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Risco de violência ronda fracasso de cúpula de Annapolis
Especialistas não esperam avanço em encontro que reunirá israelenses e palestinos nos EUA nesta terça para tratar de paz
Tensão latente na região, alimentada por fragilidade de líderes, pode explodir após reunião; não há nem consenso sobre texto final
MARCELO NINIO
DE GENEBRA
Diante da baixa expectativa
em torno da conferência de paz
entre israelenses e palestinos
que o governo americano promove nesta terça, com a inédita
participação do Brasil, o iminente fracasso em obter um
avanço palpável não deveria
causar grande turbulências.
Mas quem vive de perto o conflito vê perigos na possibilidade
de o premiê israelense, Ehud
Olmert, e o presidente palestino, Mahmoud Abbas, voltarem
para casa de mãos vazias.
Até o fechamento desta edição, israelenses e palestinos
não tinham concordado nem
sequer com um comunicado
conjunto, impossibilitado pela
fragilidade política de seus líderes e pelas diferentes ambições
que cada um projeta para a conferência.
"Quando Olmert diz que a
simples realização da conferência já é um triunfo ele comete um erro tremendo", disse à
Folha o deputado israelense
Yossi Beilin, líder da coalizão
de esquerda Meretz-Yachad.
"Está faltando dos dois lados
um entendimento melhor do
alto preço de um novo fracasso.
Uma nova decepção enfraquecerá Abbas e o Hamas sairá fortalecido. Com isso, cresce o risco de uma nova explosão de
violência."
A biografia de Beilin é marcada por tentativas de buscar
uma solução para o conflito.
Ele foi um dos arquitetos dos
acordos de Oslo, que levaram à
assinatura do histórico acordo
com os palestinos em 1993. Dez
anos depois, já na oposição e
frustrado com a estagnação do
processo de paz, liderou o grupo de israelenses e palestinos
que criou o Acordo de Genebra,
um plano de paz arrojado, mas
que jamais saiu do papel.
Embora compartilhe do pessimismo geral em relação à
conferência que será realizada
na cidade americana de Annapolis, no estado de Maryland,
Beilin não descarta um avanço.
"Espero ouvir coisas que nunca
foram ditas, principalmente no
do presidente Bush", diz.
"O espectro de possibilidades
não é grande. O que é viável no
momento é uma declaração de
que as bases de um acordo são
as fronteiras de 1967. Isso nunca foi dito pelos dois lados, embora o princípio, com algumas
variações, seja amplamente
aceito", afirma Beilin. "Se isso
ocorrer, será um progresso."
Violência latente
Ibrahim Souss, ex-embaixador palestino que hoje dá aulas
na Escola de Diplomacia de Genebra, concorda que as baixas
expectativas não neutralizam
os riscos de mais uma conferência sem resultados. "A violência é latente", diz Souss, que
cita o momento delicado vivido
pelos três principais líderes como um obstáculo.
"Em Israel há forças tremendas contrárias a qualquer concessão. Os palestinos estão divididos entre o Hamas e o Fatah. E o presidente Bush está
sem legitimidade como líder
global", afirma.
Enfraquecido politicamente,
dificilmente Olmert aceitará
uma declaração que implique
em compromisso territorial.
Falar em fronteiras de 1967 significa a desocupação dos assentamentos judaicos na Cisjordânia, algo inaceitável para a extrema direita israelense, parte
dela na coalizão governista.
"A sobrevivência de Israel seria impossível se voltássemos
às fronteiras de 1967", diz
Danny Dayan, chefe do conselho de assentamentos da Cisjordânia. "Em um determinado
ponto nosso território teria só
13 km de largura, quase a distância entre o centro de São
Paulo e o aeroporto de Congonhas. É inconcebível."
Em julho de 2000, também
quando estava no fim de seu segundo mandato, o presidente
Bill Clinton reuniu o então premiê israelense, Ehud Barak
(hoje ministro da Defesa), e o líder palestino Yasser Arafat numa tentativa de selar um acordo de paz definitivo. A ambição
era bem maior do que a da cúpula de Annapolis, e a desilusão
com as enormes expectativas
não correspondidas acabaram
ajudando a deflagrar a segunda
intifada (revolta) palestina, que
deixou milhares de mortos.
Beilin recomenda que as lições de Camp David sejam aplicadas em Annapolis. "A primeira delas é a de que não se chega
a uma conferência de paz sem
saber como ela terminará", diz.
"A segunda é que não se pode
pensar que, se o encontro fracassar, em algumas semanas
um outro pode ser organizado.
Annapolis mostra como uma
mobilização internacional como essa é complexa."
O deputado israelense também considera essencial que
haja uma proposta americana,
e que a Casa Branca tenha capacidade de combinar pressão
e persuasão para que ela seja
mais que um pedaço de papel.
Até agora, no entanto, além
de aumentar o tamanho da mesa de negociação de forma inédita, ao emitir convites para
mais de 40 países, a primeira
conferência de paz entre israelenses e palestinos do governo
Bush pouco promete além de
uma foto final tamanho família.
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