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No Brasil, Medvedev tenta driblar crise
Em momento delicado para Moscou, presidente russo desembarca hoje no Rio dentro de viagem que inclui Cuba e Venezuela
Kremlin visa estreitar laços na antiga área de influência dos EUA, mas esbarra em queda do preço do petróleo e em atritos com ex-rivais
IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, desembarca hoje
à noite no Rio para a segunda
etapa de um giro latino-americano no qual pretende vender a
nova dimensão estratégica de
seu país.
Embora Medvedev (pronúncia aproximada: "midviêdef)"
esteja efetivamente brincando
no quintal geopolítico dos Estados Unidos, promovendo sua
aliança com a antiamericana
Venezuela e tentando fortalecer laços com o Brasil, a quantidade de problemas recentes em
casa tirou um pouco da desenvoltura dos russos.
No Brasil, assinará acordos
de cooperação e tentará engatilhar vendas de armas, algo difícil (leia texto ao lado).
O cenário inicial era favorável ao Kremlin. Medvedev chega em um momento em que seu
país humilhou o Ocidente na
guerra de agosto com a Geórgia.
Moscou só não ocupou todo o
pequeno país para poder garantir uma volta rápida da Europa
à mesa de negociações -o que
já ocorreu.
Ontem, em seu segundo dia
de viagem, lembrou de suas "diferenças" ao encontrar-se com
o colega americano George W.
Bush na cúpula de países da
Ásia e do Pacífico em Lima, Peru. "A despeito da existência de
pontos em que nós divergimos
pesadamente, nós temos trabalhado bem e vamos continuar
esse trabalho", disse o russo,
que ainda tirou uma casquinha
do presidente que deixa o cargo
em janeiro: "Ficaremos felizes
em recebê-lo na Rússia". Um
assessor ainda sugeriu: "Ele pode ir pescar", disse Sergei Prikhodko a agências de notícias.
Agenda de crise
Só que será com Barack Obama, e não Bush, com quem
Medvedev e seu líder político, o
premiê Vladimir Putin, irão negociar a partir de 2009. E a
agenda é extensa, incluindo
Geórgia, o sistema antimísseis
que os EUA querem instalar na
Europa, terrorismo, expansão
da Otan, entre outros.
Os problemas para Medvedev não param aí. Todo o ressurgimento geopolítico da Rússia nos oito anos de governo
Putin foi lastreado no apetite
mundial por hidrocarbonetos.
Com o barril de petróleo na casa dos US$ 50 e uma recessão
mundial em desenvolvimento,
os dólares para financiar as
aventuras russas ficam comprometidos. Além disso, o mercado de ações e o sistema bancário do país estão sofrendo pesadamente com a vertente financeira da crise global.
Por isso, cabe especial atenção à terceira perna da viagem
de Medvedev, Caracas. Lá, o
presidente Hugo Chávez assinará acordos energéticos com
os russos sentindo o peso do
mesmo problema, a queda no
preço do petróleo que lhe garante coisas como compras de
US$ 5 bilhões desde 2005 em
armamentos da Rússia. É de se
esperar que ambos adotem a
cautela retórica sobre Washington, à espera de Obama.
Isso não muda dois fatos que
são vistos com preocupação
nos meios militares americanos. Primeiro: depois de exercícios com dois bombardeiros estratégicos usando bases venezuelanas, uma frota naval russa
fará exercícios com navios de
Chávez no Caribe -o venezuelano anunciou que a esquadra
chegaria já ontem ou hoje.
Segundo: na etapa final do giro, Medvedev irá ao antigo satélite de Cuba, onde pretende
estabelecer uma nova cooperação militar -interrompida com
o fim da União Soviética em
1991. Há rumores de que bases
cubanas possam servir de apoio
logístico à aviação de longo alcance russa, embora alguns
analistas duvidem da real capacidade operacional de Moscou.
Com uma agenda de crise, o
giro de Medvedev não terá o
brilho esperado em Moscou,
mas nem tampouco pode ser
descartado do ponto de vista de
novidade geopolítica.
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