São Paulo, sábado, 25 de outubro de 2008

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SUCESSÃO NOS EUA / CASO GRAVE

Rivais têm planos opostos para salvar saúde

Sistema público americano é notoriamente ruim, e cobertura do governo abrange parcela muito restrita da população

Para McCain, a resposta é estimular a competitividade entre as seguradoras; para Obama, a solução é ter uma maior atuação do governo

David McNew-9.out.08/Getty Images/France Presse
Hospital universitário em Los Angeles; maioria das famílias americanas paga em média US$ 1.000 ao mês por seguro médico

DANIEL BERGAMASCO
DE NOVA YORK

Faxineiro do hospital Lincoln, no Bronx, em Nova York, e "acostumado a ver cenas terríveis" pelos corredores, o texano Tony Ramos, 42, diz ter levado um susto no ano passado após descobrir que tinha pedras nos rins. "Passei por um aparelho para que a pedra fosse visualizada e a conta foi de US$ 6.000, apesar de eu ter seguro", disse ele à Folha. "Para pagar o exame, tive que apertar o orçamento da família. Se soubesse, nem teria feito."
O caso de Ramos é o ponto de partida típico para ilustrar o debate sobre saúde nas eleições presidenciais americanas deste ano. Se a agonia fosse relatada pelo mediador de um debate entre os candidatos, o republicano John McCain diria que os problemas são a falta de competitividade entre as seguradoras de saúde, que deveriam ser premiadas pela qualidade, e a falta de investimento em pesquisas que produzam, por exemplo, exames mais baratos.
Já a argumentação do democrata Barack Obama listaria a falta de regulamentação do mercado para coibir atitudes como não custear um exame e defenderia um programa federal para subsidiar despesas com saúde, a partir de aumento de impostos para os mais ricos.

50 milhões de fora
A solução segue a lógica econômica de cada um (de responsabilidade do Estado ou do mercado), mas a percepção do que vai mal é comum.
McCain e Obama prometem aumentar a qualidade do sistema de saúde pública, tido com um pedaço de Terceiro Mundo dentro dos EUA, com 50 milhões de americanos (um sexto da população) sem cobertura.
Atualmente, se passarem mal e correrem para um pronto socorro, esses americanos sem seguro sairão de lá com uma conta altíssima. Apenas idosos e pessoas de baixíssima renda têm planos custeados pelo governo, chamados de Medicare e Medicaid.
Apesar de ser notoriamente muito falho, o sistema americano é caro. Um quarto do Orçamento do governo é gasto com Medicare e Medicaid, segundo o Federal Reserve (o banco central americano). No total, gastos com saúde representam 16% do PIB do país e são um peso para as famílias, que pagam por seus planos aproximadamente US$ 1.000 por mês.
"O sistema americano não funciona. Aqui vejo mortes pelas razões mais estúpidas, como falta de enfermeiras para cuidar direito de pessoas em coma", diz Ramos, que critica a abordagem dos candidatos do tema. "Eles estão preocupados com petróleo, armas, guerras. Só falam disso. Quando falam, não sinto sinceridade."
Reportagem do jornal "The New York Times" desta semana dá certa razão a Ramos. Pesquisadores, cujos estudos são citados pelos candidatos para defender seus projetos, disseram que suas conclusões são distorcidas, sempre com menção às hipóteses mais otimistas.
Os estudiosos afirmam que Obama minimiza os custos de seu programa (cita US$ 1,17 trilhão em dez anos, mas pesquisadores apontam mais; um grupo ligado aos republicanos diz que serão US$ 6 trilhões) e McCain superestima o número de cidadãos que passarão a ter seguro de saúde (ele cita 27 milhões de pessoas e pesquisadores ligados a Obama dizem que serão 5 milhões a perderem a cobertura).
Os eleitores mais preocupados com a questão estão do lado do democrata. Segundo pesquisa do instituto Ipsos, realizada no fim de setembro, com margem de erro de 3,2 pontos percentuais para mais ou para menos, 50% dos eleitores consideram o programa de saúde de Obama melhor que o de McCain, citado por 36%. Na mesma pesquisa, indagados sobre prioridade de investimentos do governo, 32% disseram saúde, contra 31% energia, 19% defesa e 15% educação.

Questão econômica
Atravessando sua crise econômica mais grave desde a Grande Depressão dos anos 30, os EUA já sentem os efeitos na área da saúde. De acordo com dados do governo, o consumo de remédios com receita médica está em queda pela primeira vez em dez anos.
Para o pesquisador de saúde pública Igor Volsy, do Center for American Progress Action Fund, causa e conseqüência se misturam. "Grande parte das execuções de hipotecas são causadas por pais de família inadimplentes por terem seu orçamento comprometido com algum problema de saúde. Investimento em saúde reforça a saída da crise", disse à Folha.


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