré-guerra integram um "eixo do mal", que apóia o terrorismo.
Os americanos admitem terem subestimado tanto o papel dos xiitas em uma nova organização do país como o sentimento antiamericano alimentado em frentes internas e externas. Os EUA temem que o crescente contato entre iranianos e iraquianos crie forças para a promoção de um modelo de governo semelhante ao iraniano -uma república islâmica liderada por um clérigo xiita.
Ontem, os Mujahidin (milícia oposicionista iraniana com sede no Iraque e que era apoiada por Saddam) anunciaram a prisão de quatro soldados iranianos que teriam tentado atacar a cidade de Mandali (130 quilômetros a nordeste de Bagdá).
"Neste momento, os xiitas e qualquer ação de influência xiita iraniana não representam uma ameaça às forças da coalizão", declarou o general David McKiernan, responsável pelo comando das forças em terra no Iraque. "Mas estamos de olho em todos esses interesses conflitantes", disse. "Para falar a verdade, isso é a democracia em curso no Iraque."

Peregrinação a Karbala
A peregrinação a Karbala, que marca um dos maiores eventos do calendário religioso xiita -coibida durante os 24 anos de ditadura de Saddam- também foi usada para protestar.
Ontem, no caminho à cidade sagrada, multidões de xiitas clamaram por um papel no Iraque pós-guerra e pediram o fim da ocupação americana no país.
Líderes xiitas esperam que ao menos 1 milhão de pessoas participem da peregrinação ao túmulo de Hussein, neto do profeta Muhammad, morto no século 7º.
O general americano Jay Garner, encarregado da administração transitória do Iraque, afirmou à imprensa que acredita que os xiitas "estejam felizes em estarem onde estão hoje [peregrinando]".
Já o líder xiita iraniano Abu Eslam al Saqir afirmou que "a reunião [para a peregrinação] tem uma mensagem religiosa e política a todos, inclusive à América". "Ela mostra que os iraquianos, em seu território, estão expressando seu amor e sua vontade. As pessoas amam o islã", declarou.
"Os americanos que mantêm o país ocupado deveriam entender essa mensagem e respeitar a escolha do povo iraquiano, ao invés de impor sua própria vontade no nosso país", disse Al Saqir.

Com agências internacionais


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