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Sistema de casta poda avanços na Índia
Enquanto economia floresce e hábitos culturais mudam, tradição de cerca de 3.000 anos ainda rege sociedade e costumes
Anúncios matrimoniais nos jornais, uma instituição no país, sintetizam teia social e seu funcionamento; noivos são escolhidos pela família
CLÁUDIA TREVISAN
ENVIADA ESPECIAL A MUMBAI
A Índia embarcou na globalização, se destaca no setor tecnológico, tem um número espantoso de PhDs, mas continua
a organizar sua sociedade em
torno de castas, que regulam
desde o casamento até o tipo de
pessoas que podem ser convidadas para o mesmo jantar.
Os anúncios matrimoniais
são uma instituição dos grandes jornais indianos e refletem
a sobrevivência da tradição em
meio à transformação econômica: são divididos por castas e
costumam ser publicados pelos
pais dos noivos, que continuam
a cumprir o papel de arranjar as
uniões de seus filhos.
"O casamento é uma transação entre as famílias e é considerado algo extremamente importante", afirma Radhika
Chopra, professora do departamento de sociologia da Universidade de Déli. Quem viu o filme "Casamento Indiano", de
Mira Nair, sabe que não há exagero na afirmação.
Apesar de alguns dos anúncios trazerem a ressalva de que
casta não é impedimento, Radhika diz que são raros os casos
de uniões de pessoas de castas
diferentes ou muito distantes
em termos de status.
Entre os anúncios publicados no dia 3 de setembro no
"Hindustan Times", está um
que condensa os critérios que
pautam o casamento indiano:
"Respeitável família brâmane,
de alto status, procura aliança
para sua filha -bonita, inteligente e educada de acordo com
valores da família indiana".
Depois de dizer que a candidata é formada em economia e
possui pós-graduação em comunicação de massas, o anúncio ressalta que o pai é uma "celebridade internacional" do críquete, jogo popular na Índia.
Quanto aos requisitos do noivo,
ele também deve ser da casta
brâmane, além de bem estabelecido, culto e de uma família
de empresários.
Sem-castas
A discriminação com base
em castas foi abolida pela
Constituição promulgada na
Índia depois da independência
do Reino Unido, em 1947.
Mas a instituição continua
sólida e é um dos principais fatores da baixa mobilidade social do país. Vinculado ao hinduísmo, religião praticada por
85% dos indianos, o sistema de
casta tem uma história de
3.000 anos e resiste às tentativas oficiais de extingui-lo.
Em sua origem, ele tinha
quatro categorias, de acordo
com a função exercida por cada
um na sociedade.
No topo da pirâmide estavam
os brâmanes, que eram sacerdotes ou intelectuais, criados a
partir da boca do deus Brahma,
segundo a mitologia hindu. Dos
braços saíram os guerreiros e
governantes, chamados de xátrias. Comerciantes e agricultores, os vaixás foram criados a
partir das coxas de Brahma. Por
fim, dos pés nasceram os sudras, responsáveis pelo trabalho manual.
Mais tarde surgiu uma quinta categoria, os "intocáveis",
que passaram a desempenhar
as tarefas impuras. Esse grupo
e os integrantes de uma série de
tribos indianas também são
chamados de "sem-castas" e
formam cerca de 24% da população do país, o equivalente a
240 milhões de pessoas.
O governo tem um sistema
de cotas que garante a presença
dos "sem-castas" no serviço público e nas universidades. Nos
Institutos Indianos de Administração (IIMs), por exemplo,
22,5% das vagas devem ser destinadas a esse grupo.
Ao sair da universidade, no
entanto, os "sem-castas" recebem salários inferiores aos de
castas mais altas, segundo estudo divulgado neste mês pela
empresa de pesquisa e consultoria Cfore, de Nova Déli.
O levantamento indica que
os "sem-castas" que estudaram
nos IIMs ganham 20% menos
que a média salarial dos formados nessas instituições.
Compensação financeira
Outro programa oficial é a recompensa financeira para os
que casarem com pessoas de
classes inferiores. No início de
setembro, a ministra de Justiça
Social, Meira Kumar, anunciou
o aumento da compensação para US$ 1.100, metade dos quais
deve ser pago pelo Estado onde
ocorre a união.
"Se alguém quebra o padrão e
casa fora de sua casta, nós queremos lhe dar dinheiro como
uma forma de demonstrar nossa aprovação. Queremos transformá-los em um exemplo a ser
seguido por outros", declarou
Kumar no anúncio da medida.
Mas o incentivo monetário
pode não ser suficiente para
quebrar a resistência da sociedade indiana às uniões entre
castas, especialmente nos Estados mais rurais.
O site indianews.com publicou no dia 13 de maio reportagem na qual relata o drama de
um homem e uma mulher de
altas castas que se uniram a
cônjuges de castas inferiores.
Ambos pediram proteção das
autoridades por estarem ameaçados de morte por membros
de suas castas inconformados
com seus casamentos.
As quatro castas originais da
Índia se dividiram em várias
subcastas, e outras classificações surgiram ao longo do tempo, formando um complexo sistema hierárquico em torno do
qual a sociedade se organiza.
As castas regulam vários aspectos da vida cotidiana, entre
os quais a comida e as tarefas
que cada um pode executar.
Um brâmane por exemplo, não
pode comer refeições preparadas por alguém de castas inferiores, nem sentar-se com um
"sem casta" para jantar.
A jornalista CLÁUDIA TREVISAN viajou a convite do governo indiano
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